Acórdão nº 01066/06 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Março de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelIvone Martins
Data da Resolução14 de Março de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juizes da Secção de Contencioso Tributário (2ª Secção) do Tribunal Central Administrativo do Sul: O Recorrente, inconformado com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures (Lisboa 2) que lhe julgou improcedente o recurso apresentado da decisão do Director Geral dos Impostos, a qual determinou o acesso, junto de qualquer instituição de crédito ou sociedade financeira, a todos os documentos bancários, incluindo os referentes a operações realizadas mediante utilização de cartões de crédito, vem recorrer para este Tribunal, para o que o Recorrente apresenta as seguintes: CONCLUSÕES a) A utilização de fichas de clientes sem autorização dos próprios (por revogada), e sem que outrem lhes pudesse facultar o seu acesso (artigo 79º, n.º 1 do RGICF), configura violação do sigilo bancário que inquina todo o processado e é passível de responsabilização penal, a mais de implicar entendimento inconstitucional daquela norma por violação do princípio da proporcionalidade (artigos 18°, n.° 2, e 266°, n.° 2, da CRP).

b) O questionar de montantes alegadamente provenientes de um negócio de compra e venda de um imóvel, compra essa que não foi questionada, equivale a começar pelo fim e, nessa medida, é violador dos princípios do procedimento tributário (artigo 55° da LGT).

c) A douta sentença recorrida interpretou o artigo 63°-B, n.º 2, al. b) da LGT de modo inconstitucional, por contra legem, ao transformar a exigência legal de forte probabilidade concreta numa mera possibilidade abstracta; d) A douta sentença recorrida equiparou indevidamente a revogação de uma autorização desproporcionada, injustificada e ilimitada a todos os documentos bancários "incluindo os referentes a operações realizadas mediante cartões de crédito" à recusa de exibição dos documentos bancários que fossem solicitados; e) A douta sentença recorrida, ao entender que o despacho de levantamento do sigilo bancário "encontra-se devidamente fundamentado, desde logo ao cingir-se aos rendimentos auferidos pelo recorrente durante o ano de 2001", fez, salvo o devido respeito, uma errada avaliação do teor do despacho e incorreu em confusão entre o que é a fundamentação interna do despacho e a sua projecção externa, não resultando do seu teor qualquer espécie de parâmetro limitativo para a obrigação de as instituições bancárias franquearem o acesso aos registos do visado pelo despacho, o que implica uma interpretação do disposto no artigo 63°-B, n.º 2, al. c) da LGT em desacordo com o princípio constitucional da proporcionalidade consagrado nos artigos 266°, n.º 2, e 18°, n.º 2, da CRP; f) Tal entendimento é ainda contraditório com a necessária identificação de factualidade gravemente indiciadora de falta de veracidade do declarado, que constitui um dos requisitos do processo de levantamento do sigilo bancário (artigo 63°-B, n.º 3, da LGT); g) A douta sentença recorrida, ainda que inocentemente (por não ter conhecimento da actuação paralela da administração fiscal), admitiu a multiplicação do mesmo montante por todos os titulares da conta onde foi depositado e fez corresponder esse montante ao valor da vantagem patrimonial ilegítima de [cada] um dos titulares; h) A douta sentença recorrida, ao admitir a possibilidade de reiterar comportamentos a partir apenas da venda de uma fracção e da constatação de que o prédio onde esta se inseria incluía mais de meia centena de apartamentos, incorreu em erro lógico e violação do disposto no artigo 74°, n.º l, da LGT em matéria de ónus da prova; ao mesmo tempo, ou em alternativa, adoptou dele uma interpretação que é desconforme com o disposto nos artigos 268°, n.º 4, e 266°, n.º 2, da CRP; i) A douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 103°, n.º 2, do RGIT, ao admitir a multiplicação dos infractores e ao não admitir a divisão dos montantes que poderiam traduzir o valor da vantagem patrimonial ilegítima que para cada um poderia decorrer; um tal entendimento da norma torna-o inconstitucional por violação do disposto no artigo 112°, n. °6 e 203° da CRP; j) As normas do artigo 63°-B, n.º 2, al. c), da LGT são inconstitucionais se entendidas, como o foram, no sentido de que o despacho que autoriza o levantamento do sigilo bancário pode ser, nos seus termos, incondicionado, ilimitado no tempo e universal (todas as receitas e todas as despesas, incluindo cartões de crédito), ou fique dependente, na sua delimitação posterior, da intervenção de outras entidades (por violação dos artigos 26°, 2°, 9°, al. b), artigo 18°, n.º 2, e artigo 266°, n.º 2, da CRP).

Nestes termos, e nos mais de direito, deve a sentença recorrida ser substituída por outra que anule o despacho de 13 de Julho de 2005 do Director Geral dos Impostos.

O Recorrido, Director-Geral dos Impostos, contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: 1) A douta sentença recorrida ao decidir não conceder provimento ao recurso, analisou correctamente a questão a decidir e fez uma correcta interpretação e apreciação da matéria probatória constante dos autos, não enfermando por isso de erro de julgamento, motivo pelo qual deverá ser mantida.

2) Assim, deverá ser dada razão ao douto Tribunal "a quo", quando considera que o acto do Director-Geral dos Impostos que autorizou o acesso da administração tributária à documentação bancária do contribuinte, não está ferido de invalidade pelo facto de a Administração não ter utilizado elementos bancários aos quais não poderia ter acedido.

3) E isto porque os dados aqui em causa, são dados que o adquirente da fracção pôde legitimamente disponibilizar porque respeitam a dois documentos bancários cujo titular é o BES e emitidos a seu favor, ainda que posteriormente endossados e depositados em contas de terceiros. Logo, o seu acesso não depende sequer de autorização do recorrente, uma vez que são documentos titulados por outrem que não ele.

4) Pelo que, se a entidade bancária entendeu disponibilizar esta informação, fê-lo porque esta ainda se encontra no âmbito da autorização de consulta dada pelos adquirentes da fracção, uma vez que a identificação dos destinatários do montante dos cheques que titularam a transacção, faz ainda parte da movimentação dos montantes provenientes das suas contas bancárias.

5) A violação de sigilo bancário, que manifestamente não ocorreu no presente caso, se configura um comportamento ilícito por parte dos seus responsáveis, este, quando existe, apenas é sindicável em processo-crime autónomo, não determinando por isso nem a nulidade do procedimento inspectivo, nem do subsequente procedimento de derrogação de sigilo bancário.

6) Não se verifica também a inconstitucionalidade do art°63°-B da LGT, pelo facto de, como bem apontou a sentença recorrida, as conclusões do recorrente serem genéricas, sem suporte factual concretizado, limitando-se a remeter para os artigos 18°, 22°e 26° da CRP, preceitos que aliás sempre permitiriam compressão perante outros valores constitucionais que em seu contraponto se erigem, conquanto não desproporcionados.

7) Resulta também preenchida a condição prévia à aplicação da alínea c) do n°2 do art°63°-B da LGTA, ao contrário do que afirma o recorrente, uma vez que estamos manifestamente em presença de uma situação de recusa de exibição daqueles documentos ou de autorização para a sua consulta, consubstanciada na revogação da autorização inicialmente concedida.

8) Como refere o Acórdão do STA de 16/02/2005 proferido no recurso n° 35/2005, é fundamento do acesso directo da administração tributária à documentação bancária do contribuinte não só a recusa da sua exibição, mas também a falta de autorização deste para a sua consulta.

São pois irrelevantes, como já se disse anteriormente, os motivos pelos quais o recorrente vem recusar o acesso, porque ainda que a recusa seja legitima, o segredo bancário não é um direito absoluto.

9) Tal como decidiu também a sentença recorrida, o acto de derrogação de sigilo bancário não carece da fundamentação legalmente exigida pelo art°63°-B n°2 alínea c) da LGT no tocante à existência de indícios da prática de crime doloso, previsto no art°103° do RGIT e à verificação da condição de punibilidade quanto à vantagem patrimonial de valor superior a €7500.

10) De facto, conclui-se pela existência de fortes indícios de omissão de valores declarados na escritura de compra e venda da fracção autónoma em causa, praticada em benefício de todos os intervenientes que, assim, actuaram conluiados, traduzindo-se esse benefício em vantagens patrimoniais indevidas em sede de IRS, de IRC e de sisa para o adquirente.

11) Só através da actuação do recorrente, ainda que em conluio com terceiros e na qualidade de sócio-gerente da firma, foi possível ao mesmo tempo, auferir um lucro individual de montante não identificado e não tributado (em sede de IRS), diminuir a matéria tributável da sociedade vendedora cujos corpos sociais integra (em sede de IRC) e permitir ao mesmo tempo, através de um esquema facilitador, que o adquirente da fracção visse diminuído o montante de imposto a pagar sobre a transacção do imóvel (em sede de SISA).

12) E ainda quanto aos indícios de prática de crime fiscal, não podemos concordar com a alegação do recorrente de que o cheque apenas se poderá considerar em 1/4 do seu valor, porquanto não foi por aquele aduzido qualquer elemento ou facto concreto que permita concluir que essa seria a percentagem do seu ganho ou vantagem patrimonial em detrimento de qualquer outra, não perdendo de vista que o seu valor absoluto se cifra em €39.405,03, facto este indubitavelmente provado.

13) Na verdade não se sabe, porque estamos na presença de meros indícios, qual foi o destino final do montante de €7.900.000$00/€39.405,03 e como já se sublinhou, este montante poderá constituir tanto lucro da empresa vendedora, no valor total de €39.405,03, portanto superior a €7.500, como poderá ter tido como destino as contas individuais dos sócios, não se sabendo em que medida nem em que montante...

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