Acórdão nº 02465/99 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelFrancisco Areal Rothes
Data da Resolução26 de Outubro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 S...

    e mulher, M...

    (adiante Contribuintes, Impugnantes ou Recorridos) impugnaram judicialmente as duas liquidações de imposto sucessório (IS) que lhe foram efectuadas pela 2.ª Repartição de Finanças do concelho de Coimbra (RFC), do montante de esc. 93.242$00 e 93.294$00, alegando, em síntese, o seguinte: - por escritura pública de 7 de Julho de 1971 os pais do Impugnante marido doaram-lhe, a ele e a sua irmã, em comum e partes iguais, «uma casa de habitação, casa de adega e arrumações» (1), inscrita na matriz predial urbana da freguesia de Brasfremes sob o art. ....º, com reserva do usufruto vitalício para eles doadores; - pela mesma escritura, os donatários procederam à divisão do prédio doado, tendo ficado a pertencer aos Impugnantes um prédio que se destina a «habitação e casa de arrumações, composto por rés-do-chão com quatro divisões e cozinha», com a área coberta de 63 m2, a que veio a ser atribuído o artigo matricial n.º ...; - em 1973, os Impugnantes construíram uma só casa de habitação a partir das referidas habitação e casa de arrumações, destruindo esta e algumas paredes antigas daquela, ampliando o conjunto, construindo novas paredes, aplicando madeiras novas, colocando um telhado novo, construindo novas divisões e alterando as existentes, o que tudo fizeram a expensas deles Impugnantes; - essas obras aumentaram em muito o valor do imóvel e os ora Impugnantes vieram a arrendá-lo pela renda mensal de esc. 6.500.$00 em 30 de Setembro de 1980 e pela renda mensal de esc. 9.000$00 em 1 de Janeiro de 1982, tendo apresentado a declaração a que alude o art. 116.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola (CCPIIA) em 30 de Janeiro de 1981; - por escritura pública de 15 de Junho de 1984 os doadores renunciaram gratuitamente ao seu usufruto; - em 1986/87, os Impugnantes apresentaram a declaração modelo 129 a que aludia o art. 214.º do CCPIIA, mencionando nela as obras efectuadas em 1973, vindo o imóvel a figurar na matriz sob o artigo n.º 739, em substituição do anterior n.º 547.

    - o pai do Impugnante marido faleceu em 23 de Novembro de 1986, no estado de casado e, no respectivo processo de imposto sobre as sucessões e doações, a que foi atribuído o n.º..., a repartição de finanças considerou o valor matricial do referido imóvel de esc. 1.701.000$00, proveniente do rendimento colectável de esc. 113.400$00, resultante da última renda declarada, na proporção de metade, e tendo ainda em conta o remanescente dos bens mobiliários e imobiliários integrantes da herança, procedeu à liquidação do imposto sobre as sucessões e doações e do imposto extraordinário, dos montantes de, respectivamente, esc. 81.125$00 e 12.169$00; - no processo de imposto sobre as sucessões e doações relativo à renúncia ao usufruto por parte de I..., ao qual foi atribuído o n.º ..., a repartição de finanças, tomando por valor matricial do referido imóvel a metade de esc. 1.701.000$00, procedeu à liquidação do imposto sobre as sucessões e doações e do imposto extraordinário, dos montantes de, respectivamente, esc. 81.080$00 e 12.162$00; - a repartição de finanças não deveria ter considerado o valor do bem à data da liquidação, mas antes o valor matricial do bem à data da doação e, se assim tivesse feito, nunca seria devido IS pelos Impugnantes, atenta a isenção prevista no art. 12.º, n.º 2, do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações (CIMSISD).

    1.2 Na primeira sentença proferida neste processo pelo Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra considerou-se, em suma, que o rendimento colectável «a considerar para a liquidação do imposto é o que existia à data da transmissão (em consonância com a melhor doutrina estabelecida para a interpretação do artº. 30 do C.S.I.S.S.D.), situando-se esta na altura da consolidação da propriedade com o usufruto (artº 3º, §1º e 20º corpo do preceito - do C.S.I.S.S.D.)», motivo por que «nunca a Repartição poderia considerar o valor dos bens à data da doação da mera raiz ou da nua propriedade». E mais esclareceu que «O facto do aumento do rendimento colectável poder advir da actividade do seu proprietário, em consequência de obras ou melhoramentos efectuados, não tem aqui qualquer reflexo fiscal. Antes de mais porque tais obras se situam em época anterior à da transmissão fiscal que é erigida em fenómeno tributário.

    Depois, porque o usufrutuário fica com o direito de gozar de tais obras e melhoramentos dentro da identidade do prédio sobre o qual detém o direito de usufruto (cfr. artsºs 1471º e 1439º do C.Civil).

    Finalmente, porque e quando da consolidação do usufruto com a propriedade, também se opera a reunião material real e efectiva desse maior valor».

    Por tudo isso, considerando que a Repartição de Finanças andou bem na determinação da matéria colectável ao considerar os valores matriciais dos bens na data da renúncia ao usufruto, o Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra julgou a impugnação judicial improcedente.

    1.3 Dessa sentença recorreram os Impugnantes para o Supremo Tribunal Administrativo, que se declarou incompetente em razão da hierarquia para conhecer do recurso, declarando competente para o efeito o Tribunal Tributário de 2.ª instância. Este último, conhecendo do recurso, anulou a sentença recorrida e ordenou a devolução dos autos à 1.ª instância, a fim de aí prosseguirem com a produção de prova relativamente às alegadas obras.

    Isto, em síntese, porque entendeu como solução jurídica plausível, e seguida por alguma jurisprudência, que «o que se consolidou foi a nua propriedade e o usufruto do bem doado no qual não se incluiria o que lhe foi acrescido por força das faladas obras».

    1.4 Devolvido o processo ao Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra, aí foi proferida nova sentença, depois de se proceder à inquirição das testemunhas arroladas pelos Impugnantes.

    Nessa sentença julgou-se a impugnação procedente. Para tanto, depois de tecer considerandos sobre a polémica suscitada pela aplicabilidade conjunta dos arts. 20.º e 30.º do CIMSISD nos casos em que ocorrem alterações do valor dos bens transmitidos entre as datas da transmissão e da liquidação por efeito de obras efectuadas pelos adquirentes, considerou o Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra, em síntese, que na liquidação não podia considerar-se senão o valor do prédio doado à data da transmissão.

    1.5 A Fazenda Pública recorreu dessa sentença para o Supremo Tribunal Administrativo, que a anulou por omissão de pronúncia e ordenou que os autos voltassem à 1.ª instância, para reforma da sentença anulada.

    Nos termos do acórdão daquele Supremo Tribunal, o Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra não se pronunciou sobre a questão de saber se a liquidação devia ter por base o valor do bem doado à data da consolidação da propriedade com o usufruto ou à data da doação («sem distinguir a transmissão/consolidação da transmissão/doação»), questão suscitada na contestação pelo Representante da Fazenda Pública, que sustentou que a liquidação, respeitando o disposto nos arts. 3.º, § 1.º, e 21.º, do CIMSISD, se fundara no valor dos bens à data da renúncia do usufruto dos doadores por ser o momento em que se consolida a propriedade com o usufruto, de acordo com as regras do direito fiscal, que não faz coincidir no tempo a transmissão civil, representada pela doação, e a transmissão fiscal.

    1.6 O Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra proferiu nova sentença, na qual julgou a impugnação procedente.

    Considerou o Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra, em resumo, que, «nos termos dos arts. 3º e 21º do Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, a transmissão fiscal do usufruto para o nu-proprietário só se opera com a consolidação, sendo o valor para liquidação o da data desta reportada à transmissão (cfr. art. 1º do mesmo Diploma)». Assim, e «[t]endo em conta a matéria considerada assente nestes Autos, em probatório, relativa às benfeitorias realizadas no prédio doado pelos donatários/impugnantes, após a data da doação», concluiu que os Impugnantes têm razão.

    Terminou a sentença nos seguintes termos: «Consequentemente, a transmissão em causa haverá de declarar-se isenta de liquidação (cfr. art. 12º nº 2 do CSISSD, na redacção do Dec. Lei Nº 115/84, de 15.4: vide, igualmente, a redacção dada pelo Dec. Lei Nº 252/89, de 9 de Agosto), devendo ser restituídas aos donatários/impugnantes as quantias indevidamente liquidadas e juros, tal como se peticiona a fls. 6v. e 7 dos Autos, na procedência da impugnação» 1.7 A Fazenda Pública, através do seu representante junto do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Coimbra, veio interpor recurso dessa sentença para este Tribunal Central Administrativo, recurso que foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

    1.8 A Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões: «1.- A alegação dos Autores centrou-se no facto de terem efectuado obras no imóvel doado com reserva de usufruto e no período decorrente entre a doação e a consolidação da transmissão.

  2. - Para tanto juntou prova documental e arrolou prova testemunhal.

  3. - Os documentos juntos, na sua maioria não identificam como destinatário o impugnante. Os documentos referentes ao impugnante referem-se a obra em Vilarinho, quando o prédio doado se situa em Gondileu.

  4. - Da prova testemunhal merece relevância o testemunho do empreiteiro o qual declarou que quem o contratou e quem lhe pagava eram os doadores, pais do impugnante. Quanto à origem do dinheiro e à imputação ao impugnante depreendeu tal do facto de já ter sido feita a doação.

  5. - Ora, tal pressuposição não é de molde a comprovar tal imputação subjectiva, antes os factos infirmam o alegado de que as obras foram efectuadas pelos impugnantes.

  6. - Também o testemunho de M... não comprovação [sic] tal imputação.

  7. - Por isso, não poderia ser dado como provado que foram os donatários, ora...

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