Acórdão nº 01381/10.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelPedro March
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Fazenda Pública (Recorrente), não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a oposição deduzida por G...(Recorrido), na qualidade de responsável tributário subsidiário, no processo de execução fiscal n.º 3468200701047990 e apensos, originariamente instaurada contra a sociedade “G...– Transportes Expresso, Lda.”, por dívidas de IRC de 2005 e de IVA de 2006, no valor global de EUR 9.093,19, dela veio interpor o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a oposição deduzida contra a reversão efectuada contra o aqui oponente nos autos de execução fiscal n.º 3468200701047990 e apensos, instaurado pelo serviço de finanças de Gondomar 2 para cobrança de dívidas de IRC do ano de 2005 e IVA do ano de 2006, em que é executada a devedora originária G… Transporte Expresso Lda., NIPC 5….

  1. Entendeu o Tribunal a quo que a AT não logrou provar os pressupostos necessários à efectivação da responsabilidade subsidiária, por via reversão da execução operada nos presentes autos, nomeadamente, o exercício efectivo da gerência de facto da devedora originária por parte do oponente, bem como, a sua culpa pela insuficiência do património da sociedade, concluindo pela procedência da presente oposição.

  2. Contudo, não pode a Fazenda Pública concordar com este entendimento, perfilhando a convicção que a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento de facto e de direito, porquanto, por um lado, foram juntos aos autos elementos suficientes que provam o exercício de facto das funções de gerente pelo aqui oponente, e, D. por outro lado, uma vez provado esse exercício efectivo de funções, não era à AT a quem incumbia a prova da culpa pela inexistência de bens na esfera da sociedade, devedora originária, mas sim, era sobre o oponente que recaía o ónus de provar que não foi por sua culpa que as dívidas não foram pagas, o que não logrou fazer.

  3. Quanto à gerência de facto, estatui o art. 24º, n.º 1, da LGT, que a responsabilidade subsidiária prevista no art. 23º depende do exercício, de facto, das funções de gerência da devedora originária, sendo jurisprudência assente que da mera designação de gerente de uma sociedade comercial não se presume que a pessoa nomeada exerceu, de facto, essas funções.

  4. Assim, não existindo qualquer presunção legal quanto ao exercício da gerência de facto a partir da gerência de direito, a conclusão de que o nomeado gerente exerceu, na realidade, essas funções constituirá um juízo judicial, a assentar em factos instrumentais, analisados segundo as regras da experiência comum.

  5. Entende a Fazenda Pública que andou mal o Tribunal a quo na avaliação da matéria de facto, uma vez que, sendo certo que o oponente foi nomeado gerente da sociedade, devedora originária, a verdade é que não pode o Tribunal concluir como não provado esse exercício de funções quando é exactamente o oponente que as assume na sua PI, ao que acresce, ainda, todos os elementos juntos aos autos que, exactamente, comprovam essa confissão do oponente.

  6. Resulta directamente da PI, nomeadamente nos seus artigos 8º e ss, a confissão do oponente que, de facto, exerceu as funções de gerência da sociedade devedora originária.

    I. Declara o oponente na PI que em finais do ano de 2003 “o sócio Júlio, que era quem estava responsável pela gestão e administração da sociedade e tinha o know how, ausentou-se do país por diversos problemas de ordem pessoal”, cfr. artigo 6º da PI, acrescentando que perante esse facto “não conseguiu fazer face a todas as situações com que se deparava”, cfr. artigo 8º da PI, continuando no artigo 9º, “…apesar dos esforços, não conseguiu que a sociedade vingasse…” e no artigo 10º, “A gestão do aqui oponente, apesar de esforçada, não foi bem sucedida”, para concluir “Do exposto resulta inexistir culpa…”, cfr. artigo 14º da PI.

  7. Ou seja, o próprio oponente confessa que assumiu a gerência de facto da sociedade, desde finais do ano de 2003, devido à ausência do outro sócio-gerente Júlio.

  8. Ao que não serão alheios todos os elementos de prova desse exercício de funções por parte do oponente constantes dos autos, que, de resto, integram a matéria de facto assente, nomeadamente, Em 10-04-2003 subscreveu requerimento dirigido ao chefe de finanças de Gondomar, informando o extravio dos livros de facturas – cfr. ponto 5 da matéria assente; O oponente foi citado como sócio gerente da devedora originária - cfr. ponto 6 da matéria assente, sendo que uma das citações ocorreu em 17-12-2003; Subscreveu, na qualidade de representante legal da sociedade devedora originária, declarações de alterações – cfr. ponto 4 da matéria assente, sendo que uma das quais subscrita em 24-03-2004; Nos anos de 2003, 2004 e 2005, a declaração anual de IRS, IRC, IVA e Imposto de Selo, foi entregue com a menção do NIF do ora oponente, enquanto representante legal.

    L. Do exposto resulta provado que o oponente exerceu, de facto, a gerência da sociedade devedora originária não apenas a partir de finais do ano de 2003, conforme confessa na PI, mas mesmo já anteriormente a essa data, uma vez que comunicou o extravio de 250 facturas em 10-04-2003.

  9. Pelo que, deveria o meritíssimo Juiz ter dado como provado a gerência de facto exercida pelo oponente, uma vez que, quer em face da confissão do oponente, quer, ainda, em face dos elementos de prova juntos aos autos, apenas poderia concluir que o oponente foi quem exercia as funções de gerente da devedora originária no período a que respeita a dívida.

  10. Incorrendo o Tribunal recorrido em erro de julgamento de facto ao valorar, como valorou, o depoimento prestado pelo filho do oponente, segundo o qual, o oponente “deu nome” à sociedade, e que era o sócio gerente Júlio quem geria a empresa até aos anos de 2005/2006, altura em que se ausentou do país, uma vez que esse depoimento contraria o declarado pelo próprio oponente, quer quanto à confissão do exercício de gerência, quer quanto à data da ausência do referido Júlio (finais de 2003), quer ainda, quanto a toda a prova documental junta aos autos.

  11. Quanto ao ónus da prova da culpa, estipula o art. 24º, n.º 1, da LGT, dois regimes diferenciados de responsabilização dos gerentes, responsáveis subsidiários, pelas dívidas constituídas pela sociedade da qual foram gerentes, determinando na sua al. a) que, no caso do exercício do cargo de gerência em período anterior ao termo do prazo legal de pagamento, é à AT a quem incumbe fazer a prova da culpa do gerente pela insuficiência do património da sociedade, ao invés do determinado na al. b), no caso do exercício do cargo de gerência no período em que terminou o prazo legal de pagamento, que faz recair sobre o gerente o ónus da prova de que a falta de pagamento da dívida não lhe é imputável, independentemente de ter exercido, ou não, essas funções aquando dos factos constitutivos das dívidas3.

  12. Conforme acima exposto, o oponente exerceu a gerência de facto da sociedade, devedora originária, também no período em que terminou o prazo legal de pagamento das dívidas, tendo sido, por isso, responsabilizado nos termos da al. b) do n.º 1 do art. 24º da LGT, conforme consta na carta de citação da reversão realizada, cfr. ponto 12 da matéria de facto assente.

  13. Deste modo, também errou o meritíssimo Juiz ao concluir que a AT não alegou nem provou que foi por culpa do oponente que o património da sociedade se tornou insuficiente, uma vez que, ao invés do concluído, era sobre o oponente que recaía o ónus de provar que a falta de pagamento da dívida não lhe é imputável, nos termos da referida al. b) do art. 24º da LGT.

  14. Prova essa, da falta de culpa pelo não pagamento, que não logrou, sequer, fazer, atendendo a que para afastar a presunção de culpa consagrada na referida al. b) não basta arguir genericamente os “esforços” despendidos ou a não locupletação “à custa da empresa”.

  15. Neste contexto e com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução, e erro de julgamento quanto à matéria de direito.

    Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, por verificação de erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito.

    • O Recorrido, G..., não apresentou contra-alegações.

    • Neste Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, defendendo a improcedência do recurso.

    • Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

    • I. 1.

    Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar: - Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao...

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