Acórdão nº 01147/05.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução16 de Novembro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório J… – residente no Largo João Tomás da Costa, nº…, …º direito, Viana do Castelo – interpõe dois recursos jurisdicionais, sendo o primeiro do despacho que fixou o valor da presente providência cautelar – datado de 6 de Janeiro de 2006 – e o segundo do despacho que absolveu da instância a entidade requerida – Ministério do Ambiente do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional – e a contra-interessada – V..., SA – com fundamento na ilegitimidade do requerente – datada de 16 de Maio de 2006.

Conclui o primeiro recurso da forma seguinte: 1- A DUP em causa não cumpriu com o pressuposto de individualização dos bens sujeitos a expropriação, limitando-se a indicar duas “zonas” objecto de expropriação, às quais chamou “parcelas”, abarcando sob essa figura mais de uma centena de bens a expropriar; 2- Aquando da notificação ao requerente da intenção expropriativa, apenas lhe foi comunicada a intenção de expropriar a fracção de que é proprietário, e na qual reside com carácter de permanência, tendo-lhe sido proposto o valor de 141.783,98€ pela sua fracção; 3- O valor avançado pela contra-interessada para a acção é fantasioso, nasce ex nihilo, assentando não em dados concretos, passíveis de prova, mas em meras estimativas, sem suporte na realidade; 4- O despacho recorrido não cuida de que o requerente não vem aos autos defender apenas o seu direito de propriedade, mas aquele que é o seu direito fundamental à habitação; 5- A própria contra-interessada admite (artigo 186º da sua oposição) que “a vista de que desfruta, a envolvente urbana em que se insere, os laços de amizade e familiares e as condições do edifício em que se insere a sua fracção” são, em caso de expropriação, “os prejuízos por si sofridos”; 6- Ora, em se tratando, como se trata, da defesa de direitos e valores fundamentais, não fungíveis – mais, irreparáveis e inquantificáveis – não tem, nem pode ter, cabimento a aplicação dos critérios definidos no artigo 33º do CPTA, mas sim o critério supletivo consagrado no artigo 34º do mesmo diploma, o qual dispõe no seu nº2 que “quando o valor da causa seja indeterminável, considera-se superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo” (14.963,95€, que o requerente arredondou para 15.000,00€); 7- Aliás, os presentes autos não cuidam do processo expropriativo per se, que há-de correr termos no tribunal materialmente competente e onde, na pior das hipóteses (não provimento da acção principal a apensar) se fixará o real valor pecuniário da fracção do requerente e dos demais putativos expropriados; 8- O requerente não se pronunciou quanto ao valor adiantado pela contra-interessada por não lhe assistir momento processual para o fazer (artigo 118º nº3 do CPTA) e a isso não ter sido convidado pelo julgador a quo, no entanto, por aplicação do nº2 do artigo 314º do CPC (por remissão do artigo 118º nº3 do CPTA) o requerente não declarou aceitar o valor oferecido pela contra-interessada; 9- O despacho recorrido resulta assim de um manifesto erro na configuração dos interesses em jogo, uma vez que não está essencialmente em causa um “acto ablativo da propriedade”, mas sim a defesa de um “bem imaterial” que deriva da propriedade, pelo requerente, de uma fracção da parcela exproprianda, mas não se esgotando nela, caindo consequentemente no âmbito de aplicação do artigo 34º do CPTA; 10- Assim, deve ser revogado o despacho posto em crise, por violação dos artigos 314º nº2 do CPC e 34º do CPTA, e substituído por um outro que fixe o valor da acção em 15.000€ ou, se assim se não entender, em 14.963,95€.

Conclui o segundo recurso da seguinte forma: 1- O julgador a quo, notificou o requerente para, no prazo de cinco dias, “suprir ou justificar a falta da intervenção do seu cônjuge nos presentes autos, sob pena de poder vir a ser indeferida a presente providência cautelar por preterição de litisconsórcio necessário activo”; 2- Por se tratar de processo urgente, pouco compadecente com demoras e delongas, e embora entendesse que, in casu, não se verifica uma situação de litisconsórcio necessário activo, o requerente M… T… procedeu à junção aos autos de procuração forense outorgada pela sua esposa aos respectivos mandatários, com data de 20 de Outubro de 2005, data anterior à entrada do requerimento inicial em juízo, pelo que não carecia de ratificar o posteriormente processado; 3- Entende, porém, o julgador a quo que, com tal junção, não se pode considerar “que exista uma verdadeira aprovação expressa e clara quanto ao necessário consentimento do cônjuge”; 4- O artigo 1684º nº2 do CC prevê que “a forma do consentimento é a exigida para a procuração”, dando a entender dever ser a forma escrita; 5- A simples outorga da procuração e a junção aos autos da mesma, sempre tem que ser havida como consentimento, uma vez que da mesma nunca consta uma autorização expressa, concedida pelo outorgante ao mandatário, para que interponham aquela acção, naquele tribunal, com aquele pedido em concreto, daí que a própria procuração conforma um consentimento expresso; 6- Salvo melhor entendimento, perante a junção de uma procuração, e caso a considerasse sem valor declarativo quanto ao consentimento, impunha-se ao julgador a quo obter esclarecimentos quanto ao fim de tal procuração; 7- Nunca a recorrente esposa foi notificada para explicar o sentido da sua procuração (sentido que, com o devido respeito, entendem os recorrentes resultar claro da sua mera junção na sequência da notificação do julgador a quo para suprir a falta de intervenção da esposa do requerente) o que se impunha ao abrigo do disposto no artigo 25º do CPC; 8- Sem prescindir, porém, entende o recorrente que inexiste, in casu, qualquer obrigação de litisconsórcio activo; 9- A doutrina é unânime em atribuir ao artigo 28º-A do CPC o alcance teleológico de proteger um dos cônjuges quanto à actuação – ainda que em juízo – do outro, por via da qual possa ser posta em causa a propriedade sobre um bem comum ou o exercício de um direito que só por ambos possa ser exercido; 10- Antunes Varela entende que se aponta ”por conseguinte, no traçado da divisória legal, para um duplo elemento: a) para a natureza dos bens ou direitos a que a acção se refere; b) para a índole da acção, quanto ao risco (de perda, de ficar sem a coisa ou o direito) que a sua decisão envolve (eventum litis)” - in Manual, 2ª edição, páginas 174 e seguintes; 11- Daí que careça de ser intentada por ambos os cônjuges a acção judicial que tenha por objecto tais actos de disposição, o que é manifesto não ser o caso dos autos, em que o requerente marido pugna pela preservação da casa de morada de família, objecto de uma expropriação abusiva, ilícita, ilegal e fundada em acto nulo, anulável, inexistente e ineficaz; 12- Pelo que não se verifica o primeiro elemento identificado por Antunes Varela para que caiba, in casu, a aplicação do artigo 28º-A do CPC; 13- Quanto ao segundo elemento, poder-se-ia desde logo observar que se trata aqui de um procedimento cautelar que tem como objecto a suspensão de eficácia de um acto administrativo. É portanto, um processo urgente, onde se exige apenas uma prova sumária, ao de leve, dos factos, e que pretende evitar a constituição de uma situação de facto consumado e de produção de prejuízos irreparáveis para o requerente; 14- Por outro lado, a procedência da acção pode acarretar a preservação da casa de morada de família, mas a improcedência da acção nunca implicaria a sua perda, pois esta perda decorreria inevitavelmente da declaração da utilidade pública da expropriação, e expropriação da casa de morada de família; 15- Apenas a inacção de qualquer dos requerentes, poderia implicar a perda (rectius, a não preservação da casa de morada de família); 16- Sem prescindir, em caso algum se verificaria uma situação de litisconsórcio necessário activo pois está em causa nos autos um acto administrativo nulo; 17- E a nulidade é sempre do conhecimento oficioso do tribunal (artigo 286º do CC) e impõe-se erga omnes; 18- Sucede que, “em contencioso de anulação, a regra é a de que, para além da facultativa coligação de autores, não há litisconsórcio necessário activo, dada a eficácia erga omnes da decisão anulatória, desde que o acto impugnado seja indivisível” (AC STA de 29.03.1979, disponível em www.dgsi.pt, sublinhado nosso); 19- Ora, se não há litisconsórcio necessário activo na acção principal, por identidade de razões não o haverá também na providência cautelar que a antecede e a qual lhe será apensada; 20- E tanto assim é que, debruçando-se precisamente sobre um pedido de suspensão de eficácia, determinou o STA que “Não há litisconsórcio necessário activo entre os cônjuges” (AC STA de 20.12.1988, disponível em www.dgsi.pt, sublinhado nosso); 21- Assim procedeu o julgador a quo a uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 25º, 28º, 28º-A e 288º do CPC (ex vi artigo 1º do CPTA).

O Ministério do Ambiente do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional conclui assim as suas contra-alegações ao primeiro recurso jurisdicional: 1-...

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