Acórdão nº 01582/99 de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução11 de Outubro de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 J... (adiante Contribuinte ou Recorrente) recorreu contenciosamente para o Tribunal Administrativo do Círculo (TAC) de Lisboa indicando como actos recorridos: a) o acto (despacho) praticado pelo Director das Alfândegas de Lisboa (adiante Entidade Recorrida), que revogou anterior despacho que, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 467/88, de 16 de Dezembro, reconhecera ao Recorrente, na qualidade de emigrante num país da Comunidade Europeia que transferira a residência para Portugal, isenção de Imposto Automóvel (IA) e de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) na importação de um veículo automóvel, revogação que teve como fundamento que «em apoio do pedido de benefício foi apresentado um certificado de cancelamento de residência falso» (1); b) a consequente liquidação daqueles impostos, bem como de juros compensatórios de IVA, do montante global de esc. 6.126.213$00; c) o «indeferimento tácito em recurso hierárquico apresentado em 09.05.96, que até agora não mereceu decisão».

O Recorrente pediu a anulação dos actos recorridos mediante a alegação que ele mesmo sintetizou nos seguintes termos: «I.- Revogado o despacho inicial, que concedia ao recorrente isenção de IA e IVA na importação do veículo automóvel identificado, por um outro que a não concedia em virtude de falsidade do documento de cancelamento de residência em França, II.- E apresentado recurso hierárquico, sem resposta até hoje desse despacho revogatório, III.- Tem de dizer-se que a falsidade daquele documento - que o recorrente corrobora - não era bastante para fundamentar a revogação do despacho inicial.

  1. Com efeito, para além da fixação da residência em Portugal estar demonstrada e de a saída de França estar igualmente comprovada.

  2. Não foram levadas a cabo todas as diligências probatórias necessárias e justificadas para se aquilatar da verdade da transferência de residência.

  3. Tão pouco se concedeu ao recorrente a possibilidade de pôr em crise a alegada falsidade do documento de Thones (se o fosse) ou de explicar a sua proveniência ou de fazer prova da verdadeira residência que teve e deixou de ter em França.

  4. Até porque não é, só por si, a falsidade do documento de cancelamento da residência, junto aos autos, que impede a concessão do benefício fiscal, até porque nenhuma correspondência faz ele com a realidade, já que o recorrente nunca ali residiu, mas residiu sempre noutro local, sendo aquele documento um corpo estranho no processo, ali introduzido em momento e por pessoa desconhecidos.

Portanto, • o despacho (revogatório) recorrido enferma de ilegalidade, violando concretamente o disposto no DL. 467/88 e mais exactamente o seu art. 7º e violando igualmente o princípio do contraditório, que impediu ao recorrente fazer prova de que não lhe é imputável a junção aos autos de um documento, que ele próprio considera falso e, assim, de fazer prova de que a realidade dos factos era diferente e que havia outro documento que a comprovava».

1.2 O TAC de Lisboa julgou-se incompetente em razão da matéria para conhecer do recurso e julgou competente para o efeito o Tribunal Central Administrativo (TCA), ao qual remeteu os autos.

1.3 A Entidade recorrida remeteu a este TCA o processo administrativo e respondeu ao recurso.

Começou por salientar que o despacho que concedera ao Recorrente a isenção de direitos na importação do veículo automóvel na qualidade de emigrante que transferira a residência para Portugal foi revogado por, na sequência de averiguações a cargo do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, se ter concluído que o atestado apresentado para comprovar que deixara de residir em França era falso.

Depois, invocou a intempestividade do recurso, por o despacho recorrido ter sido notificado ao ora Recorrente em Abril de 1996 (2).

Mais invocou a Entidade recorrida que, em virtude de as averiguações efectuadas pelo DIAP de Lisboa terem permitido concluir que o veículo em causa fôra adquirido por esc. 2.000.000$00 e não por esc. 900.000$00, valor este que foi o declarado no acto de importação, houve que proceder «a um novo cálculo do montante do imposto devido». Esta nova liquidação substituiu a anterior, que deixou de existir na ordem jurídica, «O que determina a inutilidade superveniente da lide».

1.4 O Recorrente foi notificado do teor da resposta.

1.5 Notificadas as partes para alegarem, só o Recorrente o veio fazer, nos seguintes termos: « A. A questão principal que se coloca nos autos traduz-se nisto: Foi junto ao processo de isenção de I.A. um documento no qual se faz constar que o recorrente deixou de residir em Ville de Thones (França) em 10.04.91, o qual se verificou ser falso, no que o recorrente esteve sempre de acordo, pois que nunca residiu naquela localidade francesa, mas em Villecresnes e não foi ele, como sempre disse, que introduziu tal documento do processo.

B. De facto, o recorrente desconhece em absoluto da razão por que tal documento falso apareceu junto aos autos, porquanto ele próprio entregara à Agência Automobilística do Sul, Lda um documento emitido pela Mairie de Villecresnes, junto aos autos, e não aquele de Ville de Thones, constando do que entregou, datado de 21.09.90, que ele já não residia ali há vários anos, o que era confirmado por outro documento emitido pela Junta de Freguesia onde fixou residência em Portugal em 1991, que igualmente juntou.

C. Isto é, com esses dois documentos se comprova que o recorrente deixou de ser emigrante e fixou residência definitiva em Portugal, factos que lhe permitem a isenção de IA D. Não sabendo como foi o outro documento (falso) introduzido no processo em vez do documento verdadeiro, o recorrente requereu diligências probatórias, que não estão ao seu alcance, que não foram realizadas.

E. Não lhe sendo imputável a existência daquele documento falso, questão que, aliás, se esgrime em processo crime identificado nos autos e não se tendo realizado, sem culpa sua, as diligências probatórias, que por si não pode realizar, mantém-se o seu direito à isenção de I.A. na importação daquele veículo automóvel.

F. Não tendo sido feitas as diligências de prova requeridas e imputando-se sem mais ao recorrente a falsidade de um documento que não foi introduzido por ele no processo (foi requerida [sic] que se ouvisse a esse propósito da [sic] Agência Automobilística do Sul, Lda e o despachante oficial identificado nos autos), a decisão recorrida violou o art. 660º do CPC e os arts. 356º e 368º do Cód. Civil e, consequentemente, violou também o DL. 467/88.

pelo exposto Pede que seja revogada a decisão recorrida, substituindo-se por uma outra que conceda a isenção de I.A. na importação do veículo automóvel identificado nos autos ou que, pelo menos, ordene a realização das diligências de prova requeridas pelo recorrente»(3).

1.6 Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu parecer do seguinte teor: «O que está em causa nestes autos é o despacho que revogou a concessão da isenção e se encontra transcrito a fls. 5.

Tal despacho foi notificado ao recorrente por carta registada com aviso de recepção em 8 de Abril de 1996 (fls. 58 do processo apenso).

O presente recurso só foi apresentado em 2 de Abril de 1997 (fls. 2).

Tem razão, pois, a entidade recorrida ao referir que o recurso foi apresentado fora do prazo, já que se encontrava largamente ultrapassado o estipulado no art. 28 da LPTA.

*De qualquer forma, ainda que assim não se entendesse, não teria razão o recorrente.

Com efeito, tendo sido apresentado documento falso para prova da sua saída de França, não havia sido apresentado outro documento verdadeiro, em sua substituição, até à data da prolação do despacho impugnado.

Somos, pois, de parecer que não se deve tomar conhecimento do recurso por sua ilegal interposição, ou, não se entendendo assim, julgar-se o recurso improcedente».

1.7 O Recorrente foi notificado do teor do parecer do Ministério Público e para, querendo, se pronunciar sobre a questão da intempestividade do recurso, o que não fez.

1.8 Colheram-se os vistos dos Juízes adjuntos.

1.9 Cumpre apreciar e decidir, sendo que as questões suscitadas no processo são, como procuraremos demonstrar, as seguintes: - primeira, definição do objecto do recurso, - segunda, admissibilidade do recurso, - terceira, legalidade do despacho recorrido.

* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Com interesse para a decisão a proferir e com base nos elementos expressamente referidos a seguir a cada uma das alíneas, damos como assente a seguinte factualidade: a) Em 19 de Junho de 1991, J... fez dar entrada na Alfândega de Lisboa um requerimento, dirigido ao Director da Alfândega, pedindo a importação definitiva de um veículo automóvel de sua propriedade, «nos termos do Decreto-Lei 467/88 de 16 de Dezembro» (cfr. cópia do requerimento a fls. 29 do processo administrativo em apenso); b) Com esse requerimento foram apresentados diversos documentos, entre os quais: 1. um certificado de cessação de residência do qual consta como entidade emitente a "Mairie de Thones" e uma assinatura nele atribuída ao Maire daquela edilidade; 2. uma declaração subscrita pelo requerente, de que adquirira o veículo em causa usado e pelo preço de esc. 900.000$00 (cfr...

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