Acórdão nº 01148/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelVALENTE TORRÃO
Data da Resolução05 de Junho de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: 1. M..., contribuinte fiscal nº ..., residente ..., veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Beja que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios do ano de 1996, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:

  1. Considerou-se na sentença que todos os fundamentos aduzidos pelo recorrente, apartando aqui o da caducidade, em sede de impugnação judicial não mereciam provimento e daí a improcedência da acção.

  2. Assim entendeu-se na sentença que teria ocorrido preterição de formalidade essencial ao não ter sido concedida ao recorrente a faculdade de exercer o seu direito de audição antes do acto de liquidação mas que a mesma se degradaria em não essencial uma vez que o acto tributário não poderia ter outro conteúdo decisório.

  3. Importa recordar que no recurso efectuado a métodos indirectos pela DGCI se estabeleceu uma margem de lucro (bruta) nas alegadas operações efectuadas pelo recorrente de 20% e que este sempre manteve que recebia uma comissão de 2% que lhe era paga pela pessoa para quem trabalhava.

  4. Pelo que ainda que se aceitasse, que não se aceita, que a DGCI se encontrava legitimada para tributar, a participação do recorrente na formação da decisão que veio a ser praticada (e com reflexos directos na sua esfera jurídica) jamais poderia ser dispensada.

  5. Sendo certo, como dito na sentença, que a DGCI se encontra submetida a poderes vinculados importa não confundir, como a sentença confundiu, entre o poder de tributar (este sim vinculado) e o estabelecimento da margem de lucro do recorrente (este aqui onde existe uma margem de discricionariedade que foge à questão dos poderes vinculados).

  6. Só sendo, eventualmente, de admitir a degradação em não essencial da formalidade quando, sem margem para quaisquer dúvidas, a decisão não poderia ter sido diferente ainda que o contribuinte-/recorrente participasse na formação da mesma.

  7. Ora como sobredito o estabelecimento de uma margem de 20% nas operações realizadas pelo recorrente, contestando este tais valores como o fez e pretendendo fazer os seus argumentos junto da DGCI para demonstrar a bondade da sua tese, não é de molde a poder-se considerar dispensável a sua audição antes do acto de liquidação.

  8. Pelo que entende o recorrente, e bem ao contrário do decidido pela sentença, que foi preterida uma formalidade essencial que não se degradou em não essencial, conducente à anulação do acto de liquidação.

  9. Também não procedeu o argumento usado peio recorrente de que teria ocorrido falta de fundamentação da liquidação, entendo-se na sentença que o recorrente não havia requerido a passagem de certidão da qual constasse aquela.

  10. Também por aqui não se decidiu bem porquanto o artigo 37° do CPPT é expresso ao dizer que «pode o interessado» e não que «deve o interessado».

  11. Ou seja a lei estabelece uma faculdade e não uma imposição ao interessado aqui recorrente.

  12. E não havendo in casu razões para presumir que o legislador se exprimiu em termos medíocres, dizendo mais ou menos do que querería dizer, então facilmente se demonstra que falece de razão a sentença que assim não entendeu.

  13. Também não colheu na sentença o alegado pelo recorrente no sentido de que o acto de liquidação continha a assinatura do Director-geral dos impostos, aposta por via mecânica (impressão por meios informáticos automáticos) não tendo sido o Director-Geral dos impostos que introduziu tais dados em computador, corporizando a determinação do imposto, mas sim um outro qualquer funcionário, cuja identidade o recorrente desconhece, por não ter acesso a tal informação.

  14. Rebate a sentença dizendo que como o acto em causa se insere na categoria dos actos de massa tal tipo de assinatura mecanográfica seria lícita.

  15. Não se trata, no caso concreto, de proceder à prática de actos administrativos em série, como sucede, por exemplo, nas liquidações efectuadas na sequência da apresentação das declarações modelo nº 3, de IRS.

  16. Bem pelo contrário trata-se, aqui, de uma situação particular, singular, q) A qual não é subsumível ao conceito de "acto em massa".

  17. Os actos passíveis de ser qualificados como actos massivos são aqueles a que a jurisprudência a que segue já se referiu nos seguintes termos; «- A liquidação em IRC, porque feita centenas de milhares de vezes em cada ano, constitui "um acta de massa" e, porque assim é, tudo aconselha a que não se exija de tais actos o mesmo rigor formal que se deve exigir dos outros actos administrativos que se destinam a situações específicas individualizadas".

  18. O que como será bom de ver não é manifestamente o caso.

  19. Por fim acolheu-se na sentença o entendimento da DGCI que estava muito bem a fixação uniforme de margem de lucro bruto para todos os anos inspeccionados de 20%.

  20. Desconsiderando-se totalmente a prova testemunhal produzida (ao tempo ainda vertido em acta os respectivos depoimentos e não gravados) que foram unívocas, sem que tal tenha sido infirmado pela Fazenda Pública, na afirmação de que o recorrente recebia uma comissão de 2% sobre as operações que realizava não a titulo pessoal mas trabalhando para Hugo Custa, empresário espanhol v) Mas ainda mais grave é que a DGCI não fundamenta minimamente o porquê de ter estabelecido aquela margem de 20%, ainda por cima de forma uniforme para todos os quatro anos inspeccionados, e não qualquer outra.

  21. Nos termos do artigo 77° da LGT as decisões do procedimento têm de ser devidamente fundamentadas.

  22. E o que é facto é que aquele estabelecimento da margem de 20%, de forma uniforme, não assenta em quaisquer factos ou sustentáculo sólido que permitam a produção de tal afirmação.

  23. Violou a sentença o artigo 60° da LGT, 267°, nº 5 da CRP, 37° do CPPT, 9°, nº 3 do CC, 77° da LGT e incorreu ainda em erro de julgamento ao subsumir o acto de liquidação em causa na categoria dos actos de massa bem como ao ignorar os depoimentos das testemunhas que impunham solução diversa para o pleito Nestes termos e nos melhores de Direito deverá a sentença ser revogada e substituída por uma outra que dê provimento à impugnação apresentada.

  1. O MºPº emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (v. fls. 354).

  2. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.

  3. São os seguintes os factos dados como provados em 1ª instância e que relevam para a decisão: A) Em 1995-11-03, o Impugnante apresentou declaração de início de actividade de "agentes do comércio para grosso misto sem predominância", cujo CAE é 051 190, ficando enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral para efeitos de IV A e na categoria C de rendimentos para efeitos de IRS (cfr. fls. 31 do Processo Administrativo - PA junto aos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); B) Em 2001-02-20, entregou declaração de cessação de actividade com efeitos reportados a 1996-02-20 (cfr. fls. 31 do PA junto aos autos cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); C) Em 2001-07-02, na sequência de acção de fiscalização à escrita do Impugnante, relativamente aos anos de 1996, 1997, 1998 e 1999, os serviços de fiscalização tributária realizaram um projecto de relatório de inspecção tributária, tendo, em síntese, apurado a falta de entrega de declarações periódicas de IVA e das declarações anuais de IRS, a inexistência de contabilidade e obtido, no âmbito da cooperação administrativa intracomunitária, informação relativa aos operadores espanhóis envolvidos em relações comerciais com o Impugnante, Determinou-se assim o volume de negócios, bem como o resultado tributável por recurso à aplicação de métodos indirectos (cfr. teor de fls. 52 a 72 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); D) Em 2001-07-03, a Direcção de Finanças de Santarém emitiu o ofício nº 4244, através do qual foi o Impugnante notificado (em data ilegível), por carta registada com aviso de recepção para, relativamente ao projecto acima melhor identificado, exercer o seu direito de audição, o que não fez (cfr. teor de fls. 50 e 51 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); E) Em 2001-08-06, o Director de Finanças de Santarém, por delegação, confirmou nos termos propostos, nomeadamente o recurso à aplicação de métodos indirectos em sede de IRS e os consequentes efeitos para IVA, o Relatório da Inspecção Tributária realizado (cfr. teor de fls. 28 e 28 a 48 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); F) Em 2001-10-01, não se conformando com a decisão resultante das conclusões do relatório acima melhor identificado, o Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável (cfr. fls. 14 a 21 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); G) Em 2001-11-29, o Presidente da Comissão Distrital de Revisão da Direcção de Finanças do Distrito de Santarém, "tendo presente a posição de ambos os peritos que integra a acta nº 41, conclui que o valor proposto pelo Perito da Administração é o mais razoável tendo em consideração o exposto no respectivo parecer e, os factos explicitados no relatório elaborado pela fiscalização ... " (cfr. fls. 5 a 12 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); H) O impugnante não foi ouvido antes da liquidação.

    I) Em 2001-12-28, foi o Impugnante notificado da liquidação adicional de IVA apurada por métodos indiciários (cfr. fls. 75 a 78 do PA junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); J) Em 2002-05-02 deu entrada a presente impugnação judicial (cfr. carimbo aposto no canto superior direito de fls. 2).

  4. De acordo com as conclusões das alegações, são as seguintes as questões a apreciar no presente recurso: a)Violação do direito de audição do recorrente no respectivo procedimento (conclusões das alíneas b) a h) ); b) Falta de fundamentação das liquidações (conclusões das alíneas i) a h) ); c) Incompetência do...

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