Acórdão nº 00589/06.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução26 de Outubro de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO J…, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Coimbra, datada de 18/07/2006, que indeferiu liminarmente o pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias que o mesmo havia deduzido nos termos do art. 109.º do CPTA contra o “MINISTÉRIO DO AMBIENTE, ORDENAMENTO TERRITÓRIO E DESENVOLVIMENTO REGIONAL” e a “C…, S.A.”, igualmente identificados nos autos, e no qual peticionava que estes fossem “(…) condenados a absterem-se de levar à prática de testes e demais operações de co-incineração de resíduos industriais perigosos na unidade produtora de cimento de que é proprietária a ré C… em Souselas e ainda o pagamento de elevada sanção pecuniária compulsória, a fixar segundo prudente arbítrio (…) em caso de inobservância da sentença a proferir. (…).” Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 217 e segs. – paginação processo físico), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) I - A douta sentença recorrida parte do pressuposto errado de que a acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, constitui uma providência cautelar, quando na realidade aquela acção constitui um meio processual acessório , caracterizado como um processo urgente incluído no âmbito «Das intimações» (Capítulo II do Título IV).

II - O supra mencionado Acórdão do STA de 18.11.2004 não deixa margem para dúvidas quanto a esta matéria ao sustentar que «em causa não está a criação de um qualquer meio cautelar», no que concerne ao «meio processual de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias previsto nos artigos 109.° a 111.º do CPTA».

III – Os processos cautelares estão consagrados no Título V do CPTA, enquanto que as acções de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias estão previstas no Título IV do CPTA.

IV - Salvo o devido respeito, padece pois a douta sentença recorrida do vício do erro sobre os pressupostos de direito .

V – Padece também a douta sentença recorrida, salvo o devido respeito, do vício de violação da lei, porquanto viola a norma que integra o n.º 1 do art. 109.º do CPTA ao ter concluído que não estariam preenchidos os requisitos legais impostos para a interposição de uma acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, quando estão, no caso sub judice e atenta a matéria de facto e de direito alegada na petição inicial, preenchidos todos os pressupostos enunciados naquele preceito legal para a interposição de uma tal acção.

VI – Por um lado, porque se revela indispensável para a protecção dos direitos invocados pelo recorrente na petição inicial, pelas razões nesta invocadas e que ora se dão por reproduzidas, a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta negativa: abstenção da realização de testes e demais operações de co-incineração de resíduos industriais perigosos na cimenteira de Souselas, propriedade da ré C….

VII – Por outro lado, porque não é possível, nas circunstâncias do caso e pelas razões supra aduzidas, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131.º (…).” O ente público requerido, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 233 e segs. – paginação processo físico), concluindo no sentido de que deve manter-se o julgado.

A requerida particular, também aqui recorrida, apresentou igualmente contra-alegações (cfr. fls. 414 e segs. – paginação processo físico) nas quais conclui: “(…) 1. O ora Recorrente, para além de não ter a razão do seu lado, também não soube escolher, nem o meio processual próprio, nem os destinatários adequados; 2. A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias prevista no art. 109.º do CPTA assume-se inequivocamente como um meio processual residual, sendo que, na medida em que promover uma resolução urgente e definitiva do litígio, apenas pode ser usada se não for possível ou suficiente recorrer a meios de resolução do litígio não urgentes ainda que associados a providências cautelares; 3. Ora, como é bom de ver, este é um dos casos paradigmáticos em que, se houvesse motivos materiais para o fazer e não há, era possível e suficiente deduzir uma providência cautelar, sendo esta, pelo menos em abstracto, perfeitamente adequada para assegurar a protecção, em tempo útil, dos alegados direitos em causa; 4. Não se encontra, assim, minimamente preenchido o requisito da subsidiariedade da intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias face ao decretamento provisório de uma providência cautelar, tal como não se encontra preenchido o requisito da indispensabilidade da referida intimação para assegurar o exercício em tempo útil de um direito, liberdade ou garantia, razão pela qual a referida intimação, tal como o presente recurso, estão condenados a soçobrar; 5. A verdade é que era o Recorrente quem tinha de provar que a emissão de uma providência cautelar não era possível ou suficiente para obstar, ainda que provisoriamente, à emissão do Despacho e ao início dos testes, por ser necessário, em seu entender, que o Tribunal resolvesse com urgência a questão de modo definitivo e não apenas provisório; 6. Ora, foi tudo isso o que o ora Recorrente se absteve de fazer, aos pressupostos processuais dizendo nada; 7. Com efeito, não basta considerar óbvio que não é possível nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131.º, para que se exima o Recorrente da tarefa de explicar o que só para si aparece como sendo óbvio; 8. De facto, a única coisa óbvia que se retira das suas alegações é o desconhecimento absoluto da “revolução” que a reforma do Contencioso Administrativo operou no domínio das providências cautelares, continuando o Recorrente a crer que a única providência cautelar admissível continua a ser a suspensão de acto administrativo já emitido; 9. O STA já decidiu, de resto, uma intimação muito semelhante à agora pedida, tendo julgado que o meio processual escolhido não era próprio, antes considerando estar-se perante um pedido típico de providência cautelar; 10. Na medida em que o Recorrente reconhece expressamente que a factualidade em causa – meras declarações de um ministro à comunicação social – não permitia a apresentação de uma providência cautelar, terá necessariamente de reconhecer que também não permite, até por maioria de razão face à subsidiariedade do instituto, a apresentação de uma intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

  1. Bem andou assim, o Tribunal a quo quando considerou que as referidas declarações de um ministro eram insuficientes para consubstanciar uma lesão ou ameaça de lesão de quaisquer direitos, liberdades e garantias, não estando assim reunidas as condições mínimas para a proposição de uma intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, nem para a proposição de uma providência cautelar.

  2. Para além do meio processual utilizado ser manifestamente desadequado para a pretensão, também a Recorrida não deve ser considerada parte legítima na presente Intimação; 13. Com efeito, a Recorrida é uma entidade privada que não se encontra imbuída de quaisquer poderes públicos, sendo que nos termos do n.º 2 do art. 109.º do CPTA a intimação apenas pode ser dirigida contra particulares no caso de estes exercerem poderes públicos ou estarem integrados numa relação jurídico-administrativa, sendo que mesmo nesse caso torna-se necessário que estejam preenchidos os pressupostos previstos no n.º 3 do art. 37.º do CPTA, o que no caso manifestamente não acontece; 14. A verdade é que a Recorrida apenas iniciará os testes no caso de o Ministro do Ambiente aprovar o Despacho autorizativo solicitado pela Recorrente, sendo que, nesse contexto os meios processuais a que o Recorrente decida lançar mão se devem dirigir unicamente contra a autoridade competente pela emissão do referido Despacho e não contra a Requerida.

  3. Mesmo que o Requerente configurasse a possibilidade do Ministro do Ambiente emitir o despacho (o que entretanto já sucedeu) que viesse dispensar (como efectivamente dispensou) a Requerida de repetir a avaliação de impacto ambiental, como uma alegada ameaça de lesão de direitos, liberdades e garantias, sempre bastaria que os meios processuais destinados a impedir a emissão desse mesmo Despacho (ou a suspender os seus efeitos) fossem deduzidos apenas contra o Ministério do Ambiente, ou contra as demais entidades públicas competentes, já não a Requerida quem tem a responsabilidade de autorizar a prossecução do procedimento em causa.

  4. Refira-se, também, que, tendo o Despacho ministerial cuja prolação o Recorrente queria evitar já sido emitido e resumindo-se a Intimação para a Protecção de Direitos, Liberdades e Garantias à tentativa de evitar a emissão do referido Despacho, verifica-se que o objecto da referida Intimação se extinguiu, tornando-se impossível obter o desiderato pretendido pelo Requerente, razão pela qual deve ser declarada a inutilidade superveniente da presente Intimação, nos termos da alínea e) do art. 287.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi, art. 1.º do CPTA.

    (…).” O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts.146º e 147º ambos do CPTA veio emitir parecer onde sustenta o improvimento do recurso (cfr. fls. 512 e 513 – paginação processo físico).

    Exercido o contraditório sobre o referido parecer nos termos do art. 146.º, n.ºs 2 e 3 do CPTA o recorrente veio responder concluindo pela procedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 546 e segs...

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