Acórdão nº 02880/12.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução17 de Janeiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A...

, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 25.06.2013, que julgou totalmente improcedente a ação administrativa pelo mesmo deduzida contra o “MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA”(doravante «MAI») e na qual peticionava a anulação da decisão de 23.10.2012 que indeferiu o recurso hierárquico interposto, bem como a condenação daquele a deferir o “pedido de reabertura do processo de sanidade por recidiva/agravamento de lesão sofrida em acidente de serviço”.

Formula, nas respetivas alegações [cfr. fls. 104 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões: “… I. Da matéria de facto 1. O Autor alegou, nos artigos 12.º a 15.º da petição inicial que, embora tenha sido submetido a exame final, nunca foi notificado do boletim de alta clínica/boletim de acompanhamento médico.

  1. É certo que a Ré impugnou os artigos 14.º e 15.º da petição inicial, mas não consta qualquer documento nos autos (aliás, o boletim de acompanhamento médico, pura e simplesmente, inexiste no «p.a.») que corrobore a tese da Ré.

  2. Pelo que deveria ter sido dado como provado que o sinistrado não foi notificado do boletim de alta clínica, que na administração pública recebe o nome de boletim de acompanhamento médico - art. 12.º do DL 503/99, de 20 de novembro.

    1. Da relevância da notificação do boletim de alta clínica e da recidiva/agravamento 4. O decurso do prazo de 10 anos dentro do qual o sinistrado podia requerer a reabertura do processo nunca chegou a iniciar-se, por nunca ter sido formalmente notificado do boletim da alta clínica - Ac. RP de 12.09.2011, proc. 516/10.0TTGDM.P1; AC. RP de 25.02.2008, proc. 0716269; Ac. RP de 16.10.2006, proc. 0612502; RC de 20.10.2005, proc. 1830/05, in www.dgsi.pt; Carlos Alegre, in Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2.ª edição, pág. 152; Tomás de Resende, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2.ª ed., pág. 67 e segs.; Cruz de Carvalho, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2.ª ed., pág. 162 e Ac. STJ de 03.06.1992, Acórdãos Doutrinais, 1992, págs. 221 a 225).

  3. O n.º 1 do art. 20.º do DL 503/99, de 20 de novembro, dispõe que quando o trabalhador for considerado clinicamente curado o médico assistente ou a junta médica dar-lhe-á alta formalizada no boletim de acompanhamento médico, pelo que só a partir da notificação ao sinistrado da alta clínica, com entrega do boletim de acompanhamento médico, cujos elementos estão fixados no art. 12.º daquele diploma legal, o sinistrado está em condições de poder concordar ou discordar com a decisão médica.

  4. É totalmente irrelevante o facto de o sinistrado ter declarado que se apresentou ao serviço «por se sentir em condições de o fazer», pois que a regra é a de que um sinistrado quando se apresenta ao serviço sente-se «em condições para o fazer», independentemente de ser portador de um grau de incapacidade, ou não, e conhecendo ou desconhecendo a classificação exata da sua situação clínica.

  5. Do mesmo modo, a notificação de que a doença foi considerada agravamento/recidiva do acidente de que havia sido vítima no dia 16.04.2000, assume a maior relevância, pois que só nessa data - despacho do Exmo. Sr. Diretor Nacional de 03.02.2005 notificado ao A. em 11.04.2005 - se deu início ao decurso do prazo previsto no art. 24.º do DL 503/99.

  6. Só a partir daquele momento é que ficaram definidos os direitos do sinistrado no que respeita à reparação do acidente, nomeadamente os direitos de receber a remuneração e todos os suplementos de caráter permanente, bem como o subsídio de refeição, no período de baixa médica, e o direito de ser indemnizado pelo eventual grau de incapacidade de que ficasse a padecer, cf. Ac. RL de 27.06.2007, proc. 4806/2007-4, in www.dgsi.pt.

    1. Da Violação do Princípio da Igualdade e da Não Discriminação 9. O DL 503/99 de 30 de novembro, acolheu, na generalidade, os princípios consagrados na Lei 100/97 (lei geral), adaptando-os às especificidades da Administração Pública.

  7. No entanto, a Lei 100/97 foi revogada pela Lei 98/2009, de 4 de setembro, que, no seu art. 70.º (Revisão das Prestações) não prevê qualquer prazo para requerer a revisão da incapacidade.

  8. Apesar de, de acordo com o disposto no art. 187.º, esta Lei ser aplicável apenas aos acidentes ocorridos após a sua entrada em vigor - 01.01.2010 - o desaparecimento, no art. 70.º daquela Lei, do prazo preclusivo para requerer a revisão da incapacidade, constitui verdadeiramente uma alteração do conteúdo da relação jurídica emergente de acidentes de trabalho, pelo que aquela norma deve ser aplicada às situações jurídicas já constituídas à data da respetiva entrada em vigor.

  9. Aliás, é essa a interpretação mais consentânea com o disposto na parte final do n.º 2 do art. 12.º do Código Civil - Aplicação das leis no tempo. Princípio geral, conforme se pronunciou o insigne mestre Abílio Neto, in Acidentes de trabalho e Doenças Profissionais, Anotado, Ediforum, 1.ª ed., Fevereiro de 2011, pág. 200.

  10. Se assim não se entender, está criada uma desigualdade entre os sinistrados de acidentes de trabalho ocorridos na vigência da nova lei e os sinistrados de acidentes de trabalho ocorridos na vigência das leis anteriores, para a qual não existe fundamento, sendo, portanto, inaceitável - Vide, entre outros, Acórdãos da Relação de Lisboa de 02.02.2011, proc. 29/1990.1.L1-4 e 08.02.2012, proc. 231/1997.L1-4; Ac. RP de 19.12.2012, proc. 42/1976.1.P1.

  11. A aplicação de uma norma para a função pública diferente da norma do regime geral, cria uma descriminação (negativa) dos cidadãos que exerçam funções públicas em confronto com os funcionários civis - sem que nada o justifique, mormente a mera qualidade de funcionários públicos - com quebra do princípio constitucional da igualdade e da não discriminação.

  12. Pelo que, não se concedendo a reabertura do processo de sanidade do A., com base no decurso do prazo de caducidade de dez anos, está a violar-se o princípio da igualdade e não discriminação previsto no art. 13.º da CRP …”.

    Pugna pelo provimento do presente recurso jurisdicional e total procedência da pretensão formulada nos autos.

    O ente demandado, aqui ora recorrido, devida e regularmente notificado apresentou contra-alegações [cfr. fls. 121 e segs.

    ] onde termina afirmando que em “… conclusão dir-se-á que o Douto Acórdão impugnado não padece de qualquer vício que o inquine, sendo ao invés, inteiramente válida, porquanto conforme à Lei e ao Direito …”.

    O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º do CPTA, não emitiu qualquer parecer ou pronúncia [cfr. fls. 141 e segs.

    ].

    Sem vistos, dado o disposto conjugadamente nos arts. 36.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA e 48.º, n.º 1 do DL n.º 503/99, de 20.11, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

  13. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que se, pese embora por um lado, o objeto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 05.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC/2013 [na redação introduzida pela Lei n.º 41/013, de 26.06 - cfr. arts. 05.º e 07.º, n.º 1 daquele diploma -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC] [anteriores arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do CPC - na redação introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA, o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

    As questões suscitadas pelo recorrente resumem-se, no essencial, em determinar se na situação vertente a decisão judicial recorrida incorreu ou não em erro no julgamento de facto [aditamento aos factos provados da matéria relativa à ausência de notificação do boletim alta clínica/boletim de acompanhamento médico - arts. 12.º a 15.º da «P.I.»] e de direito com violação, nomeadamente, do...

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