Acórdão nº 07027/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução17 de Março de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO B GMBH & COo KG (doravante B……….), com os sinais dos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa um processo cautelar contra · INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da Saúde, IP, · MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA INOVAÇÃO (MEI) e a · Contra-interessada T…………. BV (T………), Pedindo 1. A suspensão da eficácia dos actos de atribuição dos números de registo nacionais pelo INFARMED à Contra-Interessada para os medicamentos a seguir indicados, enquanto a Patente EP ……….4 e o CCP 41 estiverem em vigor: Telmisartan Teva 20 mg Comprimido; Telmisartan Teva 40 mg Comprimido; Telmisartan Teva 80 mg Comprimido, sob as designações acima indicadas ou quaisquer que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro: e 2. A intimação da DGAE, na pessoa do Requerido MEl, enquanto a Patente EP ………. e o CCP 41 estiverem em vigor, para não fixarem os PVP requeridos pela CI, a suspender o respectivo procedimento administrativo ou a abster-se de fixar tais preços sem que essa fixação fique condicionada a apenas entrar em vigor na data em que a Patente EP 502314 e o CCP 41 caducarem, relativamente aos medicamentos acima indicados, sob as designações acima indicadas ou quaisquer que venham a ser as designações destes medicamentos no futuro.

Após os articulados, por despacho daquele tribunal foi decidido julgar improcedentes o processo cautelar e também aquilo a que chamou de “pedido de declaração de ineficácia de resolução fundamentada”.

Inconformada, vem M………. F………. C………. recorrer para este T.C.A.-Sul, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1.

Nos termos do artigo 128.0 do CPTA, independentemente da existência, ou não, de actos de execução cuja declaração de ineficácia possa ser requerida, pode o Tribunal escrutinar os fundamentos da Resolução em causa.

  1. Para que a Resolução fosse procedentemente fundamentada, impunha-se, assim, que, em concreto, ela identificasse os danos decorrentes da não execução dos actos em causa nesta acção durante o tempo provável de duração da providência, procedesse a uma criteriosa avaliação da sua importância e gravidade e, finalmente, os comparasse com aqueles que essa execução iria provocar, tendo em conta os direitos e interesses legitimas de terceiros, no quadro dos princípios da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos e da proporcionalidade, estabelecidos nos arts e do Código do Procedimento Administrativo.

  2. Resta pois concluir que a decisão recorrida viola o artigo 128. ° do CPTA, porquanto o aplicou erradamente aos presentes autos. E assim se concluindo, revogar-se-á a decisão recorrida e deverá ser emitida decisão Julgando improcedentes as razões em que a Resolução Fundamentada se fundamenta.

  3. O facto alegado pela Recorrente no requerimento inicial que o Telmisartan contido nos medicamentos Telmisartan Teva é preparado pelo processo reivindicado na EP 502 314 não foi impugnado pelos requeridos INFARMED e MEl nem pela Contra Interessada.

  4. Nesses termos deverá ser considerado como facto assente nos termos do artigo 490.° n.? 2 do Código do Processo Civil, o seguinte facto: "O Telmisartan usado nos genéricos Telmisartan Teva é produzido pelo processo patenteado na EP 5023]4.

  5. E para o caso, inverosímil, deste Tribuna] não considerar tal facto como provado deve ser considerado como facto a provar o seguinte: "à data do pedido de patente EP 502314 e da prioridade reivindicada nessa patente, o Telmisartan nunca tinha sido sintetizado ou divulgado, nem tinha sido divulgada a aplicação do processo que é mencionado na patente para obter esse produto.

  6. Na verdade, sendo esse facto provado, estabelece-se que o objecto da Patente é um processo de fabrico de um produto novo - Telmisartan - e nos termos do artigo 10.° do CPI 40 e artigo 98.° do CPI em vigor, terá como consequência a inversão do ónus da prova para o Requerido e Contra Interessada que o processo utilizado no seu produto não viola a Patente e o CCP.

  7. Nem os Requeridos nem a Contra-Interessada alegaram qualquer materialidade donde pudesse decorrer a não violação das reivindicações da Patente pelos produtos dos autos e, consequentemente, essa prova já não será possível neste processo.

  8. O acto de atribuição do número de registo trata-se, na verdade, e de acordo com o disposto no artigo 54.° n. 2 do Estatuto do Medicamento, conjugado com o artigo 4.°, n." I da Deliberação n? I 47/CD/2008 do INFARMED, ambas citadas pela Recorrente no seu requerimento inicial e pela douta sentença em recurso, de um acto pelo qual o INFARMED concede a um titular de uma AIM a permissão para que o mesmo comercialize em Portugal o medicamento objecto dessa AIM.

  9. Ocorre a possibilidade de as autoridades dos estados-membros proibirem a comercialização, nos seus territórios, de medicamentos objecto de AIMs concedidas pela Comissão Europeia constitui um dos elementos do pano de fundo do Regulamento (CE) 726/2004, o qual prevê no seu considerando 13) que "os Estados-Membros devem, excepcionalmente, poder proibir a utilização no seu território de medicamentos para uso humano que violem conceitos objectivamente definidos de ordem pública ou moral pública".

  10. Neste quadro, impunha-se ao INFARMED que, no caso destes autos, sobrestasse na atribuição do registo, porque lhe estava vedado por um princípio de ordem pública nacional e comunitário claramente estabelecido viabilizar a violação dos direitos de propriedade industrial da Requerente.

  11. Da mesma forma, os PVP a aprovar pela DGAE relativamente aos genéricos Te1misartan Teva consubstanciariam um acto permissivo da violação de tais direitos.

  12. Nestes termos, o pedido formulado na acção principal é manifestamente fundamentado, encontrando-se, pois, preenchido o requisito do fumus boni júris.

  13. O fumus bonus juris existe, nos presentes autos, no seu mais elevado grau, tendo o tribunal a quo decidido em sentido contrário apenas porque fez erradas assumpções e não identificou correctamente a questão jurídica aqui em discussão.

  14. A questão jurídica que aqui se coloca, é a de saber se, um acto administrativo que permite a comercialização de um produto que irá violar uma patente válida e em vigor, é inválido porque ilegal e, por isso, deve ser invalidado pelo tribunal, se for concedido pelo INFARMED - e não, contrariamente ao afirmado pela decisão recorrida, a de saber se o INFARMED seria capaz de facilmente determinar se os medicamentos em causa violam a Patente e o CCP no âmbito de um procedimento de concessão de AIM.

  15. Se o tribunal a quo tivesse correctamente identificado a questão jurídica em discussão, teria concluído que os actos de atribuição do número de registo nacional deveriam ser declarados nulos ou anuláveis nos termos dos art." 135.0 e 133.° n." 2 alínea c) e d) do Código de Procedimento Administrativo, e o MEI/DGAE intimado a não aprovar os PVPs, uma vez que levantam barreiras administrativas à exploração pela Contra Interessada de um produto protegido pela Patente e pelo CCP, tendo como consequência a violação das normas constitucionais (artigos 62.0 e 266.°) de protecção de direitos fundamentais, aqui violados, e o seu objectivo será permitir uma conduta criminal por terceiros.

  16. A Patente confere ao seu titular o direito exclusivo de explorar a invenção em qualquer parte do território português, que se traduz na proibição legal de qualquer terceiro, sem o consentimento do seu titular, explorar o invento patenteado, por qualquer das formas definidas no artigo 101.° n." 2.° do CPI, durante o seu período de vigência (artigo 101.0 e 32.0 n.? 4).

  17. O direito de exclusivo emergente da titularidade de uma patente e do CCP goza "das garantias estabelecidas para a propriedade em geral", nos expressos termos do art.1316.° do Código da Propriedade Industrial.

  18. Tal como o direito de propriedade privada em geral - e contrariamente ao que foi decidido na decisão recorrida - é-lhe atribuída específica protecção constitucional, como direito fundamental tendo a natureza de "direitos, liberdades e garantias", beneficiando, assim, do regime constitucional que a estes é aplicável, conforme resulta do art." 17.° da Constituição.

  19. E a natureza de direito fundamental, análogo aos direitos, liberdades e garantias isto tem sido pacificamente aceite pela doutrina e sistematicamente pela jurisprudência.

  20. O principal objectivo da providência cautelar é assegurar o efeito útil da decisão na acção principal, nos termos do disposto no n.? I do artigo 120.° do CPTA, O risco primordial a ser evitado no quadro das providências cautelares é, exactamente, o do facto consumado, isto é o da decisão na acção principal se tornar absolutamente inútil.

  21. Apenas se esse risco não existir os danos de difícil reparação deverão ser considerados.

  22. Com a prolação do acto suspendendo e do acto que se pretende evitar é evidente a iminente comercialização dos Genéricos Telmisartan Teva que resulta numa situação de facto consumado e retirará toda a utilidade à acção principal, tornado imperativa e urgente a concessão das medidas cautelares aqui requeridas adequadas a assegurar o efeito útil da decisão na acção principal.

  23. Mesmo que se não considerasse tal situação como a de facto consumado, a verdade é que a não concessão desta providência iria implicar a produção de prejuízos de difícil ou mesmo impossível reparação para os interesses que a Recorrente visa assegurar na acção principal.

  24. A comercialização do Telmisartan Teva causará à Recorrente a privação, contra a sua vontade, do gozo do direito ao exclusivo de exploração da invenção que a Patente lhe confere, que constitui o cerne do direito de propriedade industrial ao qual tem direito, uma situação que é, em todos os aspectos, equivalente à privação, com violência, da posse de um bem pertencente à Recorrente.

  25. É uma ofensa ao direito de propriedade industrial da ora Recorrente causadora de um dano...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT