Acórdão nº 00499/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Março de 2005

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução16 de Março de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "Imobiliária Construtora G..., S.A." (adiante Executada, Reclamante ou Recorrente), no processo de execução fiscal instaurado contra ela pelo 5.º Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Lisboa, para cobrança de uma dívida à Câmara Municipal de Lisboa (CML), proveniente de taxa de conservação de esgotos do ano de 1994 e acrescido, pediu ao Presidente da CML a extinção da execução com o fundamento que a dívida exequenda se encontrava paga pelas dações em pagamento efectuadas no âmbito do Acordo Global celebrado entre o Estado Português e o Grupo G..., do qual faz parte a Executada, nos termos do qual a extinção da execução «devia ser promovida oficiosamente pelos serviços da Administração Tributária, imediatamente após a data dos autos de dação em pagamento» (1).

    1.2 Esse pedido foi indeferido por despacho da Vice-Presidente da CML, que considerou, em síntese, que a taxa de conservação não se encontra incluída no referido "Acordo Global" e que o Município de Lisboa não foi parte no mesmo acordo.

    1.3 A Executada reclamou, ao abrigo do disposto no art. 276.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), dessa decisão da Vice-Presidente da CML para o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, requerendo a subida imediata da reclamação (2), e formulando pedido no sentido de que deve «ser anulado o Despacho de indeferimento ora reclamado» ou, subsidiariamente, deve «ser reconhecida a inconstitucionalidade da taxa de conservação de esgotos».

    Invocou, em síntese e na parte que ora nos interessa (3).

    - que, contrariamente ao que entendeu a Vice-Presidente da CML, a taxa de conservação de esgotos respeitante ao ano de 1994, taxa que tem um carácter meramente acessório em relação à Contribuição Predial e à Contribuição Autárquica, deve considerar-se incluída no referido Acordo Global celebrado entre o Estado e o grupo empresarial a que pertence a Reclamante; - caso assim não se entenda, então haverá que ter em conta que a taxa de conservação de esgotos padece de inconstitucionalidade orgânica e material: inconstitucionalidade orgânica porque, correspondendo a denominada taxa de conservação de esgotos a uma percentagem sobre o valor patrimonial dos prédios, não assegurando a proporcionalidade entre o valor da taxa e a utilidade que do serviço retira o contribuinte, faz com que se não verifique uma das características das taxas - a bilateralidade -, o que lhe retira a natureza de taxa, devendo antes qualificar-se como imposto, o que significa que só poderia ter sido criada pela Assembleia da República ou pelo Governo, autorizado por aquele, e nunca por uma Câmara Municipal; inconstitucionalidade material, porque dois contribuintes que tenham exactamente a mesma conduta são tratados de forma diferente, sem que esta diferença resulte necessariamente de uma maior capacidade contributiva, o que constitui violação do princípio da igualdade.

    1.4 A reclamação foi julgada improcedente, por sentença em que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa considerou, em síntese e na parte que ora nos interessa (4), o seguinte: - a dívida exequenda não está incluída no Acordo celebrado entre o Estado e o grupo empresarial a que pertence a Executada, pois não está expressamente incluída nesse acordo, nem a CML se confunde com o Estado, sendo «pessoas colectivas distintas, cada uma com os seus órgãos próprios»; - a questão da inconstitucionalidade não pode ser objecto da reclamação, pois tal questão não foi suscitada pela Executada no requerimento sobre o qual foi proferida a decisão objecto da presente reclamação, nem nessa decisão foi apreciada inconstitucionalidade alguma; - a invocação da inconstitucionalidade da taxa de conservação de esgotos feita nesta fase «configura um artifício para deixar aberta a possibilidade de um eventual recurso para o Tribunal Constitucional»; - «admitindo, sem conceder», que assim não seja, sempre a questão improcederia, pois, por um lado, é inegável o carácter bilateral ou sinalagmático da taxa em causa, o qual não pressupõe «um exacto equilíbrio económico», mas se basta com a existência de «um mínimo de equilíbrio jurídico entre ambas as prestações», sendo que no caso a contrapartida dessa taxa é representada pelo acesso e evacuação das águas residuais até à rede pública, a conservar e manter em bom estado pelas câmaras municipais, motivo por que, não constituindo um imposto, fica afastada a invocada inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade tributária; por outro lado, quanto à invocada inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, a fixação da taxa em 0,25% do valor patrimonial dos prédios «não é desproporcionada para efeitos do princípio constitucional da proporcionalidade».

    1.5 A Executada interpôs recurso daquela sentença (5) para este Tribunal Central Administrativo, sendo que com o respectivo requerimento apresentou as alegações, resumidas nas seguintes conclusões: « 1. No âmbito do processo de execução nº 19494/96, a correr termos pela Divisão de Execuções Fiscais da Câmara Municipal de Lisboa, a Recorrente requereu a extinção do processo, uma vez que a dívida exequenda se encontra paga ao abrigo das dações em pagamento efectuadas em 8 de Fevereiro de 2000.

  2. Este requerimento foi indeferido por despacho da Senhora Vereadora e Vice Presidente daquela autarquia.

  3. A Recorrente apresentou uma reclamação desse indeferimento, nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT, por considerar que a dívida em causa se encontra abrangida pelo Acordo Global, e por considerar que a cobrança do tributo em causa não é possível atenta a inconstitucionalidade do art. 77.º do Regulamento.

  4. O Meritíssimo Juiz a quo indeferiu ambas as pretensões da Recorrente.

  5. Contrariamente ao entendimento do Meritíssimo Juiz a quo, a Recorrente defende que a taxa de conservação de esgotos de 1994 está incluída no Acordo Global e respectivo Acordo de Fecho, bem como nas dações em pagamento realizadas em Fevereiro de 2000.

  6. Com efeito, a determinação das dívidas abrangidas pelo Acordo Global faz-se em função da entidade cobradora.

  7. A dívida em causa, estando em fase de cobrança coerciva em Fevereiro de 2000, era cobrada pela Direcção Geral dos Impostos, através dos tribunais tributários de 1.ª instância.

  8. Assim sendo, tem perfeito enquadramento nas cláusulas 3.1. (a) e (b) do Acordo Global, bem como nas cláusulas 6.1, 6.6 e 7 do Acordo de Fecho.

  9. O facto de a CML não ter sido parte interveniente no Acordo Global, no Acordo de Fecho e nos autos de dação em pagamento não releva para a situação em apreço nos presentes autos.

  10. Na verdade, tal facto não impediu que fossem incluídas no Acordo Global diversas dívidas referentes a Contribuição Autárquica.

  11. No texto do Acordo Global, a referência expressa que é feita à Contribuição Autárquica tem carácter meramente exemplificativo - demonstrado, aliás, pela utilização do advérbio "designadamente" - e não exclusivo.

  12. A taxa de conservação de esgotos, calculada com base no valor patrimonial dos imóveis, é um verdadeiro imposto, porquanto não se verifica proporcionalidade entre a taxa cobrada e o serviço prestado.

  13. Sendo um verdadeiro imposto, a norma do art. 77.º do Regulamento é inconstitucional por violação da reserva de competência da Assembleia da República, mais concretamente os arts. 103.º, e 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP.

  14. A taxa em causa viola, ainda, o princípio da igualdade, previsto no art. 13.º da CRP, porquanto o mesmo serviço prestado a sujeitos passivos diferentes gera taxas diferentes, apenas e só, porque os valores patrimoniais com base nos quais é calculada são distintos.

  15. Distinção essa que, como o próprio Governo reconheceu, se traduz numa real e efectiva discriminação e iniquidade do sistema, gerando desigualdades injustificadas de tratamento entre contribuintes semelhantes.

  16. Repetindo as palavras de afonso queiró, transcritas supra, não só "não é natural exigir-se por uma prestação, serviço ou actividade administrativa pagamento de uma taxa de montante superior ao de outra que é cobrada pela Administração por um prestação, serviço ou actividade idêntica", como tal situação é contra a lei e a CRP.

  17. O tratamento discriminatório imposto aos contribuintes por via deste regime de cálculo da taxa de conservação de esgotos é, pois, violador do princípio da igualdade previsto no referido art. 13.º da CRP.

  18. Quanto a este facto não podem - nem devem - restar quaisquer dúvidas.

  19. O Meritíssimo Juiz a quo fixou as custas do processo em 20 UC, da responsabilidade da reclamante, ora Recorrente.

  20. O Meritíssimo Juiz a quo não fundamentou a sua decisão.

  21. O Regulamento das Custas nos Processos Tributários prevê, na presente situação, que as custas sejam fixadas em...

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