Acórdão nº 00663/02 - Coimbra de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2006 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A Direcção da Caixa Geral de Aposentações, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Coimbra, à data juízo liquidatário, datada de 26 de Fevereiro de 2004, que com fundamento em vício de violação de lei julgou procedente o recurso contencioso de anulação que contra si havia sido intentado por L… L… A… e mulher A… L… C… A… e em que estes pediam a anulação do despacho daquela entidade datado de 4/6/2002 que indeferiu o pedido de atribuição de pensão de preço de sangue por falecimento de seu filho P… J… L… A… no decurso de exercícios físicos executados durante a recruta militar.
Alegou, tendo concluído pela seguinte forma: 1ª. O soldado P… sofria de coartação da aorta, uma malformação grave que conduz tipicamente à morte precoce por ruptura da aorta; 2ª. Apesar da doença poder permanecer assintomática, é facilmente detectável através da simples auscultação e medição da tensão arterial, podendo ser confirmada por exame radiológico; 3ª. É incompreensível que a condição clínica do P… tenha passado despercebida nos exames médicos que antecederam a incorporação nas fileiras: como atesta o perito cardiologista, havia por certo hipertensão, havia por certo afastamento anormal entre os valores máximos e mínimos da pressão arterial, havia por certo sopros de ejecção típicos; 4ª. Sem a correcção cirúrgica da aorta, o destino do P… estava traçado, pois era uma mera questão de tempo até que a pressão sanguínea elevada sobre o segmento debilitado da aorta provocasse a ruptura desta: o dia exacto da morte iria depender das contingências do estado da aorta e da pressão sanguínea; 5ª. Mais tarde ou mais cedo, o aumento da pressão sanguínea derivado de uma emoção, de uma refeição mais pesada, de uma breve corrida para o autocarro, de uns pontapés numa bola, iria ultrapassar finalmente a resistência cada vez mais ténue das paredes da aorta; 6ª. O juízo do perito cardiologista não podia ser mais claro e inequívoco na rejeição de uma relação de causalidade entre o exercício físico de instrução militar e a morte do P…; 7ª. Não existindo nexo de causalidade relevante entre a prestação do serviço militar e a morte do P…, o pedido de pensão de preço de sangue tinha de ser indeferido pela Caixa.
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É incompreensível o iter lógico que levou o Tribunal a afastar-se do parecer do perito médico e a querer à viva força subsumir o caso dos autos à teoria da causalidade adequada.
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Em primeiro lugar, não se descortina onde foi o Tribunal buscar a certeza de que o exercício físico tenha agido sequer como factor desencadeante da crise que vitimou o P…: se nem o perito sabe qual foi o facto desencadeante, como abertamente confessa, não se alcança a razão de ciência do Tribunal.
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Por outro lado, ainda que se pudesse ter apurado que o exercício físico determinou a elevação da pressão arterial e que esta esteve na causa da ruptura de uma parede aórtica anormalmente frágil, o exercício físico de instrução militar não constitui, em abstracto, causa de morte, do P… ou de qualquer outro mancebo; 11ª. A morte não sobreveio pelo exercício físico em si, abstractamente considerado, mas pelas circunstâncias concretas, anormais, que concorriam no P…, o que afasta um nexo juridicamente relevante, por aplicação da teoria da causalidade adequada invocada pelo Tribunal (em termos tecnicamente inadequados).
Não houve contra-alegações e o Ministério Público emitiu parecer no sentido do não provimento do...
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