Acórdão nº 02202/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

E..., Lda., com os sinais nos autos, inconformada com a decisão incidental preliminar de decretamento provisório de providência cautelar em sede de procedimento de formação de contrato (artº 131º nº 3 CPTA), proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, dela vem recorrer concluindo como segue: 1.

A douta sentença de que ora se recorre foi proferida nos termos do nº 6 do artigo 131° do CPTA, sobre o decretamento provisório das seguintes providências cautelares: i. Suspensão do procedimento de formação do contrato para fornecimento de refeições em refeitórios escolares, sustendo os efeitos do despacho do Secretário de Estado-Adjunto da Educação, de 31 de Agosto de 2006 (...); ii. Intimação do Requerido a manter o fornecimento de refeições relativo aos grupos de escolas (...) F a cargo da Requerente, ora Recorrida.

2.

O douto Tribunal a quo confirmou a intimação do Requerido (Ministério da Educação) a manter o fornecimento de refeições relativo aos grupos de escolas C, E e F a cargo da ora Recorrida, pelas mesmas razões de interesse público, o decidido em sede de decretamento provisório.

3.

Ora, esta visão da questão sub judice não é, salvo o devido respeito, correcta, nem consentânea com a realidade.

4.

A ora Recorrente discorda da douta sentença recorrida, pelas razões e pelos fundamentos que se explanarão de seguida.

5.

Em 8 de Setembro de 2006, deram entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, os presentes autos de tutela cautelar; 6.

Em 12 de Setembro de 2006, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto declarou-se territorialmente incompetente, tendo ordenando a remessa dos autos para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa 2 (Loures) em 13 de Setembro de 2006; 7.

O decretamento provisório das providências cautelares requeridas foi efectuado apenas no dia 18 de Setembro de 2006; 8.

Ora, atente-se no disposto no n.° 3 do artigo 131° do CPTA: 9.

Estamos, portanto, perante mecanismos excepcionais que, nas palavras de Rodrigo Esteves de Oliveira "escapam à lógica normal ou comum do processo cautelar, para serem utilizados apenas quando haja um motivo excepcional justificativo " 10.

Afastado o cenário dos direitos, liberdades ou garantias, que no caso concreto não tem aplicação, o decretamento provisório das providências dependerá da verificação do requisito "outra situação de especial urgência ".

11.

Escreve Mário Aroso de Almeida a este propósito que "...

o primeiro aspecto a reter quanto a este ponto tem que ver com a necessidade de se densificar esta última fórmula ("situação de especial urgência ")..." 12.

Acrescenta o mesmo autor que "A utilização da fórmula "outra situação de especial urgência " dá, no entanto a entender que o legislador reconhece, desde logo, que existe uma "especial urgência" quando há possibilidade da lesão iminente e irreversível de um direito liberdade ou garantia e pretende estender o mesmo regime de protecção a outras situações do mesmo tipo, que lhe sejam comparáveis - ou seja, a outras situações em que exista a possibilidade da consumação de uma lesão iminente e irreversível", (destaque nosso) 13.

Concluindo que "a nosso ver, está, pois, aqui insito um dos dois requisitos de que em termos gerais, o artigo 120° nº 1 faz depender, nas suas alíneas b) e c), a concessão de providências cautelares: o periculum in mora, que se concretiza no perigo de uma lesão irreversível - "fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação"" (destaque nosso) 14.

"Sucede, entretanto, que no âmbito do decretamento provisório, o periculum in mora tem de ser qualificado, na medida em que não se reporta apenas à morosidade do processo principal, mas à morosidade do próprio processo cautelar" estando em causa "o perigo da constituição de uma situação irreversível se nada for feito de imediato, antes ainda do momento em que virá a ser decidido o próprio processo cautelar. " 15.

In casu, segundo a decisão de que ora se recorre, decretamento provisório requerido foi fundado numa alegada situação de "especial urgência".

16.

A Mma. Juiz de 1a instância bem reconhece, a actualidade da situação de "especial urgência" tinha como elemento fulcral, o início do ano lectivo das escolas.

17.

O lapso temporal decorrido entre a entrega do requerimento de providência cautelar e o momento do despacho, aliás reconhecido pelo douto Tribunal "a quo" (nada mais do que 10 dias!) deveria ter sido ponderado, ou seja, tendo decorrido 10 dias poderia acontecer (e aconteceu) que a situação em causa já não existisse.

18.

Tal situação já não existia de facto ao tempo do seu decretamento: as escolas em questão já tinham iniciado o ano lectivo e o fornecimento de refeições já estava assegurado pela Eurest, ora Recorrente; 19.

Aliás, e como foi alegado pela ora Recorrente, no dia da apresentação do requerimento já a Recorrida sabia que a Recorrente lá estava.

20.

Já não se verificando o periculum in mora: a situação já estava consumada.

21. É, portanto, ilegal o decretamento provisório das providências cautelares.

22.

E nem se diga que a lei não prevê mecanismos próprios para uma aturada decisão no momento do decretamento provisório.

23.

Relembramos o que dispõe o número 5 do artigo 131° do CPTA.

24.

Conforme esclarece Mário Aroso de Almeida a "audição do requerido apenas tem lugar "quando as circunstâncias o imponham " (circunstâncias relacionadas com a natureza da providência e a especificidade do caso) podendo ser, nesse caso utilizado "qualquer meio de comunicação que se revele adequado" (n.°4), incluindo o contacto telefónico " 25.

Parece evidente que o requisito de "especial urgência" se fundava no decurso de um curto lapso temporal, como o reconhece a própria Recorrida, ao afirmar no artigo 198° do seu requerimento que "temos alguns dias, pois, posto que parcos, parcos dias".

26.

O douto Tribunal a quo tinha o dever de se inteirar junto da Entidade Requerida facilmente concretizado através de um simples telefonema se a situação de especial urgência ainda se verificava, 27.

Tanto mais grave é a situação uma vez que não está em causa apenas a suspensão do procedimento de formação do contrato, mas também a intimação do Requerido a "manter" o fornecimento de refeições a cargo da ora Recorrida 28. Tal facto, assenta num pressuposto - errado - de que a ora Recorrida se mantinha efectivamente a prestar serviços, o que não acontecia pois o seu terminara no fim do ano lectivo de 2005/2006, i. e, em Junho de 2006.

29.

É bem esclarecedor o alegado pelo Ministério da Educação, na sua oposição de 27 de Setembro de 2006, constante de fls. 610 a fls. 620, quando no seu artigo 14° refere que o facto de no ano lectivo anterior os Grupos C, E e F terem sido adjudicados ao requerente não integra qualquer critério de continuidade. Não pode, assim, falar-se em "manter o fornecimento" como erradamente faz a requerente.

30.

A Mma. Juiz de lª Instância reconhece na sentença ora recorrida que "a primeira decisão [o decretamento provisório nos termos do n° 3 do artigo 131° do CPTA] tem um risco que o legislador assumiu. Mas é um risco calculado, na medida em deve ser rapidamente seguido de uma segunda definição." 31.

Tal "risco calculado" pressupõe um decretamento provisório com base em factos actuais, em que se verifique o requisito da "especial urgência" e que deve ser tomado "no prazo de quarenta e oito horas".

32. No momento em que foi decidido o decretamento provisório, a "especial urgência" já não se verificava.

33.

Veja-se o que escreve Mário Aroso de Almeida: "Afigura-se, pois, que, como o nº 3 dá apenas 48 horas ao juiz para decidir, num primeiro momento, sobre o decretamento provisório e o nº 4 parece admitir que, por regra, o decretamento provisório proferido nessas circunstâncias tenha lugar sem contraditório, o nº 6 terá, sobretudo, o propósito de dar ao juiz, ainda em sede de decretamento provisório, a oportunidade de rever a sua decisão... " (destaque nosso) 34.

Ora no caso em apreço decorreram nada mais do que 10 dias entre a entrada do pedido e o referido decretamento.

35.

Tal risco é assumido no pressuposto de uma segunda definição, a qual, caso deixe de se verificar a "especial urgência" deve ser no sentido do levantamento do decretamento provisório.

36.

A decisão ora recorrida, não só não partiu do pressuposto errado com base no qual decretou provisoriamente as providências requeridas pela ora Recorrida, 37.

Como também manteve o pedido de "intimação do Requerido a manter o fornecimento de refeições (...) a cargo do Requerente"; 38.

Tal pedido só agora tem actualidade, face a um decretamento provisório ilegal, decidido com base numa análise sumária que foi determinada incorrectamente.

39. O douto tribunal a quo não pode vir agora invocar uma situação de facto, criada por si, para defender a manutenção do decretamento provisório das providências.

40.

Assim, não há fundamento para o decretamento provisório, sendo também ilegal a decisão de confirmação da providência requerida, decisão de que ora se recorre 41.

A decisão ora recorrida, viola o disposto no artigo 131º n.° 6 do CPTA.

42.

Escreve Mário Aroso de Almeida, que na "segunda fase do processo de decretamento provisório (...) o disposto no artigo 120º, ainda que com as adaptações que se revelem necessárias em função da maior celeridade pretendida" deve ser aplicado nos aspectos não regulados no número 6° do artº 131° do CPTA.

43.

Assim, nesta sede, não foram devidamente ponderados os seguintes aspectos: a. Evidência da procedência do pedido a deduzir no processo principal; b.

Ponderação dos danos resultantes da adopção ou da não adopção da providência cautelar.

44.

Quanto à evidência da procedência do pedido a deduzir no processo principal, a ora Recorrida alegou que "o despacho em crise enferma de um erro manifesto de interpretação" por ter entendido que a proposta da ora Recorrida não teve em conta os encargos sociais que incidem sobre os Subsídios de Férias e...

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