Acórdão nº 01752/08.5BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução13 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I - RELATÓRIO 1.

O MINISTÉRIO da ADMINISTRAÇÃO INTERNA, inconformado, veio interpor o presente recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Braga, datado de 09 de Dezembro de 2009, que, julgando procedente a acção administrativa especial, instaurada pelo recorrido J…, cabo de infantaria da GNR, declarou nulo o despacho do Comandante da Brigada de Trânsito da GNR, de 1/3/1999, que lhe aplicou a pena disciplinar de oito dias de detenção. *** O recorrente formulou alegações que terminou com as seguintes conclusões: "a) Na Acção Principal, foi levada à lide pelas Partes (tanto Autor, como Autoridade Demandada), variadas decisões jurisprudenciais, algumas delas do Tribunal Constitucional; b) Esses textos, em muitas das suas componentes concretas (nomeadamente, o tipo de forças de segurança envolvidas e o tipologia das penas aplicadas) determinaram soluções jurídicas diversas e, por esse motivo, não poderão ser equiparadas e ser agrupadas unitariamente; c) O Acórdão “a quo”, acolhendo esse acervo jurisprudencial, não emitiu qualquer pronúncia conclusiva, nem especificou qual, ou quais, desses textos jurisprudências fundamentou o seu juízo, sendo, por isso, ininteligível e, em consequência disso, padece de nulidade; d) Por outro lado, este Acórdão violou claramente a Lei e a interpretação sindicada pelo Tribunal Constitucional (Acórdão 521/2003), ao ter concluído que os Militares da G.N.R., para efeitos do disposto no artigo 27.º, n.º 3, alínea c), da C.R.P., não podem ser incluídos no conceito de Militar; e) De igual forma violou a Lei (bem como a posição sustentada pelo Tribunal Constitucional) quando, nesta sequência, afirmou e concluiu que esses militares da G.N.R. não se encontram aquartelados; f) Por fim, e concluído, ao ter decidido desta forma o Acórdão “a quo” é carecido de qualquer sustentáculo legal, na medida em que, ao ter usado aqueles fundamentos, declarou nulo o despacho de 01 de Março de 1999, que aplicou a pena disciplinar de oito dias detenção ao Recorrido, fundamentado nos termos do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 133.º do Código do Procedimento Administrativo); g) Por tudo isso, não pode o despacho de 01 de Março de 1999 ser declarado inválido, uma vez ele foi praticado ao abrigo da legislação vigente; a qual se encontra imaculada de juízo de censura constitucional".

*** Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, o recorrido apresentou contra alegações, que concluiu do seguinte modo: 1 - De acordo com os artigos 270º n.º 4, do artigo 46º e da alínea o) do artigo 164º da CRP, há uma nítida diferença entre militares, agentes militarizados e forças de segurança.

2 - A al. d) do número 3 do artigo 27º da CRP permite a aplicação de penas privativas da liberdade unicamente a militares, não ficando abrangidos neste normativo os agentes militarizados da GNR e das Forças de Segurança.

3 - Fazendo a CRP esta distinção, não pode qualquer lei infraconstitucional, mandar aplicar uma lei que contrarie esta diferenciação, revelando-se, desde logo, inconstitucional o número 5º do DL 265/93 de 31 de Julho (EMGNR) e do artigo 91º/1 do DL 231/93 de 26 de Junho (LOGNR) na medida em que mandam aplicar à GNR medidas privativas da liberdade.

4 - A jurisprudência vai no sentido de considerar orgânica e materialmente inconstitucionais as normas que mandam aplicar aos agentes militarizados as penas privativas da liberdade previstas nas alíneas c) ou d) (conforme as versões) do número 3 do artigo 27.º da CRP.

5 - Os Acórdãos 725/95, 119/96 e 500/98 do TC analisam apenas a inconstitucionalidade orgânica, não se tendo pronunciado quanto à inconstitucionalidade material por desnecessidade, em face da declaração prévia da inconstitucionalidade orgânica das normas em apreciação.

6 - Os Acórdãos do TC 103/87 e 308/90 decidiram a inconstitucionalidade material das normas que mandavam aplicar penas privativas da liberdade a agentes militarizados com base na alínea c), mais tarde alínea d), do número 3 do artigo 27.º da CRP.

7 - Além destes, há um número considerável de Acórdãos do STA (na P. I. elencam-se 8) referentes a agentes militarizados da GNR e da GF, que igualmente decidiram a inconstitucionalidade de normas do género das citadas.

8 - Há igualmente dois Acórdãos do TCA Sul, Procºs 2405/99, de 04.07.2002 e 1158/99, de 27.02.2003; e um do TAF de Sintra, 1234/04.4BESNT de 13.03.2007, que tomaram idênticas decisões.

9 - Os Acórdãos citados no número anterior bem como o Ac. do STA 38 915, de 22.05.1997 dizem respeito, todos eles, a Soldados da GNR, o que contraria o que diz a entidade recorrente de que não se conhecem sobre a matéria em apreço decisões dos Tribunais, aplicadas a agentes militarizados da GNR que tenham julgado inconstitucionais as normas referidas.

10 - Os despachos do MAI sobre esta problemática (e são muitos), têm sido até há bem pouco tempo, coincidentes com a jurisprudência dominante de que os agentes militarizados, não sendo militares no estrito sentido da palavra, não estão incluídos na excepção constante da alínea c) ou d) conforme as versões, do número 3 do artigo 27.º da CRP, sendo por isso inconstitucionais as normas que se lhe oponham.

11 - O Acórdão 521/03 do TC, ao tomar uma posição diferente da jurisprudência habitual, constitui o único Acórdão divergente da jurisprudência dominante e consolidada relativamente a esta matéria.

12 - Mas que, por não ter força obrigatória geral, não pode vincular os restantes tribunais.

13 - De qualquer modo, a entidade recorrente não deveria apoiar-se no Ac. do TC 521/03, pois que, ao defender que a pena de detenção é diferente das penas de prisão disciplinar e de prisão disciplinar agravada, e tratando o referido Acórdão duma pena de prisão disciplinar agravada, não deveria a decisão deste Acórdão aplicar-se ao caso “sub judice”, que tem como objecto uma pena de detenção.

14 - Mas mesmo que se admitisse que a pena de detenção não se enquadra na al. d) do número 3 do art.º 27º da CRP, sempre se deveria admitir que tal pena constitui ofensa aos números 1 e 2 do referido artigo, a que corresponde uma inconstitucionalidade material.

15 - É o próprio MAI que reconhece, em nota (4) de rodapé da penúltima folha do último despacho citado, que, emanada do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo, “é hoje aceite na jurisprudência de forma pacífica e consolidada, de que são materialmente inconstitucionais as normas do artigo 92ª, nº 1 da Lei Orgânica da GNR (…) e do artigo 5º do Estatuto Militar da GNR…”.

16 - E é também o próprio MAI que em nota de rodapé (1) a fls.3 do mesmo despacho, e para justificar que o entendimento de que as normas a que nos temos vindo a referir, “é hoje pacífico na jurisprudência administrativa”, cita como exemplo de tal jurisprudência os “Ac. TCA, de 04.07.2002 – Rec. 2405/99; Acs. STA, de 19.05.1997, - Rec. 32373; de 10.11.1994, Rec. 30993; e de 22.05.97 – Rec. 38915, entre outros”.

17 – É ainda o MAI que no Parecer da Auditoria Jurídica nº 235-R/07 de 26.04.07 refere não achar oportuno qualquer recurso jurisdicional em face dum Acórdão do TAF de Sintra que tinha declarado a nulidade dos actos punitivos que tinham aplicado a um soldado da GNR penas privativas da liberdade, dizendo expressamente:”São materialmente inconstitucionais as normas do art. 92/1 da Lei Orgânica da GNR, aprovada pelo DL 231/93 de 26.06 na parte em que tornam aplicáveis aos militares da Guarda, não pertencentes aos quadros das Forças Armadas as penas de prisão disciplinar e de prisão disciplinar agravada previstas no Regulamento de Disciplina Militar”.

18 - A doutrina é toda ela unânime, como mais em pormenor se referiu nos números de 34 a 37 das ALEGAÇÕES, em reconhecer que as penas administrativas privativas da liberdade constantes do n.º 3 do artigo 27.º da CRP apenas se aplicam aos militares das Forças Armadas e não aos agentes militarizados como é o caso da GNR, apontando-se como exemplo disso os juristas: Jorge Miranda, Gomes Canotilho , Vital Moreira, Vieira de Andrade, António Vitorino, Fernandes Cadilha, etc.

19 - A pena administrativa de “detenção” é uma pena privativa da liberdade do mesmo modo que a prisão disciplinar e a prisão disciplinar agravada o são, de modo que deve caber na previsão da norma da alínea d) do n.º 3 do artigo 27º da CRP.

20 - A jurisprudência sufraga toda ela este pensamento, referindo o já citado Ac. 103/87: “E o que se diz dessas penas (prisão) vale, do mesmo modo, para a pena disciplinar de detenção”; e ainda:“As penas disciplinares de prisão e detenção só são susceptíveis de aplicação a militares, como resulta do artigo 27.º da CRP [em especial, n.º 3, alínea c).

21 - Do mesmo modo, refere o Ac. do TC 308/90:“E o que se diz dessas penas (prisão) vale, do mesmo modo, para a pena disciplinar de detenção”; e “As penas disciplinares de prisão e detenção só são susceptíveis de aplicação a militares, como resulta do artigo 27.º da CRP [em especial, n.º 3, alínea c).

22 - Igualmente os Ac. do TC 725/95, 119/96 e 500/98, na esteira dos 2 Ac. referidos nos 2 números anteriores referem que a “detenção” é uma pena privativa da liberdade do mesmo modo que prisão disciplinar e prisão disciplinar agravada.

23 - A entidade recorrente tinha até há pouco mais de um ano entendimento idêntico ao acima referido como se comprova pelo Despacho exarado no Parecer n.º 570 – FC/2008 (junto como documento com a P. I.) mas a partir de meados de 2008, inexplicavelmente, mudou de ideias, passando a revelar um entendimento oposto (5 anos depois do Ac. do TC 521/03).

24 - Os agentes militarizados da GNR não constituem pessoal aquartelado, como diz a entidade recorrente, ao contrário do que acontece com os militares da Forças Armadas e como mais em pormenor se refere no número 14 deste documento.

25 - Os agentes militarizados da GNR, ao contrário do que acontece com os militares das...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT