Acórdão nº 00230/06.1BEBRG-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Setembro de 2006
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 04 de Setembro de 2006 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO “F…., S.A.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Braga, datada de 07/06/2006, que, no procedimento cautelar instaurado contra a mesma e a COMISSÃO MUNICIPAL DE C… DE V… pela “ASSOCIAÇÃO COMERCIAL E INDUSTRIAL DE V…”, ambas igualmente identificadas nos autos, decidiu julgar improcedente a suscitada excepção de ilegitimidade activa da requerente e decretou a suspensão de eficácia da deliberação daquela Comissão datada de 19/01/2006 que autorizou a instalação de um estabelecimento de comércio a retalho alimentar e misto promovido pela contra-interessada aqui ora recorrente no lugar do Poço Quente/Pia das Neves, São João das C… de V…., V….
Formula a recorrente, nas respectivas alegações (fls. 210 e segs.
), conclusões nos termos seguintes: “(…) 1. A Associação Comercial e Industrial de C… de V…, ao ter integrado o órgão colegial Comissão Municipal de C… de V…, de acordo com a alínea d) do n.º 4 do art. 7.º da Lei n.º 12/2004, de 30 de Março, renunciou voluntariamente ao regime de legitimidade processual previsto na alínea c) do n.º 1 do art. 55.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que, apenas em abstracto, lhe poderia ser aplicável, sujeitando-se, consequentemente, às limitações do art. 14.º, n.º 4, do Código do Procedimento Administrativo e da alínea e) do n.º 1 do mesmo art. 55.º daquele Código.
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Por força dos referidos artigos 14.º, n.º 4, do CPA, e 55.º, n.º 1, alínea e), do CPTA, os membros dos órgãos colegiais, a não ser o respectivo presidente, não podem impugnar as deliberações por si proferidas, razão pela qual, concretizando, não podia a referida Associação Comercial e Industrial de V… impugnar a deliberação de 19 de Janeiro de 2006, da Comissão Municipal de C… de V…, de que faz parte.
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Ainda que se entenda que aquela Associação podia fazer valer em juízo, contra decisão de órgão colegial do qual faz parte, os interesses dos seus associados e que, nessa medida, não lhe estaria vedada essa defesa mas tão só a defesa da legalidade a se, nenhum dos fundamentos que sustentaram a aplicação da providência se acolhem no âmbito daquela defesa dos interesses dos ditos associados mas sim no puro plano da legalidade administrativa, o que a torna parte ilegítima para esse efeito.
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À luz do art. 14.º, n.º 4, do CPA e do art. 55.º, n.º 1, alínea e), do CPTA, que constitui norma especial relativamente à alínea c) do mesmo preceito, deveria ter sido declarada a ilegitimidade activa da Associação Comercial e Industrial de V.. e, em consequência, ser a recorrente absolvida da instância cautelar, nos termos dos artigos 288.º, n.º 1, alínea d), 493.º, n.º 2, e 494.º, alínea e), do Código de Processo Civil, razão pela qual decidiu mal o Tribunal a quo.
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Assim foi decidido, sem margem para dúvidas, em casos idênticos aos dos autos, pelos Doutos Acórdãos desse V.º Tribunal, de 27-04-2006, processo 1088/05.3BRBRG, e de 04-05-2006, no processo 842/05.0BRBRG.
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Para além disso, não se verificam os pressupostos de que depende a aplicação do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, uma vez que o mesmo reclama a manifesta, notória, patente, flagrante procedência da acção principal, o que, no caso concreto, não se verifica (cfr., inter alia, Acórdão desse V.º Tribunal de 07-12-2005, processo 1502/04.5BEPRT).
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Na verdade, nem o parecer da Direcção-Geral da Empresa padece de vício que o afecta na sua plena validade, já que a indicação concreta do local do empreendimento é ou parece ser irrelevante em sede da matéria sobre o qual deve incidir (e que é a constante das alíneas c), d) e e) do n.º 2 do art. 9.º da Lei 12/2004), nem ocorre falta de fundamentação quanto à aprovação prévia de localização e à pontuação do projecto, no primeiro caso por ser manifestamente um acto de concessão de um direito e não um acto que o negue, restrinja ou limite (e não estar por isso abrangido pelo art. 124.º do CPA) e no segundo caso, porque, para além de consubstanciar um acto de concessão de um direito (a autorização para a instalação do estabelecimento), estar aparentemente fundamentado (ainda que adoptando os critérios vertidos na Lei).
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Em qualquer dos casos, ainda que existissem dúvidas sobre os vícios apontados, estes não são de tal modo graves, intensos, que justifiquem o decretamento da providência requerida.
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Não se verificando os requisitos de aplicação da alínea a) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, errou o Tribunal a quo ao ter decretado a providência cautelar.
(…).” Termina no sentido de que deve “(…) o presente recurso jurisdicional ser admitido e julgado procedente, por provado, e, em consequência, a decisão, que foi proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, depois de revogada, ser substituída por Acórdão que… i) Absolva a ora recorrente da instância cautelar que aqui está em causa, por ilegitimidade activa da Associação Comercial e Industrial de V…; ii) Ou, subsidiariamente, indefira a providência cautelar requerida pela mesma Associação, por não se verificarem os requisitos previstos no artigo 120.º, n.º 1, alíneas a) do CPTA … (…).” A requerente, aqui recorrida, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 288 e segs.
), nas quais conclui e pugna, em suma, pela improcedência do recurso jurisdicional e manutenção do julgado.
O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA não veio a emitir qualquer pronúncia (cfr. fls. 313 e segs.
).
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 7ª edição, págs. 435 e segs.; Prof. M. Aroso de Almeida e Dr. C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 737, nota 1).
As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão recorrida ao julgar improcedente a excepção de ilegitimidade activa e que deferiu cautelarmente o pedido de suspensão de eficácia do acto administrativo em crise fez ou não errada aplicação do disposto nos arts. 14.º, n.º 4 do CPA, 55.º, n.º 1, al. e) do CPTA, 288.º, n.º 1, al. d), 493.º, n.º 2, 494.º, al. e) do CPC, e 120.º, n.º 1, al. a) do CPTA [cfr. conclusões supra reproduzidas].
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FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Resulta fixada na decisão judicial recorrida a seguinte factualidade: I) Em 29.04.05, a F… apresentou, na Direcção Regional da Economia do Norte (DREN), um projecto para licenciamento comercial de um estabelecimento de comércio a retalho alimentar/misto, a implementar na Rua das Teixogueiras, São Miguel das C… de V…, V… (projecto), e um pedido de aprovação dessa localização - fls. 1 e segs. do processo administrativo (PA); II) Por comunicação datada de 16.05.05, a F… apresentou à DREN nova planta de implantação para a unidade em questão, agora para o lugar do Poço Quente, Pia das Neves, São João das C… de V…, V… - fls. 336 do PA; III) O parecer exarado pela Direcção-Geral da Empresa (DGE) sobre tal projecto refere-se à localização referida em 1 - doc. 8 junto à acção principal pela aqui requerente; IV) No relatório final e na conclusão da DREN vem indicado, como local para a dita instalação, o lugar do Poço Quente, Pia das Neves, São João das C… de V…, V… - doc. 9 junto à acção principal pela aqui requerente; V) A Câmara Municipal de V… aprovou a localização em apreço para o dito lugar do Poço Quente - doc. 10 junto à acção principal pela aqui requerente; VI) A Comissão deliberou autorizar a instalação do estabelecimento para o dito lugar do Poço, dando-se a deliberação aqui por reproduzida para todos os efeitos - fls. 393 e 394 do PA; VII) O projecto refere-se à construção de um estabelecimento comercial com as áreas: de venda da F…, de 1 500 m2; de lojas, de 81 m2, e de circulação, de 286,5 m2, no total de 1 867,5 m2 - fls. 118 do PA; VIII) No procedimento de autorização em questão, não foram ouvidas nem a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional nem o Instituto de Estradas de Portugal - acordo das partes; IX) Na zona onde a F… pretende instalar o seu estabelecimento não existe plano urbanístico de pormenor, nem a F… apresentou um projecto prévio de loteamento - acordo das partes; X) A DGE, no cálculo da pontuação expressa no seu parecer, que aqui se dá por reproduzido, tomou em consideração a área de 4 578 m2 como área de venda existente na área de influência em questão - fls. 381 e segs, maxime 383, do PA.
XI) Não se demonstrou, por falta de prova documental do facto (sendo nosso entendimento que apenas desse modo ele poderia ser comprovado, ut art. 393.º 2 do CC), que a base de dados da DGE estivesse desactualizada (art. 85º da petição inicial) – a demonstração resultaria da prova documental da existência de outras lojas e da área respectiva (factos necessariamente constantes de documentos), para além das consideradas no parecer.
Resulta ainda relevante a seguinte factualidade para a apreciação das questões suscitadas: XII) A requerente, aqui ora...
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