Acórdão nº 01798/10.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução13 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “F…, LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 09.09.2010, que indeferiu a providência cautelar que a mesma havia deduzido contra “MUNICÍPIO DO PORTO”, igualmente identificado nos autos, na qual peticionava a decretação da providência de suspensão de eficácia do despacho que determinou a posse administrativa com vista à demolição da chaminé de exaustão sita em prédio na Rua…, Porto.

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 129 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Não se encontram enunciadas no texto da douta sentença recorrida todas as razões e fundamentos da decisão proferida, o que determina a sua nulidade por violação do disposto no artigo 668.º n.º 1 al. b) do CPC.

  2. A opção do Meritíssimo Juiz a quo pela dispensa da produção de prova testemunhal arrolada pela ora recorrente contribuiu directa e necessariamente para que a sentença padecesse do vício de insuficiência de matéria de facto.

  3. O facto dado como provado no elenco dos factos apurados sob a letra L não poderia ter sido considerado assente, sem pelo menos terem sido ouvidas as testemunhas arroladas.

  4. O documento reproduzido naquela alínea L dos factos apurados foi junto pelo Município ora recorrido em sede de contestação, mas a ora recorrente impugnou-o tempestivamente, tendo o seu requerimento em que apresentou tal impugnação sido expressamente admitido pelo douto despacho de fls.… 5.º Logo, estava vedado ao Julgador considerá-lo provado, sem mais, isto é, sem sobre o mesmo serem produzidos todos os meios de prova apresentados pelas partes.

  5. De resto, o facto de ter sido construída ou alterada a chaminé, sem a necessária licença, foi sempre negado enérgica e veementemente pela requerente e ora recorrente, como decorre dos vários documentos juntos, quer com a p.i., quer constantes do respectivo processo administrativo igualmente junto aos autos.

  6. Este Tribunal superior tem, assim, o poder de, oficiosamente, anular a sentença recorrida e mandar repetir o julgamento para apurar, com recurso à produção de prova testemunhal, da veracidade daquele facto - cfr. art. 712.º n.º 4 do CPC. Veja-se no mesmo sentido Ac. deste Tribunal de 15-01-2009 tirado no proc. 01384/08.8BEBRG - 2.ª Secção lido na página da Internet.

  7. A recorrente nunca foi notificada da decisão final proferida no processo administrativo pelo Município recorrido no âmbito do processo n.º 894/08.CMP, tendo apenas sido notificada de uma mera intenção deste em proferir determinada decisão, em clara violação do disposto no art. 106.º do CPA, o que, ao contrário do doutamente decidido na 1.ª instância, não pode deixar de ser relevante para efeitos de se dever considerar o acto suspendendo impugnável.

  8. Ao julgar inverificado o requisito constante da segunda parte da al. b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA o Meritíssimo Juiz a quo fez uma errada aplicação do direito aos factos assentes.

  9. A pretensão da recorrente de ver anulado o despacho suspendendo no respectivo processo principal, entretanto pendente, tem toda a aparência de bom direito, atenta a gritante injustiça que decorreria da impossibilidade meramente administrativa de a chaminé em causa não poder ser legalizada.

  10. Ao contrário do que o mesmo Julgador escreveu na decisão, foram alegados pela recorrente outros factos para além do supra referido atinente à alteração/construção da chaminé, como seja a circunstância de no processo administrativo n.º 16874/09CMP não dever ser exigida a autorização de 2/3 dos Condóminos do prédio - vide artigos 58.º e seguintes do requerimento inicial.

  11. A requerente pretende tão-somente que o Município recorrido lhe aprove o projecto de alteração da conduta de extracção de fumos, vulgo chaminé, por forma a que a mesma se eleve 0,50m acima do telhado de cobertura, como assim deveria ter sido construída de raiz, inexigindo-se-lhe para o efeito a anuência dos condóminos.

  12. Em face do igualmente alegado e demonstrado nos autos, a recorrente tentou obter a autorização daqueles condóminos, mas viu-se confrontada com a sua recusa em sequer abordar o assunto em assembleia de condomínio, pelo que ficou manietada, em face da exigência do Município recorrido, na tentativa que encetou de boa-fé de legalizar uma obra que nasceu ilegal, mas a que é absolutamente alheia, não o sendo do mesmo modo aquela entidade licenciadora ...

”.

Conclui no sentido ou da nulidade da decisão com remessa dos autos ao TAF do Porto para produção de prova ou, se assim não for entendido, da revogação da decisão e deferimento da pretensão cautelar pela mesma deduzida.

O ente requerido, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 147 e segs.

) nas quais terminam concluindo nos seguintes termos: “… Deve ser integralmente confirmada a modelar sentença de 1.ª instância que não enferma de qualquer dos vícios apontados …”.

O Mm.º Juiz “a quo” em sede de pronúncia quanto à arguição de nulidade veio determinar a rectificação do lapso de escrita nela inserto nos termos e pelos fundamentos constantes de fls. 176, decisão que não mereceu qualquer reparo ou impugnação.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer/pronúncia no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls. 185/186), parecer esse que objecto de contraditório não mereceu qualquer resposta (cfr. fls. 187 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que se, pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) (na redacção introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24/08 - cfr. arts. 11.º e 12.º daquele DL -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

    As questões suscitadas e de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão judicial ao julgar improcedente a pretensão cautelar formulada o fez enfermando de nulidade [art. 668.º, n.º 1, al. b) do CPC], de erro no julgamento de facto [ausência de inquirição das testemunhas quanto se estaria em presença de factualidade controvertida] e de erro de julgamento de direito por infracção ao disposto no art. 120.º, n.º 1, al. b) do CPTA (requisito do “fumus boni iuris”) [cfr. respectivas alegações e conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: I) A requerente é dona e legítima proprietária do estabelecimento de restauração instalado na fracção autónoma designada pela letra “A”, sita no rés-do-chão do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal localizado no n.º … da Rua … [al. A) MFA].

    II) Para o referido estabelecimento comercial foi emitido o alvará sanitário para actividade de restauração e bebidas, com o n.º 7724, o qual foi averbado em nome da requerente em 31.03.1981 e em nome do actual explorador no dia 26.04.2007 - cfr. doc. 1 junto com o r.i. - [al. B) MFA].

    III) O contra-interessado M…, através de requerimento datado de 04.01.2008, dirigido ao Presidente da Câmara do Porto, requereu a realização de vistoria tendo requerido “… a inspecção da extracção de gorduras provenientes das cozinhas do restaurante «O G…» (…) uma vez que o sistema de extracção foi instalado em minha ausência (…) estando colocado em cima do meu terraço onde se difunde as gorduras e os fumos proveniente desse sistema de extracção, sendo impossível a abertura das janelas do lado do terraço e usufruir do terraço devido ao cheiro emitido por esse sistema …” - cfr. fls. 01 do PA que se dá por reproduzida - [al. C) MFA].

    IV) Foi elaborada inf.ª, em 08.02.2008, no qual após ter sido referida a “… construção de uma conduta de extracção de fumos sem a necessária licença administrativa e que não cumpre o estipulado no artigo 113.º do RGEU …” foi proposta a notificação da requerente para se pronunciar sobre a intenção de realização de trabalhos de correcção da obra - cfr. fls. 03 e 04 do PA que se dão por reproduzidas - [al. D) MFA].

    1. A requerente foi notificada para se pronunciar sobre a referida intenção de ordenar os aludidos trabalhos de correcção da obra, tendo, através de requerimento datado de 13.03.2008, requerido prazo de 120 dias tendo em vista a legalização da obra - cfr. fls. 05 e 09 do PA - [al. E) MFA].

      VI) Por despacho do Chefe de Divisão Municipal de Fiscalização de Obras Particulares, datado de 19.03.2008 foi concedido prazo de 60 dias para apresentação de pedido de licenciamento - cfr. fls. 11 do PA - [al. F) MFA].

      VII) Através de requerimento datado de 01.07.2008, dirigido ao Presidente da Câmara Municipal do Porto, requereu “… a anulação do respectivo processo contra ordenacional, bem como a dispensa da realização de obras de correcção …” - cfr. fls. 14/15 do PA - [al. G) MFA].

      VIII) No dia 25.07.2008 foi elaborada a inf.ª n.º I/109966/08/CMO na foi proposto que “… o Vereador do Pelouro do Urbanismo ordene a realização dos trabalhos de correcção/alteração das obras ilegais descritas no...

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