Acórdão nº 06779/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução04 de Novembro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

A... AB, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. O artigo 128.° do CPTA, nomeadamente o seu número 4, não estipula que, as requerentes de providências cautelares apenas possam atacar a razoabilidade de uma Resolução Fundamentada em sede de incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida.

  1. O nº 3 do artigo 128º do CPTA prevê expressamente a possibilidade do Tribunal julgar improcedentes as razões em que se fundamenta a resolução, sem impor qualquer momento processual para a emissão de tal julgamento.

  2. A Resolução Fundamentada emitida no quadro destes autos deverá ser considerada improcedente, pois não identifica, em concreto, os danos decorrentes da não execução dos actos em causa nesta providência cautelar durante o tempo provável de duração da providência, não procede a uma criteriosa avaliação da sua importância e gravidade e, finalmente, não os compara com aqueles que essa execução iria provocar, tendo em conta os direitos e interesses legítimos de terceiros, no quadro dos princípios da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos e da proporcionalidade, estabelecidos nos art°s 4° e 5° do Código do Procedimento Administrativo.

  3. Ao ignorar o invocado pela Recorrente, e ao não apreciar as razões em que assenta a resolução fundamentada, julgando improcedente o incidente, o Tribunal a quo violou o artigo 128.° do CPTA, porquanto o aplicou erradamente aos presentes autos.

  4. A ora Recorrente não fundou esta acção numa alegação de que o acto de concessão de AIM suspendendo ou o de aprovação de PVP que se visa prevenir, violam, per se, os seus direitos de propriedade industrial mas na circunstância de que o acto de concessão de AIM em causa violou o dever do Estado de não conceder autorizações ou licenças administrativas para a prática, por terceiros, de actividades que violem a esfera do exclusivo consagrado por essa patente.

  5. A motivação de protecção dos direitos propriedade industrial da Recorrente ameaçados pela actividade licenciada pelo Infarmed e a licenciar pela DGAE, não pode confundir-se com a pretensão formulada nestes autos e na acção principal, motivação essa que apenas poderá ser importante para a determinação da existência de interesse em agir da Recorrente, ao tomar a iniciativa de propor esse procedimento e essa acção 7. A Recorrente não alegou que o Infarmed, ao conceder a AIM à Contra-Interessada ora Recorrida (ou que a DGAE ao aprovar o PVP), tivesse visado uma finalidade diferente daquela para a qual a lei lhe conferiu o poder de dar autorizações de introdução de medicamentos no mercado (ou o poder de aprovação de PVP; no caso da DGAE) e, por isso, não alegou que tal acto (ou o acto de aprovação de PVP) sofresse de vício de desvio de poder.

  6. A ora Recorrente alegou no artigo 82 do requerimento inicial que os genéricos de Zolmitriptano a ser comercializados pela Contra-Interessada são fabricados pelo processo protegido pela PT 97 888 e esse facto não foi impugnado por nenhum dos Requeridos nem pela Contra-Interessada.

  7. Tal facto deve pois ser considerado como provado por este Tribunal, incluindo-se assim na matéria de facto provada, deste modo ampliada.

  8. A tutela dos direitos de propriedade industrial faz-se pelo meio processual mais adequado e mais eficaz e perante os tribunais que possam assegurar, no domínio da sua jurisdição e competência, tal tutela, com maior eficácia e rapidez, não estando adstrita aos tribunais de comércio.

  9. A protecção dos direitos de patente, enquanto direitos fundamentais, tal como de quaisquer outros direitos dos particulares, é hoje assegurada por uma tutela judicial plena no âmbito da jurisdição administrativa, cujos tribunais são competentes sempre que e na medida em que estejam em causa relações jurídicas de direito administrativo.

  10. Se, para o julgamento deste caso, o Tribunal tiver que, incidentalmente, conhecer de questões jurídicas prejudiciais que englobem o escrutínio de direitos emergentes de patentes, como ocorre neste caso, ele terá poderes para o fazer, de acordo com o "princípio da paridade" que determina o regime da organização judiciária.

  11. A autorização administrativa para a introdução no mercado de um medicamento é causa adequada dos danos produzidos por essa introdução, uma vez que ela é condição desses danos actuando adequadamente para que se produzam.

  12. Uma AIM (ou a aprovação de um PVP) concedida a um produto cuja comercialização irá violar uma patente é um acto ilegal e, consequentemente, deve ser reconhecido que esse acto não deveria ter sido emitido nessas circunstâncias, caso o Infarmed (ou o MEI/DGAE) estivesse ciente das mesmas, ou que o mesmo deverá ser invalidado pelo Tribunal, caso a AIM já tenha sido concedida pelo Infarmed.

  13. Nestes autos não se sindica a legalidade da conduta procedimental do Infarmed ou da DGAE mas a ilicitude intrínseca do acto praticado pelo Infarmed e do acto a praticar pela DGAE e, neste contexto, é totalmente indiferente para a decisão da causa que a Recorrente tenha ou não tenha intervindo nos procedimentos administrativos em causa.

  14. A autorização administrativa para a introdução no mercado de um medicamento é causa adequada dos danos produzidos por essa introdução, uma vez que ela é condição desses danos actuando adequadamente para que se produzam.

  15. A primordial missão da providência cautelar não é a evitar que se produzam prejuízos de difícil reparação; é a de garantir a utilidade efectiva da sentença a proferir na acção principal, em linha com o claro dispositivo do n°l do art° 112° n°l do CPTA.

  16. 18. No caso dos autos, se for recusada a protecção provisória dos direitos da Recorrente ora em causa, a decisão na acção principal tornar-se-á absolutamente inútil porque a Contra-Interessada terá o caminho livre para o lançamento no mercado dos seus produtos violadores da patente da Recorrente, destruindo o exclusivo dela decorrente.

  17. Uma sentença na acção principal que decrete a nulidade da AIM para os medicamentos em causa nestes autos, apesar do seu efeito retroactivo não terá qualquer utilidade prática, uma vez que o exclusivo de que a Recorrente beneficia já terá caducado muito antes da prolação da decisão, não sendo capaz de reintegrar os direitos exclusivos já caducos.

  18. Se, durante o período em que durar a acção principal, esses medicamentos forem comercializados, será a Recorrente amputada do gozo do direito ao exclusivo de exploração da invenção que a Patente e o CCP lhe confere, deixando, assim, de usar e fruir do seu direito de propriedade relativo ao dito invento, o que constitui dano imaterial considerável e de impossível reparação.

  19. Impõe-se assim, em consonância com a jurisprudência quase unânime, reconhecer que, no presente caso, encontra-se bem justificado o requisito do periculum in mora.

  20. Fora das circunstâncias previstas no art° 110° n°s 2 e 3 do Código da Propriedade Industrial, o interesse público não pode sobrepor-se aos direitos de propriedade industrial, anulando-os ou limitando o seu escopo protector.

  21. No contexto da ponderação de interesses a que reporta o n°2 do art°120° do CPTA, o que interessaria nos termos da lei, seria averiguar de um eventual desequilíbrio entre os danos causados à parte pública e à Contra-Interessada pelo decretamento da providência, em relação àqueles que se verificariam para a ora Recorrente se a mesma não fosse decretada.

  22. Nem o Infarmed nem a Contra-Interessada procederam à indicação de quais sejam os danos que sofrerão se a providência for decretada, nem informaram como seriam eles quantificados.

  23. Quando está em causa o fundado receio de lesão ilegal de um direito fundamental do particular, o Tribunal deverá, na dúvida, decretar a providência cautelar, concedendo, assim, prioridade ao direito fundamental do particular sobre a prossecução do interesse público.

  24. Esta providência não se destina a suspender o processo de concessão de AIM ou a inutilizá-lo, mas, tão somente, a suspender a eficácia desse acto administrativo, enquanto a patente estiver em vigor. Caducada a Patente e o correspondente CCP, caduca a suspensão da AIM, não havendo, pois, que reiniciar qualquer processo de concessão de AIM, seja ele moroso ou rápido.

  25. Nada justificaria que o tribunal viabilizasse a realização do desiderato do Infarmed e da Contra-Interessada, ou seja, o lançamento no mercado do medicamento violador da Patente e do CCP da Recorrente 4 anos antes da caducidade desses Patente e CCP.

  26. A providência requerida deve ser decretada porque se verificam todos os pressupostos legais para o seu decretamento.

  27. A douta decisão recorrida violou e fez má interpretação de diversos normativos legais, entre eles se contando os art.°s 98.°, 101° e 32° n°4 e 316° do CPI, art°s 3°, 8°, 112 n°l e 120 n°l b) e c) do CPTA, o art° 563° do Código Civil, o art° 133 n°2 c) e d) do Código de Procedimento Administrativo e os art°s 17°, 18°, 62° e 266° da Constituição.

  28. Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente ser 1. Revogado o douto despacho recorrido que indeferiu a impugnação da Resolução Fundamentada emitida pelo Infarmed e substituído por decisão que considere improcedentes as razões em que se fundamenta a mesma Resolução Fundamentada; 2. A matéria de facto ampliada por forma a ser incluído entre os factos provados o de que "o Zolmitriptano usado nos produtos da Contra-lnteressada é preparado pelo processo de fabrico reivindicado na PT 97888"; 3. Revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que ordene as providências requeridas nos termos pedidos pela ora Recorrente no requerimento inicial, assim se fazendo JUSTIÇA! * A contra-interessada B...Unipessoal, Lda. contra-alegou, concluindo como segue: 1. O Juiz do tribunal "a quo" ao decidir conforme fez, decidiu bem, pois a Recorrente não logrou provar que se...

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