Acórdão nº 02168/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Manuel ..., com os sinais nos autos, inconformado com o indeferimento liminar da petição de acção popular por si interposta, proferido pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, dele vem recorrer concluindo como segue: A) A acção administrativa comum foi proposta pelo ora Recorrente ao abrigo do nº 2 do art. 9° do CPTA, no qual se prevê expressamente a protecção dos valores e bens constitucionalmente protegidos do urbanismo e do ordenamento do território, B) São esses os valores e interesses em causa quando se constata que, nos terrenos referido nos autos foram efectuadas construções (i) sem qualquer licença, (ii) num local onde não é permitido construir segundo as normas regulamentares aplicáveis e (iii) em violação do clausulado no contrato de aquisição dos referidos terrenos, que os destina "única e exclusivamente" a espaços verdes e estacionamento e proíbe qualquer vedação ao acesso do público em geral.

C) Trata-se de defender o interesse que toda a comunidade tem na observância da legalidade no que a estes valores diz respeito.

D) A proibição clausulada no contrato de alienação, dos terrenos é a de vedar o local, independentemente de tal vedação ser ou não completa, ter ou não portões ou outras formas de atravessamento.

E) Acresce que esta proibição não é a única: do Plano de Pormenor da Zona do Sagrepe resulta uma proibição, pura e simples, de construção (seja que construção for) no local, e é genericamente proibida a construção sem licença, nos termos do artº 4°do D.L.555/99.

F) A Acção Popular, como instituto de carácter objectivista, pode ser utilizada para obter a reposição de uma situação de violação da legalidade em que estão afectados interesses difusos ou de toda a comunidade, sem que haja necessidade de demonstrar qualquer prejuízo ou dano subjectivado, individual ou colectivo, proveniente da situação de violação da legalidade: é mesmo o meio próprio para o efeito.

G) De qualquer forma, ficou claramente apontada na petição inicial a lesão interesses urbanísticos e de ordenamento do território e mesmo ambientais, que advém para a comunidade da limitação ou total exclusão de acesso à zona em causa, assim como da edificação de construções em locais destinados em favor da comunidade - "única e exclusivamente" - a zonas verdes, e nos quais é proibido, também em favor da comunidade, construir.

H) Não é viável uma eventual correcção e legalização das referidas construções pela via administrativa, face à proibição regulamentar de construção no local e à proibição contratual de vedação do mesmo.

I) A competência atribuída ao Presidente da Câmara Municiai para aplicar coimas (leia-se, determinar a instauração de procedimentos de contra-ordenação e prosseguir os trâmites devidos no respeito integral pelas garantias dos administrados), não é uma mera faculdade, mas um dever legal, expressamente previsto no art. 98° n° 10 do D.L. 555/99, J) O mesmo se diga da participação de situações susceptíveis de integrarem ilícitos criminais, a fim de desencadear os respectivos processos-crime, previstas no art. 101° do D.L. 555/99.

K) Estão em causa verdadeiros deveres legalmente impostos à Administração, cujo cumprimento pode e deve ser sindicado pelos Tribunais, sem qualquer lesão do princípio da separação de poderes, uma vez que se trata apenas de verificar e ordenar o cumprimento estrito da lei.

L) Á Câmara Municipal e o Presidente da Câmara têm o dever de fiscalização da legalidade urbanística e do ordenamento do território, devendo lançar mão de todos meios necessários para repor a legalidade no terreno.

M) Os sinais de trânsito colocados das extremidades da via em causa impossibilitam, pública e serve para o trânsito de veículos automóveis, independentemente dos motivos na prática, a utilização desta via pelo público em geral, sendo certo que a referida via que tenham para ali passar.

N) Ficou vedada a utilização pelo público de um bem que é do domínio público.

O) A finalidade específica da estrada é a da circulação automóvel, e é precisamente essa a utilização que está vedada, ao público em geral, pelo que se impõe reconhecer que aquele bem público e a sua utilidade foram submetidos ao interesse e à utilização de apenas um privado, comprometendo-se, assim, toda a utilidade pública própria de um bem que tem a natureza específica de "estrada", independentemente de se poder passar pelo local a pé.

P) As pretensões manifestadas dizem directamente respeito à defesa do domínio público, dos bens do Estado, e da possibilidade de todos os usufruírem, estando estes valores expressamente previstos no art. 9°, nº 2 do CPTA na alínea b) do n° 3 do art 52° da Constituição e no n° 2 do art, 1° da Acção Popular.

Q) A norma que, inserida no núcleo de interesses a defender, se mostra violada é a que confere à Câmara Municipal a competência para regulação sinalização do trânsito, uma vez que a colocação dos sinais em questão, ao restringir quase totalmente o acesso automóvel à referida via, visa objectivamente atingir um fim diverso do que a lei tinha em vista quando atribuiu ao município a competência para colocação de sinais de trânsito, que era a da regularização do tráfego automóvel, permitindo uma circulação segura e ordenada, não o de privatizar o acesso às estradas públicas.

R) Não cabe ao Tribunal deixar de aplicar a lei com base em juízos de mérito sobre a actividade administrativa.

* O Município de Elvas e contra-interessada Jardimtur - Actividades Hoteleiras Lda. não contra-alegaram.

* Com dispensa de vistos substituídos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Senhores Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão, em conferência - cfr. artº 707º nºs 2 e 3 CPC ex vi artº 140º e 36º nº 2 CPTA * O despacho de indeferimento liminar proferido pelo Mmo. Juiz ao abrigo do disposto no artº 13º da Lei 83/95 de 31.08, é do tero que se transcreve: "(..) Manuel ..., NIF 160 500 826 e demais sinais dos autos, veio intentar a presente acção popular administrativa, "fazendo uso do seu direito de acção popular, nos termos do art° 9°, n° 2 do CPTA e da Lei n° 83/95 de 31 de Agosto", contra o Município de Eivas e indicando como titulares dos interesses em causa na acção a sociedade Jardimtur - Actividades Hoteleiras, Lda, pessoa colectiva n° 502 893 630 e demais sinais dos autos.

Peticiona o seguinte: "Nestes termos, deverá a presente acção ser julgada procedente por provada e em consequência: 1. Ser condenado o Município de Eivas a ordenar a demolição da cerca e do telheiro/alpendre construídos nos terrenos alienados à JARDIMTUR, acima identificados, e a reposição e arranjo do terreno para utilização como zona verde, em prazo não superior a 15 dias.

  1. Ser condenado o Município de Eivas a proceder directamente ou através de terceiro à referida demolição, reposição e arranjo, caso a proprietária actual dos terrenos não o faça por si, e a fazê-lo num prazo não superior a 15 dias, contados do termo do prazo referido em 1.

  2. Ser condenado o Município de Elvas a instaurar os processos de contra-ordenação e criminais que forem devidos em caso de incumprimento da ordem referida em l.

  3. Ser condenado o Município de Elvas a alterar a sinalização da estrada secundária acima referida de forma a permitir o acesso do público em geral a essa via, em concreto retirando pelo menos um dos dois sinais de trânsito proibido, e permitindo a circulação dos veículos em geral pelo menos num dos sentidos da via.

    Mais se requer seja condenado desde já o titular do cargo de Presidente da Câmara de Elvas, ou os membros ou titulares dos órgãos municipais que se entender serem competentes para executar a decisão que vier a ser proferida, a pagar uma sanção pecuniária compulsória no valor que se entender adequado para assegurar a efectividade do...

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