Acórdão nº 00758/06.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução29 de Março de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

C…, S.A., pessoa colectiva n.º … com sede na Rua …, Lisboa, e MINISTÉRIO DO AMBIENTE, DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL vêm interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Coimbra, que suspendeu a eficácia do Despacho n.º 16 447/2006, do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional, de 21 de Julho. Para tanto alega, em conclusão, a C…: 1. Dos fundamentos invocados pelo requerente, foi na questão de saber se estavam ou não em causa circunstâncias excepcionais que permitissem que o Ministro competente exercesse o poder discricionário, que a lei expressamente lhe conferiu, de dispensa de AIA, que o Tribunal veio a sustentar a sua decisão; 2. A utilização por parte da Lei do conceito indeterminado – circunstâncias excepcionais - remete inequivocamente para uma verdadeira discricionariedade de previsão, também apelidada de margem de livre apreciação a que se associa uma discricionariedade de estatuição; 3. É a entidade legalmente competente, e não o requerente da providência, nem o Tribunal, que terá de verificar se, perante o caso concreto apresentado, existem, ou não, circunstâncias excepcionais que justifiquem a dispensa do procedimento de AIA; 4. Sendo esta uma decisão discricionária, apenas pode ser sindicada em termos muito restritos, quanto aos aspectos vinculados; 5. Para não extravasar os seus poderes, o Tribunal poderia apenas verificar, ainda que numa análise perfunctória, se o acto do Ministro estava ferido de vício de forma, de incompetência, de desvio de poder, de violação dos princípios constitucionais, de vícios da vontade ou ainda em caso de erro grosseiro e manifesto na apreciação dos pressupostos de facto ou de direito; 6. Não sendo grosseiro e manifesto o erro de avaliação, já que nenhum dos demais potenciais vícios foi sequer invocado ou analisado, não poderia o Tribunal apreciar a decisão ministerial, não podendo, por isso mesmo, por maioria de razão, decidir a suspensão do acto praticado; 7. Indeferida a pretensão do requerente ao abrigo da alínea a) do art. 120.º do CPTA, tornava-se necessário compulsar os alegados fundamentos invocados, com todos os requisitos exigidos pela alínea b) do art. 120.º do CPTA; 8. Nos termos deste artigo, o Tribunal apenas pode decretar uma providência conservatória como a solicitada, nos casos em que, não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito; 9. No caso sub judice, a prova do fundamento da pretensão é mais exigente, na medida em que só terá fundamento se demonstrar que a decisão ministerial incorreu em erro manifesto ou grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto ou de direito; 10. Mas ao contrário do que seria de esperar, para o Tribunal foi suficiente que se alegassem (mesmo sem se provarem) vícios que, em abstracto, geram anulabilidade dos actos, para se considerar, ipso facto, que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão; 11. Acontece que, uma coisa é uma avaliação sumária dos vícios apontados, própria da tutela cautelar, outra, bem diferente, é a afirmação de que a avaliação sumária se basta pela mera verificação de que o requerente invoca, em abstracto, vícios que, segundo o Código do Procedimento Administrativo, podem conduzir, se eventualmente viessem a ser provados, independentemente do grau de probabilidade de isso poder vir a suceder, à anulação de actos administrativos; 12. Em parte alguma resultou provado que o requerente tenha logrado demonstrar, com mínimo grau de probabilidade ou de verosimilhança, que o Ministro tenha cometido erros grosseiros e manifestos de avaliação dos pressupostos de facto ou de direito em que estribou a decisão de dispensa da AIA.

  1. É o Tribunal que comete um erro nos pressupostos de Direito ao interpretar o art. 3.º do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 8 de Novembro, e o art. 5.º do Decreto-Lei n.º 85/2005, de 28 de Abril, no sentido da obrigatoriedade da AIA relativamente aos procedimentos para licenciamento de instalações de co-incineração; 14. O Tribunal parte do pressuposto errado de que sempre que o Ministro dispensasse a AIA, estaria a aceitar que a instalação a licenciar pudesse causar danos ao ambiente e à saúde pública; 15. Com efeito, a lei permite que a conclusão de que um projecto não causa danos ao ambiente se possa fazer, não só através de uma AIA favorável, como, também, através de uma avaliação efectuada pelo Ministro, naturalmente com base noutros dados, estudos, pareceres, informações, testes, que o levem a considerar, justificada e fundamentadamente, não ser necessário efectuar uma AIA para se concluir que não existem danos relevantes para o ambiente ou para a saúde pública, assim dispensando essa mesma AIA.

  2. Razão pela qual não podem ser desvalorizados, como acabou o Tribunal por fazer, todos os estudos e informações que instruíram a decisão ministerial; 17. Nestes termos, forçoso se torna também considerar completamente deslocadas e erróneas todas as afirmações do Tribunal, no sentido de qualificar a dispensa da AIA como uma decisão restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias; 18. Não ficou assim minimamente provada a existência de qualquer fumus que indicie a existência de uma ilegalidade na decisão ministerial, o que deveria ter inviabilizado, desde logo, o decretamento da providência cautelar, e que seguramente levará à revogação da decisão tomada; 19. A revogação da providência cautelar deferida impõe-se ainda pela falta de verificação do requisito do periculum in mora; 20. O periculum in mora apenas se verificaria se o requerente tivesse provado que a mera execução do acto ministerial, só por si, teria capacidade de provocar danos no ambiente e na saúde pública, a ponto de se poder considerar que o não decretamento da providência cautelar geraria uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação; 21. O Requerente não fez qualquer prova da existência de periculum em mora, o que aliás seria completamente impossível de demonstrar; 22. Surpreendentemente, e apesar de reconhecer que o requerente da providência não provou o periculum in mora, o Tribunal acabou por não valorar negativamente essa ausência de prova; 23. Com efeito, o despacho em crise consubstancia uma decisão que não se encontra no final do procedimento de licenciamento, sendo ainda necessário cumprir, nos termos do previsto no Decreto-Lei n.º 85/2005, de 28 de Abril, um conjunto de outros procedimentos administrativos, antes de se iniciar a queima dos resíduos perigosos; 24. O Tribunal não teve ainda em consideração toda a prova (pareceres e testes) que a entidade requerida e a contra-interessada ofereceram aos autos, e que demonstra que este modo de tratamento de resíduos industriais perigosos não representa qualquer perigo quer para o ambiente, quer para a saúde pública; 25. Finalmente, também o critério da ponderação dos interesses em presença, a que o Tribunal deve deitar mão, apenas nos casos em que tenha ficado provado o fumus boni iuris e o periculum in mora, não foi convenientemente apreciado; 26. Aqui é mais uma vez relevante recordar o facto de a mera prolação do despacho ora posto em crise não ter a virtualidade de implicar a produção de qualquer dano para o ambiente ou para a saúde pública, uma vez que não se encontra no final do procedimento de licenciamento; 27. Nestes termos, os danos causados com a concessão da providência (e que correspondem aos motivos invocados no despacho posto em crise), são naturalmente superiores aos inexistentes danos causados com a sua recusa; 28. Também nesta sede reconheceu o Tribunal que o requerente não efectuou qualquer prova de que a decisão do ministro acarreta algum risco para os bens jurídicos em presença; 29. Não tendo ficado provado que esta providência era necessária ou sequer adequada para proteger os interesses alegados pelo requerente, o indeferimento da providência em questão tornava-se inevitável, também de acordo o n.º 3 do art. 120.º do CPTA; 30. A sentença que suspendeu o despacho ora posto em crise viola, assim, a lei substantiva e processual, razão pela qual deve ser revogada.” O Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional conclui as suas alegações da seguinte forma: “1. Ao ter incluído na matéria dada como provada a matéria constante do artigo 70.º do requerimento inicial, a douta sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do artigo 118.º, n.º 1 do CPTA e do artigo 490.º n.º 2 do CPC, que assim saem violados.

  3. Ao ter decretado a providência requerida sem que o requerente tivesse provado a existência de qualquer prejuízo de difícil reparação, a douta sentença violou o artigo 120.º, n.º 1, al. b) do CPTA.

  4. E violou ainda, pelos mesmos motivos, o disposto no artigo 114.º, n.º 2, al. g) do CPTA.

  5. A douta sentença é nula, por contradição entre os fundamentos e a decisão (artigo 668.º, nº 1, al. c) do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA), ao decretar a providência reconhecendo que o requerente não fez prova de periculum in mora.

  6. A douta sentença recorrida aplicou à decisão da causa a redacção original do artigo 5.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 85/2005, de 19.4, e não aplicou a fórmula legal actualmente em vigor, deste modo violando aquele preceito.

  7. A decisão recorrida fez aplicação ao caso em apreço de um pretenso princípio geral de direito do ambiente - o denominado princípio da precaução - cuja aplicabilidade na ordem jurídica portuguesa não pode ser sufragada.

  8. O douto despacho recorrido de fls…, ao ordenar a junção aos autos de despacho de designação, viola o disposto no artigo 32.º n.º 2 do CPC, aplicável por força do artigo 1.º do CPTA, preceitos que assim saem violados.

  9. Na verdade, na junção do documento não se levantam quaisquer questões de direito.

  10. Em consequência, o douto despacho, ao ordenar a ratificação do processado, fez errada interpretação e aplicação dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT