Acórdão nº 00678/06.1BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução25 de Janeiro de 2007
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior vem interpor recurso jurisdicional da sentença de 18 de Outubro de 2006, que decidiu pela condenação do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a possibilitar à requerente S… a realização de novo exame na disciplina de Química (código 642) no prazo de 15 dias, a contar da data da notificação da sentença e a admitirem a requerente no ingresso do Curso de Medicina, na Faculdade de Medicina, da Universidade de Coimbra, no presente ano lectivo, desde que obtenha média de classificação final igual ou superior à do último candidato admitido a este Curso e Universidade, neste ano lectivo.

Para tanto alega, em conclusão: “ a) Nem o Decreto-Lei n.º 147-A/2006 de 31 de Julho nem o Despacho do Senhor Secretário de Estado da Educação n.º 16078-A/2006 de 1 de Agosto de 2006 foram geradores de restrição de direitos, liberdades ou garantias; b) Assim sendo, não é aplicável in casu a previsão do art.º 18.º n.º3 da C.R.P.

  1. Privilegiaram-se os factores de segurança e pressupostos de igualdade jurídica, restabelecendo-se a igualdade de oportunidades entre os candidatos da 1ª fase, desprotegidos dos seus direitos por factores externos, criados pelo próprio Estado e que lhes não eram de forma alguma imputáveis, relativamente aos da 2ª fase, em nada afectando ou minorando os direitos destes últimos.

  2. A retroactividade terá o beneplácito constitucional sempre que razões de interesse geral ou de conformação social, como foi o caso, a reclamem.

  3. A sentença recorrida deverá ser considerada nula nos termos da alínea d) do n.º 1 do art.º 668.º do C.P.C. por a convolação do procedimento ter acarretado uma diminuição de garantias das entidades demandadas em violação do art.º 199.º do C.P.C. tomando conhecimento de questões de que não podia decidir.

  4. A petição da A. não tem um mínimo de correspondência com os requisitos essenciais da Intimação, devendo ser declarada nula a sentença nos termos da alínea d) do art.º 668.º do C.P.C.

  5. O n.º 1 do art.º 76º da C.R.P. não consagra direito de estrutura análoga aos direitos, liberdades e garantias, pelo que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.

  6. O Tribunal não podia efectuar um controlo directo da constitucionalidade do Decreto-Lei n.º 147-A/2006 de 31 de Julho, pelo que a sentença é nula por força da alínea d) do n.º 1 do art.º 668º do C.P.C.

  7. Houve excesso de pronúncia do tribunal ao condenar as entidades demandadas no que não era peticionado, devendo a sentença ser considerada nula nos termos da alínea e) do n.º 1 do art.º 668.º do C.P.C.

  8. A A não se candidatou na 1ª fase ao curso de Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra pelo que a sentença é nula por força da alínea d) do n.º 1 do art.º 668º do C.P.C.

O Secretário de Estado da Educação também interpõe recurso da referida sentença concluindo da seguinte forma as suas alegações: “A – O Decreto-Lei n.º 147-A/2006, de 31 de Julho, e o subsequente Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, não são restritivos de direitos, liberdades e garantias.

B – Nestes termos, não lhes é aplicável a proibição de terem efeito retroactivo, como previsto no artigo 18.º, n.º 3, da CRP.

C – A adopção destas medidas legislativas, veio permitir que fossem assegurados os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, corolários de um Estado de Direito, visando-se precisamente garantir o princípio da igualdade e do acesso ao ensino superior em igualdade de oportunidades relativamente aos alunos que realizaram o exame de Química (código 642) na 1.ª fase (que foram prejudicados gravemente pelas circunstâncias excepcionais identificadas no Despacho n.º 16078-A/2006, de 2 de Agosto, e que manifestamente não lhes eram imputáveis), relativamente aos alunos que realizaram este exame na 2.ª fase, em nada afectando ou diminuindo os direitos destes últimos.

D – Assim sendo, considera-se que também não foram violados os artigos 2.º, 13.º, e 17.º, n.º 1, da CRP.

E – A douta sentença recorrida, ao decidir nos termos do entendimento nela perfilhado, é que ofendeu o estatuído nos artigos 18.º, n.º 3, 2.º, 13.º, e 76.º, n.º 1, da CRP.” A recorrida conclui as suas alegações da seguinte forma: “A – Quanto às alegações do recorrente Ministério da Educação 1 - Nos números 1 a 11 das alegações apresentadas pelo recorrente nenhuma crítica é feita ao juízo decisório constante da sentença, apenas ocorrendo uma enumeração descritiva dos motivos de facto e de direito (já conhecidos) que justificaram a decisão.

2 – O plasmado nos números 12 a 14 (no sentido de que inexiste ilegalidade, porquanto os alunos que realizaram o exame de Química na 2.ª fase tinham podido beneficiar do contacto prévio com o tipo de prova a que iriam estar sujeitos) constitui uma perfeita mistificação.

3 – Na verdade, e em primeiro lugar, porque o que motivou a repetição ilícita do exame de Química nada tinha que ver com o conhecimento antecipado ou não do tipo de prova, sendo perfeitamente evidente pela leitura do acto que as razões tinham a ver com a alegada circunstância de o ensino e preparação dos alunos de acordo com programa novo ter sido deficiente e tardio e de as notas terem sido por isso inferiores ao que era habitual – numa palavra, este motivo do acto está antes da questão do conhecimento do tipo de prova, nada tem a ver este ou irreleva-o prejudicialmente, não sendo a este respeito despiciendo relevar que a posição do Ministério da Ciência é concordante com o que vimos de alegar pelo que alegam no n.º 7 das suas alegações.

4 - Depois… no acto (apesar do seu carácter exaustivo e detalhado) nunca se falou ou tentou justificar o mesmo em razão desta circunstância, só podendo entender-se a argumentação como uma tentativa de justificação a posteriori (e como é sabido irrelevante) supostamente tendente a eliminar a ilicitude do acto.

5 – Seguidamente, porque é sabido (todos os alunos o sabem e mesmo quem elabora os exames) que quem escolhe a 2.ª fase já sabe o enunciado da 1.ª fase, mas esse conhecimento não constitui uma certeza relativamente ao tipo de exame que pode ser alterado ou mesmo dificultado no sentido de fazer alguma justiça e finalmente, se, de facto, o conhecimento do modelo de prova (modelo a que, no entendimento do recorrente, se reduz toda uma época de exames nacionais) constituísse uma vantagem tão sólida e óbvia, o que levou cerca de 20.000 alunos a precipitarem-se, livremente, no abismo da 1ª fase? 6 - Acresce que o documento junto como doc. nº 1 (em que se procede a uma suposta comparação das classificações do exame de Química dos alunos que realizaram só a 1ª fase com as dos alunos que realizaram só a 2ª fase que o recorrente Ministério da Educação leva a efeito, com o intuito de corroborar a suposta vantagem da recorrida em ter ido à 2.ª fase) se baseia apenas em meros e simplistas parâmetros descritivos como a média e a percentagem de notas inferiores a 95, sendo assim falacioso e, como tal, não permitindo tirar conclusões fidedignas.

7 - Na realidade e em rigor (e sendo indubitável que, no caso da recorrida, não estão em causa as classificações da ordem dos 95 pontos, mas as notas dos muito bons alunos que disputam as vagas do curso de Medicina), um aluno que, tendo a oportunidade de melhorar a classificação obtida no exame da 1ª fase, sem nada perder, opta por não o fazer, mostra claramente que essa classificação (quer seja elevada, média ou baixa) é suficiente para atingir os seus objectivos, não ambicionando, por isso, melhorar o seu desempenho, sendo que o mesmo não se pode dizer de um aluno que só realizou o exame da 2ª fase - … não foi por falta de ambição nem por se encontrar numa situação suficientemente confortável que fez tal opção, mas pela forma como, antecipada e irreversivelmente, organizou e planeou o seu estudo para a época de exames da 1ª e da 2ª fases.

8 - Se a referida comparação fosse pertinente para justificar possíveis posições vantajosas de uns ou de outros, poder-se-ia igualmente concluir, com base na percentagem de reprovações no conjunto dos alunos internos (1), que os alunos internos que realizaram só a primeira fase se encontravam numa posição mais vantajosa do que os que realizaram só a 2ª fase, uma vez que, segundo os dados fornecidos pelo recorrente Ministério da Educação no documento em apreço, a correspondente percentagem de reprovações foi inferior no primeiro grupo - 7% na 1.ª fase contra 10% na 2.ª fase.

9 - Mas, para além do que se vem de concluir, a verdade é que o caso da recorrida não é, de todo, comparável com os dos alunos “conformados” da 1ª fase, que optaram por não repetir o exame na 2ª fase: ao invés, a sua classificação final do 12.º ano (19 valores), bem como as suas classificações nos exames das restantes disciplinas e, em particular, da disciplina de Biologia, evidenciam um esforço e uma determinação inequívocos em cursar Medicina numa instituição de prestígio, como é o caso da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra - consequentemente, se a aluna recorrida tivesse planeado o seu calendário de exames de modo a realizar o exame de Química na 1ª fase e não tivesse obtido uma classificação confortável para atingir o seu objectivo (como se veio a verificar na 2.ª fase), ela aproveitaria, sem qualquer réstia de dúvida, essa segunda oportunidade para tentar melhorar a sua classificação.

10 - Assim, o seu caso nada tem a ver com o dos alunos que realizaram só o exame da 1.ª fase, nem tão pouco com o dos que repetiram o exame para obter aprovação à disciplina pelo contrário, o seu caso é apenas comparável com o dos alunos que, com classificações semelhantes às suas, souberam aproveitar a oportunidade de melhorar a sua nota nesta disciplina (cuja classificação, como se referiu já, influencia decisivamente o cálculo da nota de candidatura (1)) e, graças a essa melhoria, obter uma nota de candidatura suficientemente elevada para ingressar no curso em causa.

11 - Nesta senda...

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