Acórdão nº 01271/04.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório D…–Cooperativa de Ensino, Consumo e Habitação, CRL – com sede na rua …, Riba D’Ave – interpõe recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga – em 5 de Abril de 2006 – que absolveu o Ministério da Educação do pedido de anulação do despacho de 14 de Julho de 2004 do Secretário de Estado da Administração Educativa – por este despacho foi-lhe aplicada a pena de multa prevista na alínea b) do nº 1 da Portaria nº 207/98, de 28 de Março, graduada em 3 salários mínimos nacionais (1.096,80€), e foi ainda condenada a repor a quantia de 421.164,59€ com os fundamentos constantes das informações IGE 190/04 e 152/04-DRN (ADAJ).

Conclui as suas alegações da forma seguinte: 1- O DL nº 553/80, de 21 de Novembro (Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) não estava “autorizado” pela Lei nº 9/79 (Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo) a legislar sobre matéria de ilícitos contra-ordenacionais e respectivas sanções, pelo que, nessa parte está ferido de inconstitucionalidade orgânica; 2- Ainda que assim se não entenda, após a revisão constitucional de 1982, este DL nº 553/80, em especial o seu artigo 99º, passaram a ficar em situação desconforme à Constituição, quer do ponto de vista material quer orgânico - inconstitucionalidade superveniente – na medida em que afronta o disposto no nº 5 do artigo 115º da CRP/82 (hoje nº 6 do artigo 112º da CRP), passando a remeter em branco toda a matéria sancionatória para um acto normativo de natureza regulamentar, operando a deslegalização de uma matéria que, pela sua natureza, é de reserva legislativa; 3- Por seu lado, a Portaria nº 207/98, publicada já após a revisão constitucional de 82, constitui um regulamento integrativo de natureza substantiva e procedimental, em clara e directa violação do citado nº 5 do artigo 115º da CRP/82; 4- Acrescendo ainda que tal Portaria já não podia sequer “legislar” sobre o regime de punição de infracções disciplinares e respectivo processo, por se tratar de matéria da competência exclusiva da Assembleia da República (artigo 165º nº 1 d) da CRP); 5- Daí que a sanção disciplinar aplicada à “D…” com fundamento no DL nº 553/80 e na Portaria nº 207/98, bem como as consequências financeiras dela decorrentes, estão feridas de violação da lei e de inconstitucionalidade; 6- Sem prescindir, a verdade é que também o Secretário de Estado da Administração Educativa aplicou aquela sanção de multa, e ordenou a reposição ou restituição de verbas, sem base legal que o habilitasse para tal, invocando uma delegação de poderes insuficientes, o que vicia a decisão recorrida, tornando-a anulável, por incompetência do autor do acto; 7- A questão fulcral discutida nos presentes autos está relacionada com a interpretação e aplicação das cláusulas contratuais dos contratos de associação celebrados nos anos lectivos de 1999/2000, 2000/2001, 2001/2002 e 2002/2003, entre a “D…” e a DREN; 8- O acórdão recorrido pressupõe erradamente que na execução dos referidos contratos de associação teriam existido orçamentos de despesa, aceites e assumidos reciprocamente pelas partes contratantes e que pudessem servir de vínculo contratual, quando nada disto existiu; 9- Houve um conjunto de factos dados como provados que contrariam este entendimento (facto assente sobre a letra N e factos provados sob os nºs 4, 24, 18, 21, 22, 29, 26); 10- A DREN (Direcção Regional de Educação do Norte) não solicitou à “D…” a elaboração ou entrega de qualquer orçamento para os anos lectivos em causa, nem a DREN, por seu lado, lhe apresentou qualquer orçamento alternativo ou padrão, bem como a DREN também, nem nesses anos lectivos, nem em qualquer momento posterior, solicitou à “D…” a apresentação de qualquer “conta de gestão” ou similar; 11- Ou seja, a real vontade das partes outorgantes dos contratos de associação em questão (DREN e D...) foi no sentido de considerarem que os preços a pagar à “D…” por força da celebração dos contratos de associação foram montantes globais, que a “D…” geriria como muito bem entendesse, no desenvolvimento do seu projecto educativo e pedagógico; 12- Aliás, do teor dos contratos juntos aos autos (folhas 47, 184, 310 do PA) resulta que neles estão inscritos valores globais; 13- Nos contratos de associação juntos aos autos também inexiste qualquer anexo ou adenda contratual que possa ser interpretada como “um instrumento para o qual o contrato remeta”; 14- No âmbito ou no clausulado dos contratos de associação em questão não existe qualquer obrigação de execução vinculada de um qualquer orçamento ou de um qualquer elenco de rubricas que contenham cabimentação de despesas; 15- As verbas globais atribuídas a título de pagamento do preço dos serviços de ensino prestados pela “D…”, nos anos lectivos em causa, destinou-se a ser aplicada em despesas incorridas com essa prestação de ensino, dispondo a “D…” de ampla liberdade de gestão dessas verbas; 16- De qualquer forma, tais verbas globais disponibilizadas pelo Estado, não preencheram a obrigação contratual assumida pelo Estado de pagar à “D…” um subsídio por aluno igual ao custo de manutenção e funcionamento por aluno das escolas públicas de nível e grau equivalente, como dispõe o nº 1 do artigo 15º do DL nº 553/80; 17- A controvérsia subjacente ao presente processo, que opõe o Ministério da Educação à “D…”, prende-se com a interpretação e aplicação da Lei e do Contrato de Associação, com vista a poder apurar-se se é o Estado que está em dívida perante a “D…” ou se é a “D…” que é credora do Estado; 18- Perante esta controvérsia sobre a validade, interpretação e aplicação dos termos e cláusulas do contrato de associação em referência, não podia o Secretário de Estado da Administrativa Educativa arvorar-se em julgador e decidir unilateralmente a obrigação de reposição de verbas, quando tal obrigação há-de ser apurada em acção e sede próprias; 19- O Ministério da Educação – Secretário de Estado da Administração Educativa – que foi parte co-outorgante deste contrato de associação, através da DREN, não pode, por mero acto administrativo, impor uma pretensa obrigação contratual fazendo prevalecer uma interpretação do contrato e das suas cláusulas, agindo como juiz em causa própria, em desrespeito pelo objecto do contrato e do seu equilíbrio financeiro; 20- Só uma decisão judicial, no âmbito de uma acção sobre contrato administrativo, permitirá a cada uma das partes aqui em confronto ver declarado o seu direito ao recebimento da quantia por cada uma delas pretendida; 21- Em conformidade com o que se escreve no acórdão recorrido, a existência de tal controvérsia acerca da validade, interpretação e aplicação das cláusulas contratuais, impede que a Administração faça uso do disposto no artigo 180º do CPA; 22- Tal entendimento já foi, de resto, sufragado por decisões proferidas pelo STA no âmbito dos Recursos nº 59/03 (1ª secção, 1ª subsecção) e nº 1912/02 (1ª secção, 3ª subsecção); 23- O acórdão recorrido, ao não considerar verificado o vício de usurpação de poder de que enferma o despacho recorrido, não faz correcta aplicação do disposto nos artigos 178º, 180º e 187º do CPA, pelo que deve ser revogado; 24- Sem prescindir, o acórdão recorrido é nulo, por falta de fundamentação e por omissão de pronúncia – artigos 668º nº2 alínea b) e nº3 do CPC – relativamente a um conjunto de questões relacionadas com a não verificação das infracções disciplinares imputadas à “D…”, nulidade essa que expressamente se invoca e se requer seja declarada; 25- Este conjunto de questões foi alegado na petição inicial (artigos 64º a 100º) e nas conclusões (33ª a 55ª), mas o tribunal “a quo” não chegou a conhecer delas, nem tão pouco a apreciá-las no acórdão recorrido; 26- Tratando-se de questões que, a procederem, poderiam conduzir à procedência da acção; 27- Por último, no que toca à alegada violação do princípio da igualdade, invocada pela ora recorrente nas suas alegações escritas, com base no tratamento diferente que a mesma entidade (IGE) conferiu a dois casos em tudo idênticos, os documentos juntos aos autos no decurso da audiência de discussão e julgamento, atestam a absoluta coincidência entre ambas as situações, sendo iguais os pressupostos de facto e igual a sua disciplina jurídica (leis aplicáveis e contratos); 28- Se, perante dois casos iguais, a Administração decidiu de modo diferente, prejudicando claramente a ora recorrente, o vício de violação do princípio da igualdade deveria ter sido julgado verificado, o que tornaria a decisão anulável, nesta parte.

Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido.

O Ministério da Educação concluiu as suas contra-alegações da forma seguinte: I. Não existe omissão de pronúncia do acórdão recorrido das matérias relacionadas com as infracções disciplinares, descritas nos artigos 64º a 100º da petição inicial e nas conclusões 33ª a 55ª das alegações escritas, porquanto com as mesmas a recorrente não logrou configurar qualquer vício que pudesse assacar ao acto administrativo que veio impugnar na presente acção administrativa especial; II. Nos termos do quadro jurídico acima exposto, a Administração, na prossecução do interesse público, detém poderes de administrar, no contexto dos contratos administrativos, e particularmente “tem competência para impor, em sede de processo disciplinar, a reposição de dinheiros públicos respeitantes a infracções cometidas por particulares no âmbito das relações emergentes de contratos de associação celebrados entre o Estado e as Escolas Particulares” sem que tal constitua invasão do espaço próprio reservado aos tribunais, pelo que é forçoso concluir pela não verificação do alegado vício de usurpação de poderes; III. Não estando o Governo impedido de legislar sobre o regime sancionatório, nem existindo, no caso concreto, outras limitações ou reservas de competência do Parlamento, de nenhuma ilegalidade ou...

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