Acórdão nº 05343/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelCOELHO DA CUNHA
Data da Resolução10 de Novembro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do TCA -Sul 1- Relatório A..., residente em …, intentou no TAF de Castelo Branco, contra a Câmara Municipal de Alter do Chão, acção administrativa especial, visando a impugnação da deliberação camarária que, na sequência de processo disciplinar. Lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva.

Por sentença de 27 de Maio de 2009, o Mmº Juiz do TAF de Castelo Branco julgou a acção procedente e anulou o acto impugnado.

Inconformada, a Câmara Municipal de Alter do Chão interpôs recurso jurisdicional para este TCAS, em cujas alegações enunciou as conclusões seguintes: “1. A pena de aposentação compulsiva é aplicada a todos os funcionários que tenham praticado ou tomado comportamento de tal forma gravoso que determine a quebra irremediável da relação funcional, tal como está enumerado – não de forma taxativa mas exemplificava – no artº 26º do E.D.

  1. Contudo, as situações previstas no artº26º nº2 a) do E.D. atenta a sua especial gravidade mereceram destaque do legislador que as quis pôr em evidência em termos de serem aqueles capazes de por si só, isto é, pela sua verificação de facto gerar a inviabilidade da manutenção da relação funcional, conforme o Ac. S.T.A. citado na decisão o considera.

  2. Significa isto que no caso dos autos tendo a situação em apreço ou melhor os factos imputados à recorrida sido integrados no artº26º nº2 a) do E.D para a demonstração da inviabilidade da manutenção da relação funcional é quanto basta, não sendo necessário cumular-se com o previsto no artº26º nº2 a) do E.D.

  3. Nos casos como o dos autos, em que o comportamento gerador de responsabilidade disciplinar está integrado numa das alíneas do artº26º nº2, para que seja possível determinar a inviabilidade da manutenção da relação funcional basta que se verifique a prática desses actos com aptidão para os subsumir à previsão das alíneas do nº2 do artº26º, não sendo necessário a sua verificação cumulativa como o previsto no artº26º nº3 do E.D.

  4. A douta decisão recorrida incorre por isso no vício de violação da lei porque retirou da interpretação do artº26º nº2 e 3 uma conclusão não autorizada pelo preceito e não se mostra adequada à correcta interpretação e aplicação da lei.

  5. Além do mais, a douta decisão recorrida ao apoiar-se no Ac. 17.04.2008 do S.T.A. não cuidou de saber se a doutrina constante do mesmo foi produzida sobre um caso idêntico ao dos autos. E não foi.

  6. Conforme atrás se referiu o caso dos autos foi subsumido ao previsto no artº26º nº2 a) do E.D. e o douto Acórdão citado não se pronunciou sobre as situações do referido artº 26º nº2. Tal como consta:” o que quer dizer que para além das razoes especificadas no nº2 do citado art. 26º, que "in casu" não vêm invocadas e que, por isso, não interessam analisar...", o que demonstra que a douta decisão do S.T.A. citada não se pode aplicar sem mais ao caso dos autos, designadamente que a pena de aposentação compulsiva apenas pode ser aplicada desde que seja comprovada a incompetência profissional ou falta de idoneidade moral para o exercício de funções cumulada com as situações previstas no art. 26°nº 3.

  7. No dia 3 de Junho de 2003 no edifício da Câmara Municipal de Alter do Chão a recorrida, na presença de vários colaboradores e funcionários do Município, dirigiu-se à recorrente Vereadora Dra. B...dizendo: "esta mulher tem de ser posta fora da Câmara. É uma puta. É uma cabra".

  8. As expressões utilizadas de grande pendor depreciativo e difamatório são aptas a ofender a honra e consideração da Vereadora e atentam gravemente contra a honorabilidade e prestigio que o exercício daquela nobre função pública exige e par isso daí é possível concluir que põem em causa a manutenção da relação funcional.

  9. A decisão impugnada ponderou aqueles factos e ainda a circunstância em que os mesmos ocorreram no edifício dos Paços do Concelho na presença de outros colaboradores e funcionários do Município e é por isso evidente que aqueles expressões e o seu circunstancialismo comprometem irremediavelmente o interesse público que a relação funcional deve prosseguir colocando em causa a confiança, eficácia e idoneidade que deve mover a Acção Administrativa neste caso corporizado na pessoa da Vereadora Dra. B....

  10. Daí que só com a ablação do elemento que lhe deu causa através da aplicação ao caso dos autos da sanção de aposentação compulsiva, se mostre adequado.

  11. Toda esta ponderação está devidamente fundamentada na decisão impugnada tomada pela Câmara Municipal de Alter do Chão e nos pressupostos da decisão do processo disciplinar de forma clara e suficientemente fundamentada, razão pela qual com o provimento do presente recurso devem V. Exas. revogar a douta sentença a recorrida e manter na ordem jurídica a decisão tomada, na qual se aplicou a pena da aposentação compulsiva à recorrida.” A recorrida contra-alegou, concluindo como segue: “I - Na sentença recorrida pode ler-se que ''De algum modo foi feito esforço de concreta fundamentação para afirmação da inviabilização da manutenção da relação funcional (…) Todavia, insuficiente” II - Citando o Acórdão do STA de 01.04.2003 (acórdão que, muito convenientemente, a Recorrente preferiu ignorar), o Tribunal entendeu que a valoração das infracções disciplinares inviabilizadoras da relação funcional deve assentar ''...não só na gravidade objectiva dos factos cometidos, mas ainda no reflexo dos seus efeitos no desenvolvimento da função exercida e no reconhecimento, através da natureza do acto e das circunstâncias com que foi cometido, de que o seu autor revela uma personalidade inadaptada ao exercício dessas funções '': III - O critério geral de aplicação da pena de aposentação compulsiva é a inviabilidade de manutenção da relação funcional. E, a jurisprudência, tem defendido quanto a esta matéria que "o preenchimento do conceito indeterminado que corresponde à inviabilidade da manutenção da relação funcional (…) constitui tarefa da Administração, a concretizar mediante um juízo de prognose” (Acórdão de 2/12/2004, rec.1038/04. No mesmo sentido podem ver-se, entre outros, os Acs. de 11/10/2006. rec. 10/06, de 13/01/99, rec. 40060 e de 9/07/98, rec. 40931); IV - O Tribunal entendeu - e bem - que tal juízo não foi, em concreto, feito; V - Em momento algum a Recorrente demonstra, em concreto, a inviabilidade de manutenção da pena que aplicou à Recorrida, ou sequer a necessidade do seu afastamento das funções que ocupava; VI - O preenchimento da factualidade vertida no artº26º/1 do anterior Estatuto não pode comportar a aplicação automática, directa e necessária da pena de aposentação compulsiva; VII - Já que o anterior Estatuto previa ainda a existência de circunstancias atenuantes, relevando assim a contextualização dos factos disciplinarmente relevantes; VIII -No caso em apreço, a Recorrente reconheceu a circunstância atenuante de a Recorrida ter demonstrado irrepreensível zelo e diligência no desempenho das suas funções: IX - Contudo, nenhum esforço fez para, no cumprimento do princípio da oficiosidade que assiste ao procedimento disciplinar, confirmar a verificação de outra circunstância atenuante –a provocação; X - Certo é que, em momento algum, a Recorrente dá cumprimento ao disposto no º1 do art. 26º do anterior Estatuto, na medida em que nenhum juízo de prognose foi feito no sentido de demonstrar n inviabilidade da manutenção da relação funcional em causa, bem como de fundamentar a necessidade de aposentar compulsivamente a Recorrida; XI - No decurso do presente processo, entrou em vigor a Lei nº58/2008, de 9 de Setembro, que revogou o DL nº24/84, de 16 de Janeiro e procedeu à publicação do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas (doravante Estatuto); XII - O seu art. 4°, n°1, estatui que "Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o Estatuto é imediatamente aplicável aos factos praticados, nos processos instaurados e às penas em curso de execução à data da sua entrada em vigor, quando o seu regime se revele, em concreto, mais favorável ao trabalhador e melhor garanta a sua audiência e defesa”.

XIII - O actual Estatuto não prevê a pena de aposentação compulsiva; XIV - A Recorrida encontra-se, presentemente, a cumprir a pena de sanção compulsiva que lhe foi aplicada ao abrigo do anterior Estatuto e que, por virtude de impugnação - procedente - de que foi alvo, está longe de se ter cristalizado no ordenamento jurídico; (sendo que no âmbito do processo crime que contra o Recorrente correu pelo Tribunal Judicial da Comarca de Fronteira, com o nº75/06.9GDFTK, no qual era imputada à recorrente, pela Srª. Vereadora, B..., um crime de difamação agravada (por alegadamente esta ler dito - "esta mulher tem de ser posta fora da Câmara. É uma puta. É uma cabra"), a recorrente foi ABSOLVIDA.

XV - A manutenção da actual pena carece de fundamento legal, revelando-se em concreto, manifestamente excessiva à luz das sanções aplicáveis ao abrigo do presente Estatuto, já que foi a própria Recorrente que declarou, em sede de procedimento disciplinar, que os factos que motivaram a aplicação de tal situação eram insuficientes para que lhe fosse aplicada qualquer pena mais gravosa: XVI – Consequentemente, e por força do art. 4º, nº1 da L 58/2008, de 9 de Setembro, a decidir-se por aplicação de qualquer sanção, deve a presente pena de aposentação compulsiva imposta à Recorrida ser revogada e substituída por pena de suspensão, que tenha em conta, para efeitos de contabilização da medida da pena, o tempo já cumprido no âmbito da pena de aposentação compulsiva, ora em execução”.

O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o seguinte parecer: “ (…) Vem o presente recurso interposto pela Câmara Municipal de Alter do Chão, da sentença de 27.05.2009 proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que, concedendo provimento à acção administrativa especial intentada por A..., anulou a deliberação de 15.05.2007 do referido Município.

Tal decisão camarária...

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