Acórdão nº 00184/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelFrancisco Areal Rothes
Data da Resolução12 de Outubro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "S..., Lda." (adiante recorrida, Impugnante ou Contribuinte) impugnou judicialmente a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e juros compensatórios, no total de esc. 22.448.194$00, na parte resultante da correcção à matéria colectável que lhe foi efectuada por a Administração tributária (AT) ter desconsiderado como custo (majorado em 40%) do ano de 1991 um donativo do montante de esc. 25.000.000$00, por este montante não ter sido entregue ao donatário no ano de 1991.

    Na petição inicial a Impugnante pediu a anulação da liquidação, na parte que teve origem na referida correcção. Para tanto, e em síntese, invocou os seguintes fundamentos: - por carta de 27 de Novembro de 1991 propôs à "Fundação E..., Filhos" a concessão de um donativo de esc. 25.000.000$00, que esta aceitou expressamente por carta de 14 de Dezembro (1) do mesmo ano; - perante essa aceitação expressa, a Impugnante contabilizou o donativo; - no entanto, porque o montante destinado ao donativo se encontrava afecto a uma aplicação financeira, «e aproveitando-se da tolerância da Fundação» (2), a Impugnante só entregou o dinheiro no ano de 1992; - a AT entende que o donativo não foi feito no exercício do ano de 1991 e, por isso, não o considerou como custo desse ano, motivo por que procedeu à liquidação ora impugnada; - contrariamente ao que entendeu a AT, a doação da quantia de esc. 25.000.000$00 ocorreu em 1991, e não em 1992, pois com a aceitação da mesma por escrito pela referida fundação, a propriedade do bem doado transferiu-se para a donatária, independentemente da sua tradição, a qual não constitui nem requisito de validade nem requisito de eficácia da doação.

    1.2 O Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Santarém proferiu sentença na qual considerou que o princípio da especialização dos exercícios, consagrado no art. 18.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (3) (CIRC), tem vindo a ser entendido jurisprudência como «o instrumento que visa alcançar a tributação da "riqueza gerada em cada exercício independentemente do seu efectivo recebimento"». Assim, fazendo apelo à semelhança do caso sub judice com o relatado no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Fevereiro de 2000 (4), proferido no processo com o n.º 22.208, concluiu que «foi correcto o procedimento da Ite em contabilizar, no exercício de 1991, a verba de 25.000.000$00 que decidiu doar à identificada Fundação, doação que esta instituição aceitou ainda no ano de 1991» e se «[é] certo que a entrega efectiva do dinheiro só ocorreu já no ano de 1992», tal circunstância não releva para efeitos de imputação do custo ao ano de 1991, uma vez que «[f]oi no ano de 1991 que a Ite assumiu o custo respectivo e apenas, por razões circunstanciais, não entregou de imediato a verba envolvida à donatária; entrega que, contudo, veio a efectivar-se [...], tornando a doação em causa plenamente eficaz».

    Consequentemente, julgou a impugnação judicial procedente e anulou a liquidação na parte correspondente à correcção da matéria tributável determinada pela não aceitação como custo do donativo de esc. 25.000.000$00 e da respectiva majoração de 40%, que ascende a esc. 10.000.000$00.

    1.3 Inconformada com essa sentença, a Fazenda Pública, através do seu representante junto do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Santarém, dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo e o recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    1.4 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu nas seguintes conclusões: « ð A douta sentença de que se recorre fez incorrecta interpretação do preceituado no nº 3 do artigo 40º do CIRC (vigente em 1991), e concerteza por lapso aplicou a doutrina resultante do nº 2 do artigo 24º do CIRC ao caso em análise, considerando que a missiva de 14.12.1991, remetida pela donatária é expressão de aceitação, pelo que à luz do citado normativo, o custo do donativo terá de ser imputado no exercício de 1991.

    ð Apoiou-se erroneamente a douta sentença no aresto nº 222208 (5), de 09.02.2000, do Supremo Tribunal Administrativo, olvidando que este versava sobre factualidade diversa relativamente ao caso subjudice e mais relevante, consagrava distinto critério de imputação de custos, isto é, aplicou à situação vertente, solução jurisprudencial versando sobre diferente factualidade e antagónica solução do ponto de vista jurídico-tributário (nº 2 do artigo 24º do CIRC).

    ð O legislador no nº 2 do artigo 24º do CIRC, tal como refere o douto aresto, quis objectivamente que, não obstante a entrega de gratificações aos membros dos órgãos sociais de sociedade se consumar no exercício posterior àquele a que respeitam, sempre tal variação será de imputar ao exercício de onde provêm as gratificações.

    ð Igualmente, no campo das variações patrimoniais negativas relativas a liberalidades, o legislador afastou as condições estabelecidas no domínio dos custos (artigo 18º do CIRC), ou seja, afastou relativamente às liberalidades, as limitações às excepções do princípio da especialização dos exercícios.

    ð Sendo certo que in casu, não estamos perante variação patrimonial negativa, não é menos verdade que se está perante liberalidade, nos termos do nº 3 do artigo 40º do CIRC.

    ð O legislador, para efeitos de aceitação do custo referente a donativos, exige que se mostre efectivamente concedido o donativo, isto é, que este se mostre entregue ao donatário.

    ð No caso sub judice, o donativo apenas se efectuou em 1992, pelo que teria a impugnante de o imputar a esse mesmo exercício, o que não sucedeu.

    ð Perfilhando o entendimento decorrente da douta sentença de que se recorre, designadamente de permitir levar a custo donativo, no exercício em que este se vinculou à liberalidade, estar-se-ia a abrir uma janela de oportunidade para que, independentemente da concretização ou não do donativo (através da sua entrega ao donatário), o doador pudesse deduzir o custo fiscal do mesmo, ainda que este não se viesse a efectuar, uma vez que seria relevante, não a sua entrega efectiva, mas a manifestação de o efectuar, o que potencialmente conduziria a permitir deduzir fiscalmente um custo que efectivamente e na realidade nunca existira.

    ð Pelo exposto, falece a fundamentação aduzida na sentença de que se recorre, tendo o donativo concedido pela impugnante, em 1992, à Fundação Ernesto Lourenço Estrada, de ser, à luz do disposto no nº 3 do artigo 40º do CIRC, contabilizado como custo do...

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