Acórdão nº 00949/05.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução21 de Outubro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1. L…, J… e F…, identif. nos autos, inconformados, vieram interpor o presente recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 4 de Maio de 2010, proferida no âmbito de uma acção administrativa especial em que é recorrido o MUNICÍPIO do PORTO, que, depois de não ter admitido a ampliação do objecto do recurso, julgou extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide (art.º 278.º, al. e) do CPCivil).

*** No final das alegações, os recorrentes formularam as seguintes conclusões: " I - A garantia da tutela jurisdicional efectiva, consagrada na CRP (art.º 268º, n.º 4) e art.º 2º do CPTA, parametrizam a justiça administrativa em torno da posição jurídica (subjectiva) dos particulares, orientando o objecto do processo administrativo não já para a mera sindicabilidade do acto administrativo face à ordem jurídica, mas tendo agora como sua estrela polar a tutela da lesão injusta sofrida pelo cidadão.

II - No sentido de se tentar assegurar o mais possível a garantia da tutela efectiva dos direitos (e outras posições jurídicas subjectivas), o próprio legislador processual vem, no Código de Processo, logo de início, acolher e expressar um princípio “pro actione”: art. 7º sobre o cânone hermenêutico sob que devem ser aplicadas as normas processuais – justamente “no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas”.

III - No caso dos autos, parece por demais evidente que uma “lide” deste tipo - análise das ilegalidades de uma operação de loteamento para efeitos da sua anulação/declaração da sua nulidade - só se torna posteriormente “impossível” ou “inútil” quanto ao conhecimento do seu objecto, por força de “alterações” introduzidas no alvará (que não é um outro diferente, mas antes mantém até o mesmo número de identificação, o n.º 3/98), se essas alterações viessem precisamente a corrigir e eliminar o que estava mal e ilegal, e tinha sido arguido na acção.

IV - Não tendo as “alterações” posteriores que entretanto ocorreram eliminado tais vícios, pois estas tinham como desiderato a alteração de aspectos concretos e precisos do loteamento e não da sua totalidade, mantém-se então toda a “utilidade” jurídica da acção proposta Independentemente, pois, destas posteriores alterações.

V - A utilidade ou impossibilidade da lide devem ser perspectivadas tendo presente o fim para que tende uma acção de impugnação, a eficácia jurídica que dela pode resultar. De um ponto de vista prático…--em que o “fim”, como é natural, assume a posição de “princípio” iluminador do sentido das operações.

VI - O problema das “alterações” ao loteamento, é um problema que precisa de ser muito mais aprofundado do que as simples proposições formais e automáticas e repetidas em algum acórdão (de resto, aparecidas no domínio do contencioso anterior à Reforma de 2002/04, que era de matriz muito mais “objectivista”, de “processo feito a um acto” em lugar de “processo sobre posições jurídicas subjectivas das partes”; e por isso levava tal contencioso permanentemente a soluções de rejeição de recursos/impugnações, por se entender não estar “verificado” um qualquer pressuposto ou requisito que deveria escrupulosamente acompanhar tal acto para ser objecto do recurso!!).

VII - Dizer que uma “alteração” ao alvará substitui sempre o anterior e “por isso” torna necessariamente, por si, inútil ou impossível a lide, levaria a um resultado tremendamente penoso, e manifestamente “desproporcionado, para além de que seria violador, seguramente, da garantia da tutela jurisdicional efectiva. Impondo ao particular, lesado por tais actos, uma corrida no ataque ao acto administrativo que no limite seria sempre votada ao insucesso, pois bastaria ao órgão da administração competente proceder a alterações ao alvará de loteamento sempre que previsse uma qualquer impugnação judicial pelo cidadão lesado. Assim não há reforma da Justiça Administrativa que resista, isto é, que produza os efeitos desejados – tutela jurisdicional efectiva das posições jus-administrativas dos particulares.

VIII - Na actualidade vigora no contencioso administrativo uma concepção substancial da pretensão processual, que se revela necessária à obtenção de uma sentença de mérito exigida por uma justiça administrativa material e efectiva, aliás com consagração constitucional e legal, constantes no artigo 268º, n.º 4, da CRP e art.º 7º do CPTA.

IX - Assim, não deve ser dada por extinta a lide, mas antes o processo prosseguir com vista a sindicar a legalidade do acto de licenciamento do loteamento (acto administrativo de alteração), até à sua raiz e nos seus vícios genéticos - pelo menos em tudo o que não foi depois remediado/sanado em alterações posteriores que entretanto ocorreram.

X - Os Recorrentes tirarão sempre utilidade do presente processo – ao verem, como esperavam, e esperam ainda, ser declarado nulo o acto impugnado, por causa das ilegalidades gritantes que nele se contêm desde o início (abrangendo-se na declaração de nulidade, também os actos conexos de autorização de construção nos lotes referidos). E invalidado esse acto, cairão também a seguir, necessariamente em execução de sentença, e na medida em que repitam tais ilegalidades, ou em elas se apoiem, os actos posteriores (derivados e consequentes) que nele se baseiam, mesmo que nalguma parte, mesmo que grande, tenham alterado ou substituído para o futuro, tal acto (aliás com vícios próprios e específicos na alteração).

XI - O Juiz a quo não deveria ter decidido pela extinção da instância sem ouvir expressamente sobre tal projecto e intenção os Autores, ou então ainda, antes disso, actuar no sentido propugnado no art. 88º do CPTA (suprimento de excepções dilatórias e aperfeiçoamento dos articulados), tudo de acordo com o principio da cooperação processual, consagrado no art.º 265º, n.º 2 do CPC e reafirmado expressamente no art.º 8º do CPTA: XII - Quanto à ampliação do objecto da acção, oportunamente requerida pelos Autores, fls. 404 a 406 dos autos, esta no caso sub judice deverá enquadrar-se na fattiespecie da previsão normativa ínsita no art.º 63º do CPTA, e não como é evocado na Douta Decisão em crise, ao abrigo do art.º art.º 64º, nºs 1 e 3, pois como resulta claramente da letra da lei (simples e linear) o art. 64º do CPTA, aplica-se apenas quando estivermos perante um "acto revogatório com efeitos retroactivos do acto impugnado"; ao passo que o art. 63º do CPTA, aplica-se aos casos de terem sido praticados outros actos administrativos (ou contratos) na pendência do processo impugnatório e que necessariamente se encontram envolvidos na mesma relação jurídica administrativa ou que de algum modo se relacionem com o acto impugnado. E como resulta demonstrado, ex abundanti, a relação jurídica administrativa respiga do processo de licenciamento do loteamento.

XIII - Ainda numa segunda linha de abordagem, a verdade é ainda que mesmo que se considerasse que a questão era duvidosa, dever-se-ia ter optado pela continuação da acção para conhecimento do seu mérito.

XIV - E mesmo que assim se não entendesse, quando se pede a ampliação do objecto a um segundo acto posterior ao primeiro acto impugnado (art. 63º), pede-se mais do que aquilo que se prevê como possibilidade no art. 64º: neste é que o processo prossiga apenas contra o segundo acto. Ali, naquele (63º), é que o processo prossiga contra os dois.

Por isso, onde cabe o mais caberá o menos. E por conseguinte, não se pode (como fez a sentença) vir dizer que se tornou inútil a acção ou impossível por falta de objecto !!! Violação manifesta também aqui do art. 7º do CPTA e do art. 268º nº 4 da CRP.

XV - Não se tendo feito tal, sujeitam-se os recorrentes a enveredar numa verdadeira corrida atrás do último...

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