Acórdão nº 01300/04.6BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | Dr. Carlos Lu |
Data da Resolução | 09 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, inconformada veio interpor recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Viseu, datado de 10/03/2005, que julgou procedente a acção administrativa especial contra a mesma deduzido pelo S… – SINDICATO …, devidamente identificado nos autos, e consequentemente a condenou “(…) a deferir o pedido de aposentação antecipada formulado pelo A. considerando que os requisitos de inexistência de prejuízo para o serviço e de 36 anos de serviço (conforme fls. 41) se encontram preenchidos, nos estritos termos do Dec.-Lei n.º 116/85.
(…)”.
Formula, nas respectivas alegações (fls. 69 e segs.
), conclusões nos termos seguintes: “(…) A. A douta sentença recorrida violou o disposto no n.º 4 do art. 91º do CPTA, uma vez que o Autor, na sua p.i., não renunciou à apresentação de alegações escritas e, consequentemente, nos termos do referido normativo, deveriam ter sido “...notificados o autor, pelo prazo de 20 dias, e depois, simultaneamente, a entidade demandada (...), por igual prazo, para, querendo, as apresentarem”.
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O Sindicato … é parte ilegítima nos presentes autos, uma vez que aquela associação sindical veio intentar a presente acção em nome e representação do seu associado, José Leite de Sousa.
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De facto, a defesa de interesses do foro individual não cabe às associações sindicais enquanto entidades representativas dos trabalhadores, com a finalidade de promover e defender os respectivos interesses sócio-profissionais, sendo certo que, nos casos em que é de reconhecer legitimidade processual aos sindicatos – art. 4.º/3 do DL n.º 84/99, de 19.03, impõe-se que a intervenção processual se faça em nome próprio.
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Acresce que, tendo o referido sindicato sede na cidade de Lisboa, nos termos do disposto no art. 16º do CPTA, devidamente conjugado com o mapa anexo ao Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, o Tribunal territorialmente competente para conhecer da presente acção seria Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, por ser o da sede do Autor e não o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.
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O Decreto-Lei n.º 116/85, de 19/04, previa um regime excepcional de aposentação antecipada que se inseria num quadro de medidas de descongestionamento selectivo do quadro da Administração Pública, visando-se diminuir gradualmente o número de efectivos da função pública, redimensionando os seus quadros, ao permitir aos seus funcionários e agentes a aposentação com 36 anos de serviço completos, desde que não existisse prejuízo para o serviço – cfr. art. 1º, n.º 1.
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Tais requisitos eram cumulativos, não existindo uma relação de prevalência de um requisito sobre o outro.
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Na verdade, muito embora um funcionário com 36 anos de serviço completos pudesse ter a expectativa de ser aposentado ao abrigo desta legislação, sempre faltaria a declaração de inexistência de prejuízo para o serviço emitida pela entidade competente para a proferir.
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Ora, apesar de a inexistência de prejuízo para o serviço não se encontrar concretizada na letra do Decreto-lei n.º 116/85, ela devia, no contexto do próprio diploma, ser interpretada pelos órgãos competentes para proferir tal despacho, no sentido de o funcionário poder aposentar-se por ser dispensável, isto é, por o serviço poder continuar a funcionar normalmente sem necessidade de contratar novo funcionário para ocupar o lugar do que se aposentou, indo assim de encontro à finalidade deste diploma – o redimensionamento e, concomitantemente, o rejuvenescimento da administração pública.
I. Por essa razão, o Decreto-lei n.º 116/85, sempre exigiu para a sua aplicação, que os serviços dos interessados informassem da inexistência do prejuízo para o serviço, submetendo, de seguida essa informação a despacho do membro do Governo competente (ou de quem para tal tivesse competências delegadas), o qual, concordando, determinava o seu envio à CGA – cfr. art. 3º, n.º 2.
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Por meio do Despacho n.º 867/03/MEF, de 2003-08-05, o membro do Governo competente, no exercício de um poder que lhe assiste, definiu previamente, em termos genéricos e abstractos, em que sentido deve ser aplicado o mencionado Decreto-Lei n.º 116/85.
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As orientações administrativas genéricas contidas no Despacho n.º 867/03/MEF, não operam qualquer interpretação autêntica do conteúdo do Decreto-Lei n.º 116/85, nem determinam o esvaziamento da discricionariedade administrativa, cujo exercício pelo «departamento» competente é, aliás, imposto pelo art. 3º, n.º 2 do referido diploma, ao fazer depender a autorização da aposentação, pelo serviço, do preenchimento do conceito de «inexistência de prejuízo para o serviço».
L. O princípio da autonomia das autarquias locais foi constitucionalmente consagrado em função das atribuições que lhe foram legalmente cometidas, ou seja, a “prossecução dos interesses próprios das populações respectivas” – cfr. n.º 2 do artigo 235º da Constituição da República Portuguesa (CRP).
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A fim de concretizar o princípio da autonomia das autarquias, o legislador concedeu-lhes liberdade de autodeterminação ou auto governo na condução da sua vida política, dotando-as de órgãos próprios, de património e finanças próprias, de poder regulamentar e de um quadro de pessoal próprio.
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A gestão deste quadro de pessoal cabe, nos termos do artigo 68º, n.º 2, da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, ao Presidente da Câmara. Porém, a gestão do quadro de pessoal da autarquia tem necessariamente de ter em conta o regime jurídico que lhes é aplicável.
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O regime jurídico do pessoal das autarquias é o mesmo dos funcionários e agentes da administração pública, o que significa que se regem pelos mesmos critérios legais, desde o recrutamento, passando pela progressão nas carreiras, remunerações, estatuto disciplinar até ao estatuto da aposentação.
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Ou seja, a competência prevista no aludido artigo 68º, n.º 2, da Lei n.º 169/99, está legalmente balizada, estando a sua actuação ao nível da aposentação dos funcionários autárquicos no que respeita à matéria de aposentação subordinada ao Estatuto da Aposentação e à sua legislação avulsa, como o Decreto-Lei n.º 116/85.
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Assim sendo, a autonomia do poder local não é invocável no âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19/04, desde logo, porque o despacho final sobre a não existência de prejuízo para o serviço com a aposentação gera – objectivamente – encargos para o regime da CGA, e depois, porque o regime de protecção social dos funcionários públicos em matéria de pensões é sustentado financeiramente (em proporção que ultrapassa já os 60% - cfr. relatório e contas da CGA em www.cga.pt) pelo Estado (artigo 139º do Estatuto da Aposentação, aprovado pelo Decreto-lei n.º 498/72, de 9/12) e não pelas autarquias locais, sendo essa a razão de ser o membro do Governo (o das Finanças - é pelo orçamento de despesas deste Ministério que são pagas as pensões) a ter a última palavra nesta matéria.
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Ora o Despacho n.º 867/03/MEF, de 5 de Agosto, veio estabelecer apenas, uniformemente, para toda a administração pública, em termos gerais e abstractos, a forma que deve revestir a fundamentação da declaração de inexistência de prejuízo para o serviço, que a CGA deverá exigir sempre que proceda à apreciação de pedidos de aposentação ao abrigo do Decreto-Lei n.º 116/85 (devendo dizer-se que houve centenas de pedidos de aposentação de funcionários camarários, previamente informados nos termos do aludido Despacho Ministerial, que foram deferidos).
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Por outras palavras, o Despacho n.º 867/03/MEF, limita-se, dentro dos parâmetros legais caracterizados pelo conceito de inexistência de prejuízo para o serviço, consignado no artigo 1º do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, a obrigar os autores daquela declaração a abandonarem a prática – então corrente, mas inadmissível – de não fundamentarem os actos que na matéria praticavam.
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No presente processo não consta qualquer declaração do seu dirigente máximo que fundamente a inexistência de prejuízo para o serviço.
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Por essa razão, não podia esta Caixa apreciar o pedido de aposentação formulado nos termos do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril.
V. Motivo pelo qual o pedido foi primeiramente devolvido pelos serviços da CGA ao Serviço do Autor e que, posteriormente, originou o despacho da Direcção da Caixa Geral de Aposentações, proferido em 2004-07-15, ao abrigo da delegação de poderes do Conselho de Administração, publicada no Diário da República, II Série, n.º 126, de 2004-05-29, que indeferiu a sua pretensão.
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Ao considerar justificada a ausência de prejuízo para o serviço, para os efeitos da tramitação estabelecida do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, violou a douta decisão recorrida os artigos 1º, n.º 1, e 3º, n.º 2, daquele articulado.
X. Por fim, refira-se que a douta decisão do Tribunal a quo, na parte em que condenou a CGA a deferir o pedido de aposentação de J…, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, violou o disposto no n.º 3 do art. 95º, o qual prescreve que “...o tribunal não pode determinar o conteúdo da conduta a adoptar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração Y. De facto, a sentença recorrida não limitou a condenação da CGA à apreciação do pedido formulado pelo impetrante. Nesta matéria o Tribunal foi mais longe, ao condenar a Caixa a deferir efectivamente aquele pedido, substituindo-se, assim, à Administração no que concerne ao exercício da sua função administrativa.
(…).” Conclui no sentido do provimento do recurso jurisdicional e revogação da decisão recorrida com as legais consequências.
O aqui ora recorrido apresentou contra-alegações (cfr. fls. 86 e segs.
), nas quais, em suma, pugna pela manutenção do julgado.
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do improvimento do recurso jurisdicional (cfr. fls. 112 a 115), o qual uma vez notificado às partes mereceu resposta por parte da aqui ora recorrente na qual...
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