Acórdão nº 7039/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Novembro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução05 de Novembro de 2002
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "A......" (adiante Autora ou Recorrente) veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo (TCA) da sentença proferida no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Aveiro que julgou improcedente a acção para o reconhecimento de um direito por ela deduzida contra o Estado Português na qual formulou o seguinte pedido: - anulação das liquidações de emolumentos notariais (esta na parte em foi efectuada ao abrigo dos arts. 4.º e 5.º da Tabela de Emolumentos Notariais (TEM), anexa ao Decreto-Lei (DL) n.º 397/83, de 2 de Novembro) e registrais que lhe foram efectuadas pela celebração de escritura notarial de alteração do pacto social e pela respectiva inscrição registral, respectivamente, num total de esc. 1.516.510$00; - restituição daquele montante acrescido de juros contados à taxa legal desde a data do pagamento até integral reembolso.

    1.2 Na petição inicial a Autora, alegou diversa matéria no sentido de demonstrar a adequação do meio processual utilizado, a competência do tribunal, a recorribilidade do acto, a tempestividade da acção, a ilegalidade dos actos de liquidação, quer por inconstitucionalidade orgânica e formal, quer por violação de normas comunitárias, terminando com a seguinte conclusão: « 1. A liquidação de emolumentos é nula.

    Na verdade, 2. Foi feita por aplicação de diplomas (cfr. artigo 2.º) que estão feridos de inconstitucionalidade (orgânica e formal) e que violam a Directiva Comunitária 69/335/CEE, artigos 2.º a 12.º e decisões do TJCF.

  2. De inconstitucionalidade porque estabelecem um verdadeiro imposto ou taxa fiscal sem ter havido a necessária autorização legislativa: artigos 106.º n.º 2 e alínea I) do n.º 1 do artigo 168.º (hoje artigos 103.º n.º 2 e alínea I) do n.º 1 do artigo 165.º) da Constituição), (vide artigos 37.º a 60.º).

  3. A violação da Directiva Comunitária e das decisões dos Tribunais da Comunidade atrás exposta é evidente, (cfr. artigos 61.º a 87.º).

  4. Directiva e Decisões dos Tribunais da Comunidade que têm eficácia interna e aplicação directa e imediata (cfr. artigos 77.º a 87.º).

  5. Os Tribunais têm, pois, que as aplicar, e, 7. Se tiverem dúvidas de interpretação, devem pedir ao Tribunal de Justiça para que sobre elas se pronuncie».

    1.3 Na sentença recorrida julgou-se a acção improcedente o fundamento de que não está demonstrado que só com a acção de reconhecimento de direito em matéria tributária. Isto, em síntese, porque aí se considerou que - «Contra um acto de liquidação ilegal teve a autora ao seu dispor o meio de impugnação judicial da liquidação cujo prazo de dedução se encontra há anos esgotado, como resulta do disposto no artº 123º do Código de Processo Tributário»; - «Com esta acção pretende a autora obter o mesmo efeito jurídico que obteria caso tivesse intentado atempadamente as referidas acções de impugnação judicial»; - a acção para reconhecimento de um direito «é uma acção residual uma vez que ela apenas é accionável quando não exista concreta tutela processual do direito»; - «pretende a autora que se reconheça um direito que poderia ter visto reconhecido caso tivesse atempadamente proposta a acção de impugnação judicial já referida» e, não obstante considerar que «os restantes meios contenciosos ao seu dispor não asseguravam a efectiva tutela jurisdicional do direito ou interesse em causa sem concretizar exactamente porque razão entende que a não asseguram», os tribunais «na generalidade dos processos em que foi suscitada a violação da mesma directiva [Directiva 69/355/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969] consideraram que essa violação existiu, anularam a liquidação e determinaram a restituição dos montantes pagos, nos moldes em que a autora peticiona».

    1.4 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

    1.5 A Recorrente alegou e formulou conclusões nos termos seguintes: «1 - O entendimento do ex.mo juiz a quo sobre o carácter residual desta acção esta de todo ultrapassado pela mais recente doutrina e jurisprudência como acima se expôs, já que o cabimento desta acção não depende de haver ou não outros meios contenciosos que assegurem a tutela efectiva do direito ou interesse em causa.

    2 - A regra do art. 69º da LPTA ( semelhante à norma do 165º do CPT ora em análise), não consagra um meio processual residual ou complementar que vigorava até à 2a revisão Constitucional de 8 de Julho de 1998.

    3 - A lei constitucional após aquela data tomou evidente que o art. 69 n.º 2 da LPTA e consequentemente o art. 165 n.º 2 do CPT deverá considera-se inconstitucional.

    4 - Tal sentença viola ainda o princípio constitucional da plenitude da garantia jurisdicional administrativa, ao condicionar desta forma esta acção à adopção de meios específicos de impugnação. A autonomização do direito de acesso à justiça impõe constitucionalmente a institucionalização de acções a título principal e não meramente subsidiário.

    5 - Contraria ainda os princípios de direito comunitário da equivalência e da efectividade.

    Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, substituindo-se e revogando-se a douta sentença do Tribunal a quo por outra que mande fazer seguir os trâmites processuais subsequentes da presente acção».

    1.6 O Ministério Público junto do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Aveiro contra-alegou, sustentando a manutenção da sentença recorrida.

    1.7 Foi dada vista ao Ministério Público junto deste TCA, que emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso.

    Louvando-se no acórdão deste TCA de 14 de Março de 2000, proferido no recurso com o n.º 2.053/99, concluiu que «havendo erro na forma do processo e não tendo havido lugar à rejeição in limine, e não sendo "... a acção de reconhecimento de direito intentada pela recorrente meio processual idóneo para reagir contra a liquidação de emolumentos notariais e registrais..." não sofre a sentença recorrida de qualquer reparo».

    1.8 Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    1.9 A questão sob recurso, suscitada e delimitada pelas conclusões da Recorrente, é a de saber se a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária é ou não meio processual idóneo para pedir a anulação de actos de liquidação de emolumentos notariais e registrais, a restituição dos montantes liquidados e pagos e respectivos juros de mora.

    *** 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 A sentença recorrida, com base nos documentos juntos aos autos, deu como provados os seguintes factos, que ora se reproduzem, sujeitando-os a alíneas: a) No dia 27 de Maio de 1998, por ocasião da celebração de escritura pública de alteração do pacto social, a Autora foi debitada pelo 1.º Cartório Notarial de Aveiro, pela quantia de 758.200$00, correspondente a créscimo de emolumentos sobre inscrições de valor determinado; b) No dia 2 de Junho de 1998, por ocasião do registo da alteração do pacto social, a Autora foi debitada pela Conservatória do Registo Comercial de Santa Maria da Feira, pela quantia de 758.310$00, correspondente a créscimo de emolumentos sobre inscrições de valor determinado; c) Tais montantes foram apurados através da aplicação dos artigos 4.º e 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado, aprovada pelo DL n.º 397/83, de 2 de Novembro, alterada pelas Portarias n.º 378/87, de 5 de Maio, n.º 575/89, de 26 de Julho, e n.º 1046/91, de 12 de Outubro, e pelos arts 1º e 14º da Tabela de Emolumentos do Registo Comercial, aprovada pela Portaria n.º 883/89, de 3 de Outubro, elaborada ao abrigo do art. 6º, n.º 2 do DL n.º 403/86, de 3 de Dezembro , e alterada pelas Portarias n.º 1046/91, de 12 de Outubro, n.º 773/94, de 26 de Agosto, e DL n.º 257/86, de 31 de Dezembro; d) A presente acção foi instaurada em 22 de Novembro de 1998.

    2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR A questão a apreciar e decidir, como ficou já dito, é a de saber se a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária é ou não meio processual idóneo para pedir a anulação de actos de liquidação de emolumentos notariais e registrais, a restituição dos montantes liquidados e pagos e respectivos juros de mora.

    Na verdade, segundo a Recorrente, a tese que vingou na sentença recorrida, de que a acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo tem carácter residual, está ultrapassada desde a 2.ª revisão constitucional, de 8 de Julho de 1998, que determinou a inconstitucionalidade do n.º 2 do art. 165.º do CPT, podendo depois dessa revisão usar-se esta acção a título principal e já não apenas a título subsidiário.

    O entendimento contrário, sempre segundo a Recorrente, viola o princípio da plenitude da garantia jurisdicional administrativa e contraria os princípios do direito comunitário da equivalência e da efectividade.

    Esta questão não é nova, tendo vindo a ser tratada de forma unânime por este TCA, designadamente nos acórdãos proferidos nos recursos com os n.ºs 6777/02, 6778/02 e 7043/02, de 24 de Setembro de 2002, de 29 de Outubro de 2002 e de 15 de Outubro de 2002, respectivamente, por forma que merece o nosso acordo.

    2.2.2 ALGUNS CONSIDERANDOS SOBRE A ACÇÃO PARA O RECONHECIMENTO DE UM DIREITO OU INTERESSE LEGÍTIMO E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 165.º DO CPT A acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo, no âmbito do contencioso tributário, encontrava-se, à data em que foi deduzida a acção, prevista pelo art. 165.º do CPT, coincidente, nas suas linhas gerais, com a mesma acção no âmbito do contencioso administrativo, prevista nos arts. 69.º e 70.º da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos (LPTA), aprovada pelo DL n.º 267/85, de 16 de Julho (() As únicas diferenças relevantes que a acção assume num e noutro contencioso referem-se ao prazo para a sua propositura e à legitimidade passiva. Assim, enquanto no âmbito do contencioso administrativo as acções podem, em princípio, «ser propostas a todo o tempo» e no lado passivo deve surgir «aquele contra quem...

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