Acórdão nº 06595/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Novembro de 2003

Magistrado ResponsávelGomes Correia
Data da Resolução18 de Novembro de 2003
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo: 1.- ANTÓNIO ...., sociedade irregular, com os sinais dos autos, interpõe recurso jurisdicional, para este Tribunal, da sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Tributário da Guarda, que julgou improcedente a presente impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de IRC, referente ao exercício do ano de 1992, no valor global de 18.513.584$00, assim concluindo as suas alegações: São muitos e vários os vícios da Sentença, quer de facto quer de direito.

QUANTO À OMISSÃO DE VENDAS 1. Há uma clara insuficiência na actividade instrutória da AF.

  1. A recorrente não exibiu os contratos promessa, porque não existiram: a este facto não pode ser assacada qualquer desvantagem ou desconfiança, nem sequer a necessidade da sua justificação.

  2. A AF não pode presumir que existiram apenas porque tem "dúvidas", tanto mais quando não o averiguou junto dos clientes.

  3. Não se aplica o art. 51° do CIRC com base numa rentabi-lidade inferior à normal (patenteada por indicadores gerais) ou por discrepância face ao valores de mercado (por Capacidade Contributiva superior à declarada).

  4. Os arts. 87°, al. b) 88°, al. a) a c) , da LGT não são aplicáveis in casu, sob pena de retroactividade da lei fiscal (art. 103°, n° 3, da CRP) e violação das regras de aplicação da lei tributária no tempo (art. 12° da LGT): tais preceitos da LGT aplicam-se apenas a factos posteriores à sua entrada em vigor (1/1/99).

  5. O critério empresarial da fixação do preço é insindicável: essas decisões (inclusive a eventual imperícia de gestão) não legitimam a aplicação do art. 51° do CIRC.

  6. A tributação por métodos indiciários é excepcional e só ocorre nos apertados limites e pressupostos legais: quando existam erros contabilísticos tais que tornem impossível a determinação directa e exacta do rendimento (arts. 51°, n° l, al. d) e 52° n° 2 CIRC). É preciso que deles advenha uma distorção tal, que da sua simples e directa correcção não seja possível o apuramento do rendimento real.

  7. In casu, não existem erros contabilísticos, ou se existiram nunca os mesmos tornam legítima a utilização de métodos indirectos.

  8. Da não contabilização dos custos obra por obra não decorre uma qualquer presunção ou indício de omissão de vendas, mas apenas, quanto muito, o da obtenção de uma baixa rentabilidade e imperícia do órgão de gestão. Mas isso não é um motivo da avaliação indirecta.

  9. Todos os custos foram registados. Simplesmente, foram inseridos numa única rubrica, sem a imputação, obra por obra. Não há custos omitidos. Quanto muito estão mal arrumados. Esse facto nada indica ou indicia quanto a eventuais omissão de vendas.

  10. O não arrolamento das existências não permite o recurso a métodos indirectos para presumir vendas omitidas.

  11. Dessa peça, não imposta por lei, não decorre uma qualquer relação lógica ou causal com omissões de vendas, tanto mais quando a AF conhece o inventário da recorrente. Ela só serve para obter a rentabilidade do negócio: mas este facto é irrelevante para a aplicação de métodos indirectos.

  12. A sentença violou o art. 32° do cpt e art. 39° da lgt: as consequências fiscais ligadas a simulações de preço em documentos autênticos implicam a prévia e necessária obtenção de uma decisão judicial (nos tribunais comuns) a declarar respectiva invalidado (nulidade ou anulabi1idade).

  13. A Fazenda Pública (através do Ministério Público) tem legitimidade processual e interesse em agir (arts. 286° e 287°, do C. Civil); se assim não fosse, os arts. 32° do cpt 39° do lgt seriam letra morta.

  14. A lei fiscal não exclui a aplicação do art. 32° do cpt e art. 39° da lgt nas simulações de preço.

  15. Isso mesmo é confirmado pelo princípio da unidade e coerência lógica do sistema, com vista a preservar a função dos actos notariais, e pelo art. 82° cimsissd.

  16. O art. 32° cpt aplica-se à falsidade do documento au-têntico e à errónea transposição das declarações na escritura pública (p.

    ex.

    simulação quanto ao preço).

  17. A sentença viola, de forma clara e grosseira, o princípio constitucional da reserva de jurisdição (art. 202° da crp) : permite que um órgão administrativo pratique actos judicias ao retirar as consequências fiscais da alegada invalidade de negócios cobertos pela tutela e dignidade de um instrumento notarial, com a arbitrária definição dos valores tidos por reais.

    QUANTO À APLICAÇÃO DO ART. 57° DO CIRC 19. A Sentença viola o art. 57° CIRC e art. 80° CPT: não se preenchem os pressupostos definidos no art. 57° CIRC; a fundamentação não cumpre os requisitos da al. b) e c) do art. 80° LGT. Por isso, o acto tributário é inválido por violação de lei e vício de fundamentação.

  18. Não se prova minimamente que os custos em causa são excessivos e que não competem à recorrente.

  19. A AF - a quem compete o ónus - não explicou nem demonstrou cabalmente a razão de ser da aplicação da percentagem de imputação (50%). É flagrante a irrazoabilidade do preço proposto e os critérios usados com vista ao seu apuramento.

  20. A liquidação viola o n° 4 do art. 57° do CIRC. Não se fez a concomitante e simultânea correcção simétrica na esfera da MM e MEIT.

    TERMOS EM QUE REQUER A REVOGAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA, DETERMINANDO-SE, EM CONSEQUÊNCIA A PROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.

    Não houve contra - alegações.

    O EMMP, em douto parecer, pronunciou-se pela improcedência do recurso.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    *2.- 2.- A sentença recorrida considerou que, resultantes da discussão da causa, são os seguintes os factos a dar como assentes e com interesse com vista à decisão de mérito: 3.1.1. A liquidação impugnada - liquidação oficiosa n.° 8310011529, de 13.05.97 - respeita a I.R.C. do ano de 1992 e juros compensatórios, no montante total de Esc. 18.513.584$00, com data limite de pagamento em 09.07.97 (doc. de fls. 16 e inf. de fls. 41); 3.1.2. Teve origem em acção de fiscalização levada a cabo à escrita do impugnante de que se junta cópia a fls. 1 a 27 do apenso e cujo teor aqui se tem por reproduzido para todos os legais efeitos e de que resultou, além do mais, a alteração do lucro tributável de 2.802.771$00 para 29.813.057$00; 3.1.3. Da fixação da matéria tributável deduziu a impugnante reclamação dirigida ao Sr. Presidente da Comissão Distrital de Revisão da Guarda com o teor do documento de fls. 2 a 4v. do segundo apenso a estes autos e que aqui se tem por reproduzido; 3.1.4. A Comissão Distrital de Revisão reuniu em 20.03.97 conforme acta n.° 40 inserta a fls. 13 a 13 v. do mesmo apenso, também aqui tida por reproduzida, não se tendo sido possível o acordo e tendo as partes lavrado os respectivos laudos (fls. 14 a 15 v.), após o que a comissão deliberou por maioria não dar provimento à reclamação «por se julgarem perfeitamente justificados os critérios e métodos utilizados nos cálculos que conduziram à determinação do lucro tributável do IRC referente ao exercício de 1993, quantificação dos proveitos por falta de elementos contabilísticos, pelo exercício da actividade de "Construção de Edifícios" propostos pelos serviços de Inspecção Tributária por inteira aplicação da portaria n.º 828/88, de 29/*12, que se refere ao preço de construção de habitações sociais», 3.1.5. Da decisão proferida pela Comissão de Revisão foi a impugnante notificada por carta registada com aviso de recepção datada de 25.03.97 e recebida em 26 do mesmo mês (fls. 16 a 17 daquele apenso); 3.1.6. A impugnante foi constituída em 1983 e tinha como objecto a compra e venda de prédios e a construção de casas para venda (facto alegado pela impugnante no artigo 17.° da douta P.I. e reconhecido no ponto 2.2. do relatório de fiscalização); 3.1.7. Os sócios iniciaram esta actividade empresarial numa propriedade rústica que haviam herdado em comum (idem), 3.1.8. Por escritura pública lavrada no dia 31.01.89 no Cartório Notarial de Seia e exarada de fls. ...v. a fls. ...do livro n.° ....-A, o Dr. António ..., e outros, em representação do Estado Português - Ministério das Finanças - Direcção Geral do Património do Estado declarou comprar, pelo preço de três milhões de escudos, o segundo andar direito de um prédio urbano ainda em construção, submetido ao regime de propriedade horizontal pela inscrição número F-..., sito na Avenida Primeiro de Maio, lote ..., Seia, e a que corresponde a fracção autónoma designada pela letra "...", descrita na Conservatória do Registo Predial daquele concelho sob o n.°...-"...", tudo como melhor resulta da certidão de fls. 36 a 39 e cujo teor aqui se tem por reproduzido para todos os legais efeitos; Como factos NÃO PROVADOS considerou o Mº Juiz « a quo» todos os restantes, sendo com interesse os constantes dos artigos 19.° a 28.° e 73° da douta P.I, por absoluta falta de prova.

    * 3. Atenta esta factualidade e aquelas conclusões que delimitam o objecto do recurso vejamos agora a sorte deste em que a questão decidenda se desdobra nas seguintes vertentes, cuja apreciação e decisão prejudica todas as demais que de forma directa ou meramente argumentativa sejam suscitadas: a)- saber se houve ilegalidade na determinação da matéria colectável por não verificação dos pressupostos estabelecidos no artº 51º do CIRC; e b)- saber se ocorrem a comprovação e fundamentação dos pressupostos em que assentaram as correcções operadas nos termos do artº 57º do CIRC.

    Assim: I)- DA ILEGALIDADE NA DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL: Da análise da p.i. vê-se que os recorrentes invocam como fundamento primeiro da impugnação a ilegalidade da imposição de métodos indiciários à situação em apreço por não se verificarem os pressupostos legais, previstos no artº 51º do CIRC ( artºs. 35º a 85º da p.i.).

    Para além de manter aquela posição inicial e como reforço da mesma, sustentam agora os recorrentes que há uma clara insuficiência na actividade instrutória da AF, na medida em que, a recorrente não exibiu os contratos promessa, porque não existiram e a este facto não pode ser assacada...

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