Acórdão nº 06031/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelFREDERICO BRANCO
Data da Resolução10 de Julho de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório O Ministério da Saúde e a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada pelo aqui Recorrido ... , tendente, em síntese, a declarar a ilegalidade da Portaria nº 3-B/2007, que, designadamente, fixa o prazo de pagamento das faturas correspondentes à comparticipação do SNS nos medicamentos dispensados ao público, inconformados com o Acórdão proferido em 30 de Maio de 2009, que julgou procedente a Ação, vieram interpor recursos jurisdicionais do referido Acórdão, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

Formula o aqui Recorrente/Ministério nas suas alegações de recurso, apresentadas em 6 de Julho de 2009, as seguintes conclusões: «Omissis» Formula a aqui Recorrente/ARS-LVT nas suas alegações de recurso, igualmente apresentadas em 6 de Julho de 2009, as seguintes conclusões: «Omissis» O aqui Recorrido veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 3 de Setembro de 2009, concluindo do seguinte modo: A. Compulsada a Matéria de Facto dada como provada pelo Acórdão Recorrido (cfr. alíneas A) a J) da Fundamentação de Facto constante de fls. 12 a 14 do aludido Aresto), verifica-se que, em nenhuma das preditas alíneas, se encontram assentes e provados diversos novos factos invocados ao longo das Alegações dos Recorrentes.

B. Os Recorrentes não apresentaram recurso quanto à Matéria de Facto, nunca peticionando ao Tribunal ad quem a alteração (neste caso, a ampliação) da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 712.º n.º 1 alíneas a) a c) do CPC, aplicável “ex vi” artigo 140.º do CPTA, mas, não obstante, invocam reiterada e sistematicamente novos factos, não provados e relativamente aos quais não apresentam uma única prova.

C. Genericamente (cfr. supra, no corpo das presentes contra-alegações, referência mais precisa aos novos factos invocados pelos Recorrentes), tais factos dizem respeito a uma suposta conveniência das próprias Farmácias num prazo de pagamento de comparticipações alargado (nomeadamente para permitir a “preparação” das faturas mensais) introduzido pela Portaria 3-B/2007, a alegada complexidade do próprio sistema de pagamentos das comparticipações, que não se compadeceria com pagamentos a 30 dias, e, pasme-se, a putativos incumprimentos das Farmácias relacionados com o sistema de pagamentos, alegadamente geradores de mora creditícia.

D. No entender dos Recorrentes, são estes novos factos que justificam a necessidade de alargar o prazo do pagamento das comparticipações, para além do limite legal de 30 dias estatuído pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro (adiante “DL 32/2003”), e pela Diretiva Comunitária n. º 2000/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Junho de 2000 (adiante “Diretiva 2000/35/CE”).

E. Todos estes factos foram invocados ao arrepio das regras processuais aplicáveis porquanto, atenta a sua alegação extemporânea, careciam, no mínimo, de ter sido demonstrados e provados, através da junção de documentos que os atestassem, dado que do processo e dos Autos não constam elementos que os permitam comprovar [cfr. art. 712.º n.º 1 alíneas a) e b) do CPC], não podendo relevar para a decisão do presente recurso, para a qual só podem contar os factos constantes das alíneas A) a J) da Fundamentação de Facto do Acórdão Recorrido (cfr. fls. 12 a 14).

F. Sem prejuízo das conclusões anteriores, quanto à pretensa conveniência das próprias Farmácias num prazo de pagamento das comparticipações alargado, para “preparar” as faturas mensais, bem como à alegada complexidade do próprio sistema de pagamentos das comparticipações, trata-se de corolários do próprio regime ilegal da Portaria 3-B/2007, que obriga a faturar mensalmente o que podia ser faturado diariamente e, assim, a agregar nessa fatura um universo de informação muito superior ao que constaria de uma fatura diária, sendo que a verificação de requisitos de faturas pelas Farmácias tanto ocorre no caso de a fatura ser diária, semanal, mensal, trimestral, semestral ou anual, nada tendo que ver com o prazo de pagamento das mesmas faturas, matéria em apreço nestes autos.

G. Relativamente ao regime da Portaria 3-B/2007 se dever a putativos incumprimentos das Farmácias no processamento de notas de crédito e de débito, o facto é que a verificar-se, em concreto, algum tipo de situação dessa natureza, suscetível de configurar mora creditícia das Farmácias, aplicar-se-ão as regras gerais de Direito das Obrigações, conforme previstas nos artigos 813.º e seguintes do Código Civil – De novo, nada tem que ver com o prazo de pagamento das faturas de 30 dias imposto pela Portaria 3-B/2007, matéria em apreço nestes autos.

H. Pretender extrair dessa regras gerais (de per si suscetíveis de resolver eventuais casos de mora creditícia) e dessas hipotéticas situações (não provadas), uma ratio para o regime previsto na Portaria 3-B/2007, não colhe, porque o prazo de 30 dias para pagamento de faturas estatuído pelo DL 32/2003 e pela Diretiva 2000/35/CE é mais do que suficiente para proceder a todas as verificações contabilísticas, bem como ao acerto de todas as notas de crédito e de débito a que eventualmente haja lugar, e porque casos suscetíveis de gerar mora creditícia, tanto podem ocorrer quer as faturas sejam diárias, semanais, mensais ou anuais, e o prazo de seu pagamento seja de 1 dia, de 1 semana, de 1 mês ou de 1. Ora, alterar a prática apenas para permitir a verificação artificial e desnecessária das condições de benefício da exceção que permitiria dilatar os prazos de pagamento impostos pelo direito comunitário é, obviamente, inadmissível.

I. Analisou e decidiu bem o Tribunal a quo a articulação legal entre o disposto no Decreto-Lei 242-B/2006, de 29 de Dezembro (adiante “DL 242-B/2006”), no DL 32/2003 e na Diretiva 2000/35/CE, ao ter declarado a ilegalidade dos artigos 8º e 10º da Portaria n.º 3-B/2007 de 02/01 (adiante “Portaria 3-B/2007”), com efeitos circunscritos ao caso concreto, por violação do DL 32/2003 e por violação da Diretiva 2000/35/CE.

J. O DL 242-B/2006 ao fixar, de modo unilateral, um sistema de pagamento das comparticipações devidas às Farmácias pelo Serviço Nacional de Saúde (“SNS”), pela dispensa de medicamentos, quando esse sistema estabelece um prazo de pagamento que viola o disposto na Diretiva 2000/35/CE, já transposta pelo DL 32/2003, é inconstitucional e ilegal, conforme sustentado nos Pareceres Jurídicos dos Senhores Professor Doutor Vieira de Andrade e Professor Doutor Paulo Otero, juntos aos presentes Autos, pelo que consequentemente e de modo derivado também a Portaria 3-B/2007 padece das mesmas inconstitucionalidades e ilegalidades.

K. A Portaria 3-B/2007 fixa um sistema no qual os credores (in casu as Farmácias) apenas podem apresentar faturas mensais (art. 8.º), pelo que quando estes faturam (no último dia do mês) já há um atraso no pagamento (face à data da constituição do crédito) que pode chegar a 30 dias (no caso de medicamentos dispensados no primeiro dia desse mês), mais estatuindo que o pagamento pelo SNS apenas ocorrerá no dia 10 do mês seguinte ao do envio da fatura (art. 10.º): isto é, nos termos da Portaria, os prazos de pagamento variam entre os 40 dias (face à data da fatura) e os 70 dias (face à dispensa dos medicamentos), existindo sempre atraso no pagamento, que pode variar entre os 10 e os 40 dias.

L. A Diretiva 2000/35/CE e o DL 32/2003, que a transpôs, aplicáveis ao caso em apreço, estatuem que o pagamento deve ocorrer “30 dias após a data em que o devedor tiver recebido a fatura ou documento equivalente” - Assim, o modelo de fixação unilateral de prazos de pagamento previsto na Portaria 3-B/2007 é inconstitucional e ilegal, violando aqueles diplomas, que integram o denominado “bloco de...

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