Acórdão nº 05063/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução23 de Setembro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

A...– Parque Temático de Diversões, Lda., com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. A decisão do Tribunal a quo, de 9 de Fevereiro de 2009, de admitir as substituições de duas das testemunhas arroladas na oposição do Requerido, deve ser revogada, com as legais consequências, por violação da alínea g) do n.° 2 do artigo 114.° e dos n.° 2 e 4 do artigo 118.°, ambos do CPTA, e ainda, subsidiariamente, por violação do artigo 629.° do CPC.

  1. Uma vez que o Tribunal a quo não apreciou o pedido de decretamento provisório das providências cautelares requeridas, verifica-se uma situação de omissão de pronúncia, o que inquina a Sentença sub judice de nulidade nos termos da alínea d) do n.° l do artigo 668.° do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.° do CPTA.

  2. No que respeita à verificação dos requisitos de que dependia a concessão das providências cautelares requeridas ao abrigo da alínea a) do n.° l do artigo 120.° do CPTA, a decisão ora recorrida padece de manifesta falta de fundamento, sendo em alguns casos ininteligível ou acrílico o juízo formulado pelo Tribunal a quo: a. No âmbito da apreciação da violação do conteúdo essencial do direito à propriedade privada, dificilmente se concebe que a invasão das instalações dadas em superfície à recorrente não seja considerada uma violação do direito de propriedade pelo facto de o invasor permitir que o invadido continue a entrar nas mesmas.

    b. O Tribunal recorrido não logrou perceber que a questão da violação do conteúdo essencial do direito à propriedade privada tem directamente que ver com uma ordem de invasão dirigida a um terreno que está legitimamente na posse de um particular ao abrigo de um direito de superfície - e não com o facto de a recorrente poder ou não continuar a aceder ao mesmo.

    c. Para apreciar a causa de invalidade em apreço é absolutamente irrelevante a forma como o acto em crise foi sendo executado. I.e., o que estava em causa no presente processo era apenas a aferição da legalidade de uma ordem de entrada e de permanência nas instalações da recorrente sem sua autorização enquanto superfíciária.

    d. Por outro lado, a conformação constitucional do direito de propriedade não pode constituir o fundamento de uma situação de coexistência entre invasor e invadido, nem pode o Tribunal recorrido presumir que a presente limitação ao direito de propriedade decorre do "ordenamento jurídico", considerando os interesses da "salubridade e segurança".

    e. No âmbito da apreciação da violação do direito de audiência prévia, o juízo formulado pelo Tribunal a quo é absolutamente ininteligível.

    f. Desde logo, não se procede à distinção rigorosa entre o conceito de dispensa de audiência e o conceito de inexistência de audiência, ambos regulados no artigo 103.° do CPA.

    g. Por outro lado, se o Tribunal a quo reconhece que não se verifica o primeiro argumento invocado pelo Recorrido para justificar a inexistência de audiência (porquanto não existe fundamentação da urgência contemporânea ao acto), já não manteve o mesmo juízo para o segundo argumento, o que não é de todo compreensível. Ora, na verdade, a exigência de fundamentação de uma situação de inexistência de audiência é aplicável a qualquer um dos casos previstos no n.° l do artigo 103.° do CPA.

    h. Nesses termos, a apreciação do Tribunal a quo não pode proceder quanto a este aspecto, em razão do erro de julgamento na apreciação da alínea b) do n.° l do artigo 103.° do CPA.

    i. Por outro lado, o facto de a verificação da alínea b) em causa também exigir fundamentação torna imperceptível por que razão o Tribunal a quo entendeu “não ser de excluir que não esteja verificado este pressuposto” nem por que motivo essa circunstância permite concluir que "não se afigura manifesto que a preterição da audiência dos interessados tenha efeitos invalidantes do acto suspendendo".

    j. Sublinhe-se, por último, que a conclusão do Tribunal recorrido - de que "não é de excluir, sem mais indagação, que não esteja verificado o pressuposto" - não é concebível: ou o acto em crise contém a justificação prevista na alínea b) do n.° l do artigo 103.° do CPA ou não contém, sendo que a este propósito não existe qualquer sumariedade em razão da natureza cautelar do processo.

    k. No âmbito da apreciação da falta absoluta de base legal do acto suspendendo, o juízo do Tribunal a quo assenta em factos que não foram - nem sequer indiciariamente -, provados nos presentes autos de processo cautelar (a necessidade da "limpeza de "manta-morta" e das árvores existentes"), pelo que a apreciação efectuada não poderá proceder.

    l. No âmbito da análise ao erro sobre os pressupostos de facto, o Tribunal recorrido também incorre em erro de julgamento, uma vez que, como referido, não ficou provada no âmbito dos presentes autos a necessidade de limpeza da "caruma do pinhal, mato, arbustos e ramos e árvores secas".

    m. Acresce que o juízo efectuado pelo Tribunal recorrido limitou-se, de forma muito lacunar, à necessidade de proceder a tal limpeza, quando a recorrente havia invocado outros casos de erro sobre os pressupostos de facto (quanto à qualificação do terreno enquanto "espaço público", ao alegado risco de incêndio ou ao alegado estado de abandono das instalações).

    n. Nesses termos, a apreciação do Tribunal a quo não pode deixar de ser censurada, porquanto, mesmo que em termos perfunctórios, aquele encontrava-se obrigado a emitir uma pronúncia acerca dos erros invocados pela recorrente.

    o. Assim, a apreciação realizada pelo Tribunal recorrido quanto ao erro sobre os pressupostos de facto também padece de erro de julgamento, na medida em que o Tribunal considerou suficiente para os presentes autos a apreciação de apenas um dos erros sobre os pressupostos de facto invocados.

  3. No que respeita à verificação dos requisitos de que dependia a concessão das providências cautelares requeridas ao abrigo da alínea b) do n.° l do artigo 120.° do CPTA, a decisão ora recorrida também padece de erro de julgamento, na parte em que se pronuncia acerca da inexistência de periculum in mora.

  4. Desde logo, o Tribunal começa por alertar que a existência de facto consumado se afere em relação à esfera jurídica da recorrente e não ao prédio em si, sem que se compreenda o alcance desta observação já que é patente que todas as considerações posteriores se reportam às instalações da recorrente.

  5. Por outro lado, o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao considerar que as circunstâncias referentes ao prédio em si não cabem no conceito de "facto consumado".

  6. Por último, a argumentação do Tribunal a quo padece de vícios de raciocínio, ao defender-se que existe sempre a possibilidade de a administração ficar obrigada à reconstituição da situação actual hipotética. Ora, a considerar válido este entendimento, jamais se verificaria uma situação de facto consumado, pois sempre existiria a obrigação posterior de a administração proceder a tal reconstituição.

  7. No que respeita à apreciação do pedido de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, o Tribunal a quo não apreciou o pedido da recorrente no que respeita aos actos de execução indevida praticados a partir da data da citação do Recorrido e até à emissão da resolução fundamentada.

  8. Nesses termos, e uma vez que segundo o disposto no n.° 2 do artigo 660.° do CPC, "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação", a falta de decisão constitui uma situação de omissão de pronúncia, inquinando a Sentença sub judice por nulidade nos termos da alínea d) do n.° l do artigo 668.° do CPC, aplicável ex vi do artigo l.° do CPTA.

  9. Em segundo lugar, a apreciação dos fundamentos invocados na resolução fundamentada também se encontra inquinada por erro de julgamento.

  10. Desde logo, não ficou provada nos presentes autos a existência de acumulação significativa de inertes vegetais - o que prejudica automaticamente a apreciação dos fundamentos da resolução fundamentada relativos ao "perigo de incêndio" e ao "policiamento eficaz".

  11. Quanto ao "perigo de incêndio", não foi apreciada por que razão a execução do acto não pôde aguardar pela decisão do processo cautelar. Do mesmo modo, também ficou por julgar se a execução do acto em crise consubstanciava a única forma de garantir que os alegados interesses públicos não eram gravemente prejudicados.

  12. Por outro lado, o Tribunal não podia sustentar a sua decisão numa vaga presunção de que a limpeza daquela área "importa por certo" vários meses de trabalho, sem qualquer sustentação em matéria dada como provada.

  13. No que respeita à necessidade de garantir um "policiamento eficaz", o Tribunal recorrido absorveu, sem qualquer apreciação própria, o argumento invocado pelo Recorrido, ficando por apreciar a urgência de execução do acto em momento anterior à decisão cautelar e a existência de outros meios de garantir os interesses alegadamente a proteger.

  14. Todavia, mais grave que tais falhas é a total desconsideração do carácter privado das instalações em apreço que, nessa medida, não se encontram sujeitas a qualquer vigilância policial - o que torna descabida a conclusão de que os inertes vegetais dificultam o policiamento.

  15. Em suma, o Tribunal a quo incorreu em omissão de pronúncia e em erro de julgamento na apreciação dos pedidos formulados pela ora recorrente, violando os preceitos supra identificados e, desde logo, as alíneas a) e b) do n.° l do artigo 120.°, o artigo 128.° e o artigo 131.°, todos do CPTA.

    Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se as decisões recorridas, com todas as legais consequências.

    * O Recorrido Município de Lisboa contra-alegou, concluindo como segue: a) Pelo presente recurso, argumenta a ora Recorrente que a douta sentença padece de erros de julgamento, invocando, sumariamente, que "a douta...

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