Acórdão nº 04725/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução17 de Maio de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "S... - Comércio de Fios, Lda." (adiante Contribuinte, Impugnante ou Recorrida) impugnou judicialmente a liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respectivos juros compensatórios, do montante global de esc. 2.372.579$00, que lhe foi efectuada com referência ao ano de 1988 na sequência da fixação da matéria tributável (1) pela Comissão de Revisão (CR), para a qual reclamou da primitiva fixação feita pela Administração tributária (AT), com recurso a métodos indiciários, após uma visita de fiscalização em que concluiu que a contabilidade da Contribuinte revelava diversas anomalias e que inexistiam outros elementos que permitissem a determinação directa da matéria tributável.

Pediu a anulação daquela liquidação com diversas causas de pedir, a saber, a caducidade do direito à liquidação do imposto, a falta de verificação dos pressupostos para a fixação da matéria tributável por métodos indiciários e o erro na quantificação da matéria tributável.

Interessa-nos agora considerar apenas a caducidade do direito à liquidação do imposto (2), invocada pela Contribuinte com a argumentação que a notificação da liquidação que lhe foi efectuada pela AT não respeitou as exigências legais, motivo por que se verifica a «falta de citação» (3-4). Isto, em síntese, porque: - a AT tentou a notificação, não na sede da sociedade Contribuinte, como consta da certidão, mas numa dependência da mesma, sita na Av. Infante D. Henrique, e, apesar aí de lhe ter sido dito pela única empregada presente que «ela era a única pessoa que naquele dia trabalharia na dependência da Av. Infante D. Henrique, a qual encerrava às 17 horas», «que o Gerente que procuravam residia em Gouveia», «Que ia fechar o local pois se sentia doente», «Que com toda a probabilidade não seria capaz de transmitir o aviso ao ou aos notificandos a tempo de estes poderem comparecer no dia seguinte, mas poucas horas depois», «que não iria provavelmente comparecer ao trabalho em razão da doença que a apoquentava, se não viesse a sentir-se melhor após a noite», «que a Impugnante possui escritórios e armazém em Lisboa, na Av. Infante D. Henrique, 332» e que aí «é que poderiam encontrar gerentes e outros empregados capazes de transmitir a notificação», a AT não só não se dirigiu a estes escritórios, como, ao invés de procurar outros gerentes, na sede da sociedade ou na residência destes, ou até de efectuar a notificação na pessoa de qualquer empregado, deixou indicação de hora certa para o gerente que procurava; - a AT deixou indicação de hora certa para o dia seguinte, com um lapso de tempo de «escassas 2,30 horas úteis de trabalho»; - a AT «invoca que se deslocou à sede social às 11,00 horas de 29/12/93 e que, não encontrando sequer vizinho, afixou uma nota de notificação», mas a Impugnante «Ignora [...] se tal diligência efectivamente ocorreu nos termos em que está documentada», sendo que «no dia 29/12/93, à tarde não foi encontrada qualquer nota afixada» e «existem diversos vizinhos, quer habitacionais quer comerciais e nenhum deles deu conta de qualquer diligência»; - só em 6 de Janeiro de 1994 veio a assinar o aviso de recepção da carta registada que a AT lhe remeteu para notificá-la «da decisão da reclamação relativa ao IVA».

1.2 O Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Lisboa, com base no disposto no art. 108.º do Código de Processo Civil (CPC), julgou nula a notificação da liquidação ora impugnada que a AT levou a cabo em 29 de Dezembro de 1993 e, por isso e atento o disposto no art. 88.º, n.º 1, do Código do IVA (5) (CIVA), julgou caducado o direito à liquidação do IVA do ano de 1988, motivo por que, decidindo pela procedência da impugnação e considerando prejudicado o conhecimento das demais causas de pedir invocadas pela Impugnante, anulou a aquela liquidação.

Para tanto, e em síntese, considerou - que a notificação por hora certa «pressupõe [...] uma actividade informatória por parte do funcionário, com vista à obtenção de informação sobre a localização e hábitos de vida do citando, com vista a fundamentar um juízo de utilização do mecanismo da hora certa e da adequação da dilação de tempo; o que resulta, quer da utilização da expressão "procurando", quer da conjugação com o disposto no artº 238 CPC», sendo que «os autos são omissos quanto às circunstâncias que permitiriam formular um juízo de o funcionário encarregado da notificação ter ou não efectuado essa actividade investigatória» pois «fez-se constar da certidão que foram informados que o gerente não estava, não se sabia onde estava nem quando viria; mas tal expressão encontra já impressa [sic] no modelo de certidão, lançando algumas dúvidas quanto à sua exactidão, tanto mais que a impugnante veio alegar que foram fornecidas outras indicações relativamente ao paradeiro do gerente»; mas, não cumpre sequer averiguar se o Funcionário realizou tais diligências de investigação pois, ainda que assim tenha sido, - a notificação com hora certa foi «incorrectamente efectuada» pois, «atendendo aos actuais padrões de vida, tem de se possibilitar às pessoas um prazo razoável para adaptarem os seus compromissos e situações de vida com vista a terem disponibilidade para estarem presentes; e um período de menos de 24 horas (ademais na época de natal e fim de ano), independentemente das razões que motivaram a ausência, afigura-se-me manifestamente insuficiente».

1.3 A Fazenda Pública, através do seu Representante junto do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto, recorreu dessa sentença para este Tribunal Central Administrativo, apresentando as alegações de recurso e respectivas conclusões, sendo estas do seguinte teor: « 1) De acordo com a sentença recorrida ter-se-ia verificado a caducidade do direito à liquidação do imposto em causa em consequência da pretensa nulidade da respectiva notificação, decorrente da inobservância do disposto no nº 1 do artº 235º do CPC, conjugado com o previsto no artº 238º do mesmo código, na redacção então vigente.

2) Constata-se, no entanto, que, tendo o funcionário em causa procurado o notificando, não o tendo encontrado (como resulta do teor conjugado de fls. 250 e 252), e tendo a marcação de hora certa sido feita para o dia (útil) seguinte, se mostra estritamente observado o previsto no nº 1 do artº 235º do CPC, quer no que respeita à efectivação da diligência para encontrar o notificando quer no que concerne ao prazo fixado para proceder à questionada notificação, uma vez que o dia indicado se inclui no período legalmente fixado para o efeito.

3) Decorre do exposto que, não sendo aplicável à notificação em causa o disposto no artº 238º, nº 1 do CPC e tendo sido observadas as formalidades prescritas na lei (cfr. artº 198º, nº 1 do CPC), deverá a mesma ser considerada como validamente efectuada, ou seja, apta a produzir os respectivos efeitos (designadamente o efeito interruptivo do prazo de caducidade), não ocorrendo, assim, a questionada caducidade do direito à liquidação, pelo que a sentença recorrida deverá ser revogada, com as legais consequências, na medida em que, a propósito da efectivação de diligência em causa, aplicou indevidamente o disposto nos artºs 198º e 238º do CPC, violando, ainda, o artº 88º, nº 1 do CIVA».

1.4 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.5 A Impugnante contra alegou, no sentido da manutenção da sentença, resumindo a sua posição nas seguintes conclusões: « 1 - impunha-se à administração fiscal, que previamente à designação do dia para proceder a notificação com hora certa, obter o mínimo de informações sobre a localização do citando, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 235º e 238º do cpc, de forma a poder notificá-lo noutro lugar ou permitir ao citando estar presente no dia e hora designadas para a diligência; 2 - a administração fiscal não só não desenvolveu nunhuma actividade com vista a obter previamente qualquer informação sobre a localização do citando, como ignorou todas as informações prestadas a 28/12/93, pela funcionária da impugnante; 3 - pelo que, a 28/12/93 não estavam reunidas todas as condições necessárias para a administração fiscal promover a notificação com hora certa; 4 - no dia 28/12/93, pelas 16:30 horas, a administração fiscal deixou aviso, com funcionária da impugnante para notificação com hora certa, para o dia seguinte - 29/12/93, ás 11:00 horas, mediando menos de 24 horas e apenas 2:30 horas de trabalho entre as duas datas, para a funcionária transmitir ao citando o aviso; 5 - que, atendendo aos actuais padrões de vida é manifestamente insuficiente para permitir a comparência do citando; 6 - tanto mais, que no dia 28/12/93, a funcionária da impugnante avisou os funcionários da administração fiscal que: a) não teria tempo para transmitir o aviso ao citando; b) que o gerente se encontrava em gouveia; 7 - mesmo que...

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