Acórdão nº 01880/04.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2007 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO J…, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 24/03/2006, que na acção administrativa comum, sob forma ordinária, pelo mesmo movida contra INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOMÉDICAS ABEL SALAZAR (abreviadamente ICBAS) e C…, igualmente identificados nos autos, julgou, por um lado, procedente a excepção de falta de personalidade judiciária do co-R. “ICBAS”, absolvendo-o da instância e, por outro, improcedente o pedido indemnizatório também deduzido contra a co-R. C... V..., absolvendo esta do pedido.
Formula o aqui recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 186 e segs.
- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...
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Ao decidir pela falta de personalidade judiciária do recorrido ICBAS, a douta sentença recorrida cometeu um clamoroso erro de interpretação e aplicação do direito, em ofensa ao estabelecido pelo artigo 5.º do Código de Processo Civil e artigo 8.º, n.º 1 e 2 do Despacho Normativo 23/2001, de 17.05, que deste modo flagrantemente violou; b) Paradoxalmente, a douta sentença, apesar de reconhecer que o réu, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, é uma pessoa colectiva de direito público, afirma que é a Universidade do Porto quem detém personalidade jurídica e não cada uma das faculdades que a integram; c) Nos termos do artigo 5.º do Código de Processo Civil, a personalidade judiciária consiste na susceptibilidade se ser parte, revela-se na possibilidade de requerer ou ver requerida contra certa pessoa física ou jurídica, providências judiciais legalmente configuradas e decorre necessariamente da existência de personalidade jurídica; d) Por sua vez, a personalidade jurídica distingue-se por ser a susceptibilidade de ser titular de direitos e obrigações, como característica intrínseca do ser humano, que é transposta para a pessoa colectiva, autonomizada enquanto titular individualizado de relações jurídicas, de modo a permitir a prossecução do respectivo escopo, em termos perfeitamente equivalentes à pessoa singular; e) Ora, assim, todas as pessoas colectivas de direito público gozam de personalidade jurídica e, consequentemente, de personalidade judiciária; f) Face ao artigo 8.º, n.º 1 e 2 do Despacho Normativo 23/2001, de 17.05, que alterou os estatutos da Universidade do Porto o recorrido ICBAS é uma pessoa colectiva de direito público, com a correspondente personalidade jurídica e a inerente personalidade judiciária; g) Ao decidir pela não aplicação do artigo 10.º, n.º 4 do CPTA e ao não considerar a acção instaurada contra a Universidade do Porto, a douta sentença recorrida cometeu um erro de interpretação e aplicação do direito, em ofensa ao estabelecido por esta norma, que deste modo violou; h) No caso dos autos e a vingar a tese segundo a qual o requerido ICBAS seria uma unidade orgânica da Universidade do Porto destituída de personalidade jurídica, estar-se-ia claramente perante a aplicação do n.º 3 deste artigo 10.º, importando ver se, em conjugação com n.º 4, estariam verificados os requisitos da sua aplicação; i) A douta sentença recorrida, conclui que não está invocada uma acção ou omissão de uma entidade pública, apesar de o recorrente imputar na acção ao recorrido ICBAS a prática de actos materiais e jurídicos e a omissão de outros, que, no seu entender, constituíram ofensa ilícita e ilegal dos seus direitos, com violação dos deveres a que se encontrava obrigado; j) Por outro lado, a douta sentença parece que perfilha o entendimento segundo o qual a referida norma apenas é aplicável à impugnação de actos administrativos e, consequentemente, à acção administrativa especial, pelo que ficariam excluídos do seu âmbito de aplicação as acções administrativas comuns e, nomeadamente, aquelas que têm em vista a efectivação de responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública; k) Porém, o referido artigo está integrado no capítulo II, subordinado à epígrafe “Das partes”, do título I, por sua vez subordinado à epígrafe “Parte geral”, pelo que se trata de enunciado genérico, aplicável a qualquer uma das formas de processo previstas no Código de Processo nos Tribunais Administrativo; l) Acresce que não se extrai da sua letra ou do seu espírito a pretendida limitação, pois tem de se considerar regularmente proposta a acção contra a pessoa colectiva de direito público, quando (i) a petição indique como parte o órgão que praticou o acto impugnado, ou (ii) a petição indique como parte o órgão perante o qual foi formulada a pretensão do interessado; m) No segundo caso essa limitação está absolutamente afastada pela referência, muito mais abrangente e alargada, à pretensão do interessado, que, no que interessa aos autos, é a candidatura a regime de mudança de curso e suas reclamações dirigidas ao recorrido ICBAS; n) Ao decidir pela absolvição do pedido da recorrida C... M... F... de B... V..., a douta sentença recorrida cometeu um erro de aplicação do direito, em ofensa ao estabelecido pelo artigo 3.º, n.º 1 in fine do Decreto-Lei 48.051.
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A douta sentença sustenta e defende é que o recorrente não alegou factos capazes de integrar o conceito de dolo, o que, em bom rigor, equivale a dizer que a petição inicial é inepta, por falta de elementos constitutivos essenciais da respectiva causa de pedir.
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Ora, estão alegados todos os factos integrantes do dolo directo, pois está alegado que a recorrida praticou um facto, que o fez de modo livre (ou seja, por determinação não coagida por outrem) voluntária (ou seja, pela sua vontade), consciente (ou seja, através de processo cognitivo), com o vontade e o propósito (ou seja, com a intenção e a determinação), de obstar ao exercício pelo recorrente do direito que legalmente lhe cabia e de prejudicar o cumprimento do seu reconhecimento judicial.
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São estes os factos que estão alegados e são estes os factos que, a provarem-se, demonstram que a recorrida representou o efeito da sua conduta e que o quis como resultado da sua actuação, apesar de bem o saber ilícito e, em consequência, revelam que agiu com dolo directo …”.
Os co-RR., aqui ora recorridos, uma vez notificados e decorrido o respectivo prazo legal não apresentaram quaisquer contra-alegações (cfr. fls. 204 e segs.
).
O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA emitiu pronúncia na qual conclui no sentido de ser negado provimento ao recurso jurisdicional (cfr. fls. 292/295).
Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
*2.
DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, págs. 459 e segs.; M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 2.ª edição revista, págs. 850 e 851, nota 1; Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” – in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71).
As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida na parte que julgou procedente a excepção de falta de personalidade...
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