Acórdão nº 07127/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelJosé Gomes Correia
Data da Resolução19 de Outubro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DO TCA SUL: 1.- S...- Sociedade Central DE Produtos de Cortiça, Ldª, com os sinais dos autos, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho, do SEAF datado de 03 de Junho de 2002, que indeferiu o recurso hierárquico que interpôs relativo ao IRC do exercício de 1997, pelos fundamentos expressos no requerimento inicial que se dá por reproduzido.

Após Vista inicial ao EMMP, a entidade recorrida respondeu remetendo o processo instrutor, após o que as partes vieram alegar concluindo a recorrente do seguinte modo: a).- A autoridade recorrida praticou um vício de violação de lei, visto que, preteriu o ónus probatório que sobre si impendia; b)- Assim, e não tendo sido feita prova material e substancial das relações especiais, a Administração Fiscal dever-se-ia ter abstido de praticar o acto tributário, em conformidade com o disposto no artigo 121° do CPT; c)- Porquanto, existindo dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário, deve esta ser valorada processualmente a favor do contribuinte e conduzir à anulação do acto recorrido, pôr vício de violação de lei, derivado de erro sobre os pressuposto de facto.

d)- Ainda assim, importa também referir que, a autoridade recorrida não analisou a questão da nulidade do contrato suscitada pela Inspecção Tributária, designadamente, nulidade do contrato, porquanto, encontramo-nos face a um vício de forma por omissão de pronúncia.

e)- Existindo um dever especial de fundamentação, ínsito no artigo 80° do CPT, e não tendo a autoridade recorrida descrito de forma clara, objectiva e congruente, ainda que sucintamente, as relações especiais e o modus faciendi, da determinação do preço de livre concorrência, encontramo-nos face a um vício de forma, por falta de fundamentação.

f)- Até porque, enfatize-se « A ponderação da suficiência da declaração, dos motivos pêlos quais algumas questões permanecem irredutivelmente obscuras e do grau de certeza do acto vai decidir a validade do acto», in Saldanha Sanches, A quantificação da Obrigação Tributária, in Caderno CTF n° 173, páginas 438 e 439.

g)- Existe uma clara insusceptibilidade de enquadramento jurídico no artigo 57° do CIRC, visto que, no caso vertente, não estamos face a preços fictícios e, portanto, a desencadear um mecanismo de planeamento fiscal ilícito.

NESTES TERMOS, EM FACE DE TUDO QUANTO SE ALEGA, CONCLUI-SE COMO NA PETIÇÃO DE RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO, REQUERENDO-SE, PORTANTO, A ANULAÇÃO DO DESPACHO RECORRIDO, E CONSEQUENTEMENTE A ANULAÇÃO DA CORRECÇÃO À MATÉRIA TRIBUTÁRIA NO MONTANTE DE EUROS 1.032.112,60.

Por sua vez, a entidade recorrida concluiu assim as suas alegações: 1.- No caso em concreto, não há dúvida que existem, entre a recorrente e a E. ..., SGPS, relações especiais capazes ou susceptíveis de conduzirem a um efectivo estabelecimento de condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre empresas independentes, como, aliás, a própria recorrente o admite.

  1. Uma vez que a E. ..., Filhos, SGPS, detém 70% do capital da recorrente.

  2. Existe, deste modo, vínculo de dependência jurídica - relacionamento especial entre as empresas associadas e dependentes da posição dominante do accionista/sócio comum -, susceptível de influenciar decisivamente a actuação das duas empresas.

  3. Relações especiais estas que permitiram, efectivamente, o estabelecimento de condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre empresas independentes.

  4. Na verdade, o acto recorrido ao acolher o relatório da IGF, a informação n° 401/2002, da DSIRC, e todos os pareceres sobre os mesmos emitidos, preenche todas as exigências legais e não fere, em nada, os direitos e garantias da recorrente.

  5. Finalmente, no acto recorrido não se acolheu, através da sua Adenda e no qual é lavrado o despacho do SEAF, o argumento da nulidade do negócio, tendo sobre esse aspecto sido lavrado" Auto de Notícia".

  6. O método empregue pela AF para apurar e determinar o estabelecimento dessas condições, diferentes das normalmente acordadas entre empresas independentes, foi conforme os pressupostos constantes do art. 57° do CIRC.

  7. Não obstante o referido confere à Administração uma certa discricionariedade técnica na interpretação e aplicação de tais pressupostos, nomeadamente, o da escolha do método adequado à determinação do estabelecimento de condições diferentes das normalmente acordadas entre pessoas independentes 9. A AF actuou de acordo com os pressupostos estabelecidos no art. 57°, e dentro da margem de discricionariedade técnica conferida pela mesma norma, tendo descrito e fundamentado, clara e suficientemente, a aplicação de cada um daqueles pressupostos, motivo pelo qual o acto recorrido não padece de quaisquer vícios devendo ser mantido na íntegra.

Termos pelos quais entende que deve ser negado provimento ao presente recurso, com todas as legais consequências.

O EMMP pronunciou-se no sentido do improvimento do recurso por considerar que a AF actuou de acordo com os pressupostos estabelecidos no artº 57º do CIRC.

Cobrados os Vistos legais, há que decidir por a tal nada obstar.

* 2.- Para tanto, dão-se como provados os seguintes factos com base na prova documental produzida nos autos (no presente recurso e no p.i.) com interesse para a decisão: a)- A recorrente tem como objecto social o fabrico de aglomerado negro de cortiça, estando enquadrada para o efeito no CAE ... (cfr. doc. nº 1 junto com a p.i.); b)- A recorrente apresentou a Declaração de Rendimentos Mod. 22 relativa ao exercício de 1997, dentro do prazo legal (cfr. doc. nº 1 junto com a p.i.); c)- Em 30/11/2000, por decisão do chefe de Divisão de Prevenção e Inspecção Tributária (SPIT), teve início uma acção inspectiva, a nível interno, à declaração Mod. 22 referida em b), na sequência da qual, foi proposta e efectuada, ao abrigo do art. 57º do CIRC, uma correcção daquela declaração, de natureza quantitativa, no montante de 206.920.000$00, que a Administração Fiscal fez acrescer ao lucro do exercício ao abrigo do art. 57º do CIRC, com base em que aquele montante foi registado a titulo de Variações Patrimoniais Negativas (Q17 L3), resultantes, segundo documentos em anexo fornecidos pela Sociedade, da perda registada na alienação de Quotas Próprias, conforme melhor consta do relatório elaborado pelo SPIT, que nessa parte aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. doc. nº 2 junto com a p.i.); d)- De acordo com esse relatório, a aludida correcção baseou-se, em síntese, no facto existirem duas situações distintas embora simultâneas, a Compra por parte da Sociedade de duas Quotas Próprias e a imediata Venda das mesmas. Na primeira situação a sociedade S...,LDA comprou 2-Quotas Próprias com o valor nominal de 1.540 contos, pelo valor de 105.000 contos cada, aos sócios Maria ... e José ..., facto que ao abrigo dos números 2 e 3 do artº 220º do Código das Sociedades Comerciais, ter-se-á que considerar nulo pois a sociedade não dispunha, no momento, em Reservas Livres, do valor mínimo legal exigido, correspondente ao dobro do contravalor a prestar; na segunda situação, considerando-se a hipótese que a compra das quotas próprias não era anulável, salienta-se que no mesmo dia que a venda das referidas Quotas Próprias à E. ..., Filhos, SGPS, S.A., que haviam sido adquiridas pelo valor da 105.000 contos cada , peto seu valor nominal de 1.540 contos cada, indiciam um claro ajustamento do preço em favor dos sócios da E...., Filhos SGPS, S.A. ou seja, parece ter existido um aproveitamento por parte dos sócios da empresa, por força da relação especial que mantêm com essa mesma empresa, fazendo baixar o preço da transacção.

Importa referir que paralelamente a esta venda de Quotas Próprias por parte da S..., Lda, outros sócios da mesma empresa venderam igualmente à E...., Filhos SGPS, SA. as suas quotas, só que por valores muito superiores conforme a seguir se descrimina de acordo com a escritura de compra e venda que se junta em anexo.Sócio da S..., Lda Neste caso e ao abrigo do disposto no n°1 do art° 57° do CIRC, este facto seria susceptível de correcção, dado existirem relações especiais entre os sócios da sociedade compradora e a sociedade vendedora, sendo evidente o ajustamento do valor das Quotas em favor dos compradores, tendo sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas por pessoas independentes. revelando esta operação não mais do que uma redistribuição do Capital Social da empresa que não deve influenciar o Lucro tributável, não cabendo assim no conceito de variação patrimonial negativa, referida no art° 24° do CIRC.

Assim, considerou-se que a operação de aquisição de quotas próprias é nula à luz do disposto nos n°s 2 e 3 do art° 220 do Código das Sociedades Comerciais, não se aceitando por esse facto o lançamento de qualquer perda registada em alienação de Quotas Próprias, nem a existência de quaisquer variações patrimoniais negativas. (cfr. doc. nº 2 junto com a p.i.); e)- A ora recorrente foi notificada dessa correcção ao lucro tributável reportado ao exercício de 1997 pelo ofício nº 3694, de 26/06/2001, da DDF de Santarém, bem como direito de interpor recurso hierárquico dessa decisão para o Ministro das Finanças, nos termos do art. 112º do CIRC (cfr. doc. nº 2 junto com a p.i.); f)- Na sequência dessa notificação, a ora recorrente interpôs, em 30/07/01, recurso hierárquico ao abrigo do art.112º do CIRC, nos termos que constam do doc. nº 3 junto com a p.i. e cujo teor integral aqui se dá por reproduzido; g)- Esse recurso hierárquico mereceu, em 2/06/02, o seguinte despacho de Sua Ex.ª o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: «Concordo.

» (cfr. doc. nº 1 junto com a p.i. e processo apenso); h)- Esse despacho, ora recorrido, baseou-se na informação nº 410/2002, prestada pelo Sr. Inspector Tributário em 13/03/02,confirmada pelo Exmº Coordenador em 18/03/2002 e pelo Exmº Director de Serviços em 19/03/02, que, nessa medida, em 13/03/02 elaborou "Projecto de Despacho", e...

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