Acórdão nº 05046/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Setembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução21 de Setembro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "J....., Lda.

    " (adiante Recorrente, Contribuinte ou Impugnante) impugnou judicialmente a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 1992, derrama e respectivos juros compensatórios, do montante global de esc. 10.171.031$00, que lhe foi efectuada na sequência da fixação pela Comissão de Revisão (CR) do lucro tributável com recurso a métodos indiciários.

    1.2 Na petição inicial a Impugnante alegou, em resumo, o seguinte: - aceita que a contabilidade «não terá sido elaborada da melhor forma» (1), por o contabilista a quem encarregou da respectiva organização não ter usado nessa tarefa do cuidado necessário, designadamente, não ter discriminado quais as compras e vendas relativamente a cada uma das diversas actividades exercidas pela Contribuinte e nunca ter pedido a esta o inventário físico das existências, antes forjando ele mesmo um inventário «para cumprir a formalidade legal, mas sem que espelhasse a realidade»; - aceita que a Administração tributária (AT) tenha procedido à fixação da sua matéria tributável por métodos indirectos (dizendo expressamente a Contribuinte que «não se insurge contra o facto de se ter partido para a sua tributação por métodos indiciários, pois a sua contabilidade não está bem elaborada»), mas não concorda que a contabilidade, tendo sido desconsiderada, o não tenha sido por todo, não podendo a AT «aproveitar os dados que convêm e desprezar os que não convêm»; - a AT «não seguiu o princípio da tributação do rendimento real», mas «[m]al viu que lhe era possívem [sic] partir para presunções, julgou o seu campo aberto a todas as arbitrariedades», quando, nas hipóteses em que lhe não é possível apurar o rendimento real, «a Administração Fiscal poderá reconstituir o resultado declarado», reconstituição que «terá de enquadrar dentro dos parâmetros previstos no artº 107º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa»; - seja como for, a Impugnante «elaborava diariamente o "Caixa"» e também «contabilizou sempre correctamente a conta "Bancos"», factos a que o relatório dos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (SPIT) nem sequer alude e que permitem uma certeza: «que todos os fluxos financeiros estão aí retratados»; - pelo contrário, no relatório dos SPIT refere-se um facto que não corresponde à verdade, qual seja o de que a Contribuinte não procedeu ao registo contabilístico dos apuros diários resultantes das vendas de electrodomésticos efectuadas ao balcão, quando todas essas vendas foram contabilizadas, sendo apenas que «a impugnante não discriminou o que eram electrodomésticos das restantes mercadorias, não emitindo talões de venda discriminados»; - apesar disso «as importâncias totais recebidas acabaram por ser contabilizadas, se bem que em global»; - existindo, como existe, incoerência entre as facturas de aquisições e as de vendas, deveriam desprezar-se as existências, e «no que respeita aos electrodomésticos, o apuramento só deveria ter sido feito através das compras, considerando a mesma quantidade de mercadorias vendidas, sem considerar as existências»; - os preços médios dos televisores e dos "vídeos" não são os referidos no relatório; - a AT também não aceitou custos sem qualquer fundamentação concreta; - as ofertas realizadas, porque relacionadas com a actividade, são custos da Contribuinte; - também as despesas de telefone, apesar da assinatura estar em nome do sócio-gerente, são custos da Contribuinte, bem como as despesas com aulas de inglês, que foram ministradas a empregados da Impugnante; - acresce que a acta da comissão de revisão (CR) deveria ter discriminado os valores fixados por exercício económico e, não o tendo feito, enferma de vício de preterição de formalidades legais.

    1.3 Na sentença recorrida, a Juíza do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto considerou que a Impugnante «alicerçou a sua pretensão [...] em três tipos de argumentos, a saber: -falta de fundamentação do acto impugnado, falta de fundamentação da decisão da C.R. e preterição de formalidades legais nesta mesma decisão» e enunciou as questões a decidir como sendo as seguintes: «1-falta de fundamentação do acto impugnado; 2-ilegalidade , por preterição de formalidades legais, da decisão da Comissão de Revisão; 3- falta de fundamentação desta mesma decisão».

    Depois, debruçando-se sobre cada uma das consideradas causas de pedir, entendeu a Juíza do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto, em síntese: - quanto à falta de fundamentação, como vício de forma, que a Impugnante «soube "o porquê" da liquidação impugnada - a constatação da inexactidão na contabilização das operações impeditivas do controlo eficaz do resultado obtido e da comprovação directa e exacta da quantificação dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável no exercício em apreço»; - quanto à falta fundamentação substancial, que a AT, para lançar mão dos métodos indiciários, «baseou-se no não correcto procedimento do registo contabilístico dos apuros diários, conforme imposição da al. a), do nº 1, do art. 39º do CIVA - cfr. o art. 84º do CIVA» e «agiu de acordo com o disposto no art. 51º, nº 1, al. d), do CIRC, já que a contabilidade e os resultados líquidos apresentados não traduziam com fidelidade a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido pela aqui impugnante»; - quanto à preterição de formalidades legais na decisão da CR, também a Recorrente não tem razão, dado que, «estando em causa reclamações referentes a exercícios seguidos (92 a 94) da mesma sociedade e reclamante, nada obstava a que aquela entidade decidisse globalmente como fez, analisando, embora, e de forma expressa, cada uma das questões suscitadas pela então reclamante»; assim, «não tem apoio legal a pretensão feita a propósito da necessidade de elaboração de uma acta para cada reclamação», tanto mais que «o exame à escrita abrangeu todos estes exercícios, e, mesmo o bom senso (para além das exigências de economia de meios), justifica uma apreciação em bloco da realidade da empresa».

    Por tudo isto, considerou a Juíza do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto que a liquidação não padecia dos vícios que lhe foram assacados e julgou improcedente a impugnação judicial.

    1.4 A Impugnante recorreu da sentença e o recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

    1.5 A Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões: «1.- A recorrente alicerçou a sua impugnação no exagero da tributação, na violação do .princípio da proporcionalidade e do controle financeiro que sempre foi tido por aquela.

  2. - Provou com os documentos juntos à sua impugnação a falta de verdade da amostragem do Fisco relativamente às vendas de mercadorias.

  3. - Provou o exagero que houve por parte do Fisco nessa sua busca, através de margens de lucro irreais.

  4. - Provou que não era possível, até pela proximidade das grandes superfícies em relação à recorrente - o que é, aliás, do domínio público e não necessitaria de prova.

  5. - Provou, também, testemunhalmente alguns dos preços que eram praticados.

  6. - A recorrente não tem capacidade contributiva para suportar tamanha carga fiscal, sendo, aliás, obrigado a cessar a sua actividade e que vinha apresentando sempre o seu lucro real e cumprindo também sempre com as suas obrigações fiscais, bem como todas as outras suas obrigações.

  7. - Possuía, desde sempre, a recorrente um apertado controle financeiro.

  8. - Elaborava diariamente o seu "Caixa" e mantinha em devida ordem a sua com de [sic] "Depósitos Bancários".

  9. - Provou isso e bem assim que todas as suas vendas eram registadas em globo.

  10. - Assim, todo o seu movimento de vendas estava espelhado no movimento financeiro.

  11. - A ser posto em crise, seria a proporcionalidade entre os tipos de mercadorias vendidas, mas nunca se poderia alterar o volume global de vendas.

  12. - Provou, ainda, que os custos com o curso de inglês e do telefone foram indispensáveis para a realização dos proveitos e, como tal teriam de ser considerados.

  13. - A tributação não seguiu os princípios constitucionais da tributação do lucro real nem da proporcionalidade.

  14. - A recorrente vê-se numa situação de "confiscada" e daí o seu recurso às instâncias .judiciais, únicas que lhe poderão proporcionar a justiça.

  15. - A douta sentença recorrida violou o disposto nos artºs 20º e 23º do CIRC, os princípios da Auditoria e do Plano Oficial de contabilidade, o artº 104º da CRP e os artºs 121º, 142º e 143º do CPT.

    nestes termos e naqueles que v. ex.ªs doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se q douta sentença recorrida, como é de inteira justiça».

    1.6 A Fazenda Pública não contra-alegou.

    1.7 O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, por a sentença ter feito correcto julgamento de facto e de direito.

    Depois de tecer diversos considerandos sobre os métodos de quantificação da matéria tributável, o Procurador-Geral Adjunto concluiu que no caso concreto estão verificados os pressupostos da aplicação dos métodos indiciários e que, embora estes visem «na medida do possível, alcançar e determinar o rendimento real dos contribuintes, é obvio que nem sempre será possível obter com exactidão e certeza desejáveis a quantificação exacta desse rendimento», incumbindo então aos contribuintes «alegar e provar, através dos meios legais admissíveis, a quantificação exacta da matéria colectável ou, pelo menos, produzir prova credível e objectiva que permitisse criar fundada dúvida sobre a existência e quantificação da matéria colectável», o que a Recorrente não fez.

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