Acórdão nº 07577/11 de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução21 de Novembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa, que condenou o R. Estado Português a pagar à representada do A. a quantia de €17.312,76 a título de danos patrimoniais, acrescida de juros desde a citação, mais €1500,00 a título de danos não patrimoniais, e ainda, no pagamento ao A. das despesas suportadas com honorários dos advogados, estas a liquidar em execução de sentença.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: «1. À data da cessação do contrato de provimento da associada do Autor - 15.10.2007 - "o nosso ordenamento jurídico, não continha normas que permitissem responsabilizar o Estado, por eventuais danos decorrentes do (in)exercício da função legislativa do Estado".

  1. Na sequência da prolação do Acórdão n.º 474/02, o Tribunal Constitucional do foi iniciado o processo legislativo que culminou com a publicação do Lei nº 11/2008, de 20.02 3. Foi expressa a opção do legislador nacional - em obediência ao princípio da não retroactividade das leis - que o regime assim aprovado tivesse efeitos a partir de 01.01.2008.

  2. Não pode o poder judicial, sob pena de violação do principio constitucionalmente consagrado da separação de poderes, substituir-se aos órgãos que, na ordem jurídico-constitucional têm a exclusiva legitimidade para aprovar leis e/ou decretos-lei.

  3. Carece assim de base legal a pretensão do Autor em ver atribuído um subsidio de desemprego à sua associada o qual, conforme se demonstrou, não tinha (ou tem) direito.

  4. Acresce, que ainda que assim não se entendesse em momento algum a associada do A. requereu a concessão de tal subsidio e/ou demonstrou que estivesse em condições de a ele ter direito.

  5. Mais acresce que os cálculos, em que o A. fundamenta o seu pedido estão viciados de raiz motivo pelo qual nunca teria associada do A direito à quantia peticionada.

  6. Mas, mesmo a entender-se, como na sentença ora em recurso que o art. 22º da CRP se aplica a todas as funções do Estado, incluindo a função legislativa, nem assim haveria fundamento para responsabilizar o Estado pelos danos eventualmente decorrentes da função legislativa.

  7. Na verdade, o preceito em causa estabelece apenas um princípio geral, não definindo quaisquer critérios que permitam minimamente delinear os contornos da efectivação da responsabilidade civil do Estado. Por outro lado, a sua inserção sistemática afasta-o, claramente, do regime dos direitos, liberdades e garantias individuais, não lhe sendo, nessa medida, extensível a regra da (sua) aplicabilidade directa, que é própria das normas que definem aquele regime, nos termos do art. 18° da CRP.

    10.0 Tribunal "a quo" entendeu que, perante a inércia do legislador, caberia ao tribunal dar execução ao princípio constitucional do art. 22° da CRP, criando a norma mais adequada ao caso concreto, com recurso, designadamente, aos princípios gerais da responsabilidade civil.

  8. Tal entendimento não é de acolher, uma vez que a inconstitucionalidade por omissão não pode ser suprida pelos tribunais. O seu regime é o que consta do art. 283º n°2 da CRP, só o Tribunal Constitucional tem competência para apreciar e, caso a julgue verificada, limitar-se-á a dar conhecimento ao legislador, sem que possa substituir-se a este.

  9. Os tribunais, sob pena de violação do princípio da separacão de poderes plasmado no artigo 111° da CRP, não podem substituir-se ao legislador na criação do direito inexistente em resultado de omissões legislativas, não sendo, por isso mesmo, convocáveis as regras gerais de integração de lacunas, designadamente, a interpretação extensiva ou a analogia, para o respectivo suprimento.

  10. E assim é, porque o ordenamento jurídico - constitucional português não admite o controlo jurisdicional concreto de omissões legislativas, ao contrário do que se verifica com a inconstitucionalidade por acção - Cfr, Acórdãos do STA de 03.05.89, P. 5206; 09.06.92, P. 29726; 25.06.92, P. 27739; 30.04.97, P. 16533; cfr, ainda, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20.06.96, P. 96242 e 10.07.98, P. 98409, in www.dgsi.pt.

  11. Razão pela qual, no seu acórdão n.º 474/02, o Tribunal Constitucional se tenha limitado a verificar a ocorrência de uma omissão legislativa parcial, tendo considerado que o legislador deu execução à norma do artigo 59º, n.º 1, al. e), da CRP que o obriga a assegurar o direito à assistência material dos trabalhadores em situação de desemprego involuntário, mas apenas em relação a alguns deles, com exclusão da generalidade dos trabalhadores da função pública.

  12. De acordo com jurisprudência do Tribunal Constitucional, «não é possível precisar juridicamente a formulação dos diferentes direitos sociais para que os cidadãos possam neles fundar pretensões directamente exigíveis», pelo que, em regra, os mesmos só serão "justiciáveis" depois de prévia intermediação do legislador (designadamente, por efeito da violação do princípio da proibição do retrocesso social) - Ibidem; cfr, ainda, Gomes Canotilho, "Tomemos a sério os direitos económicos, sociais e culturais", ln Estudos em Homenagem ao Pro'- Doutor Ferrer Correia, Ili, pág. 461 e segs.

  13. Pelo que, a omissão legislativa verificada e declarada pelo Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.0 474/02, até 31.01.2008, não configurava um comportamento lícito do legislador traduzido na violação de normas a que esteja (estivesse) sujeito e da qual resulte ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, pelo que soçobrava - em Agosto de 2005 - o requisito primeiro da actuação do Instituto responsabilidade civil extracontratual e, por conseguinte, o fundamento do invocado dever de indemnizar por parte do Estado Português, o que faz cair pela base toda a argumentação da sentença (sublinhado e itálico nosso).

  14. Daqui resulta também que, pelas razões ora aduzidas, o Tribunal" a quo" ao considerar que ""Ao não legislar no sentido de estabelecer também para os trabalhadores do Estado o direito ao subsidio de desemprego, quando face às circunstâncias o podia ter feito, assim evitando a violação dos direitos e interessasses dos particulares, o Estado actuou ilicitamente e de forma culposa", e, assim, julgar parcialmente procedente a pretensão do Autor, fê-lo em violação ao princípio da margem de livre apreciação e reserva do legislador.

  15. A mera situação de desemprego e a existência de omissão legislativa, não bastam, para que se considerarem verificados todos os pressupostos do direito à indemnização.

  16. A existência de uma omissão legislativa, não exime o Autor/Recorrido de fazer prova que a sua associada ficara na situação de desemprego, que se verificavam os pressupostos da atribuição do respectivo subsídio e que requerera a concessão daquele subsidio.

  17. A atribuição do subsídio de desemprego não é automática, sendo que todos os diplomas legais que o regulavam e o regulam, fazem depender tal atribuição de diversos pressupostos, nomeadamente, da apresentação de requerimento pelo trabalhador no prazo de 90 dias e da inscrição prévia do trabalhador, como candidato a emprego no centro de emprego na área da sua residência.

  18. Os C) e F) factos dados como assentes, são demonstrativos que os danos patrimoniais não derivaram directamente da omissão do dever de legislar do Estado, sendo, antes, uma consequência objectiva e subjectivamente Imputável à associada do Recorrido.

  19. Dos documentos juntos pelo ora Recorrido, verifica-se que sua associada não fez qualquer prova daqueles dois requisitos, pelo contrário verifica-se que a mesma não apresentou qualquer requerimento na Segurança Social, mas sim baseou a sua pretensão numa alegada informação prestada por aquela entidade em data e local que se desconhece, nem se inscreveu no centro de emprego.

  20. Mais, mesmo no âmbito de aplicação do regime previsto no Decreto-lei n.º 220/2006, de 03/11, diploma invocado na sentença em recurso a situação da associada do Recorrido, não integraria uma situação de desemprego involuntário, por aplicação do disposto nos nº 1e 6 do seu art. 9°.

  21. E isto, porque a situação de desemprego da associada do Autor deveu-se, a causas de carácter subjectivo, imputáveis a si própria na medida em que não requereu a admissão ás provas de aptidão pedagógica e cientifica, conforme dispõe a alínea b) do nº2 do art. 29ºda ECUDU e não a causas objectivas a fosse completamente alheia.

  22. Sendo certo que os danos patrimoniais por responsabilidade extracontratual, os alegados prejuízos económicos consubstanciados no pagamento de€ 17.756,76 não derivam directamente da omissão do dever de legislar do Estado.

  23. Tais danos sempre seriam uma consequência subjectivamente imputável à inércia consciente da lesada associada do A., perante o conhecimento que tinha da previsível evolução da situação contratual que mantinha com a FETUC, de a não efectivação das provas a que alude o n.º 3 do artigo 29° do ECDU, se seguiria a rescisão do contrato, como sucedeu.

  24. Inércia consciente violadora do principio da boa fé como padrão objectivo de comportamento consagrado no artigo 334° do Código Civil, na vertente do venire contra actum proprium, relevante em ordem a, nos termos do artigo 570º, n.º 1, do Código Civil, excluir o Réu Estado da obrigação de indemnizar o A.

  25. O Autor/Recorrido, não fez prova que, a sua associada tenha efectivamente estado numa situação de desemprego involuntário, sendo que tal situação de desemprego é, ela sim, condição sine qua non para atribuição e/ou manutenção do respectivo subsídio.

  26. Assim, na ausência de qualquer elemento probatório, não podia o tribunal ancorar a convicção de que os danos teriam ocorrido, independentemente da verificação dos pressupostos, comuns a todos os diplomas, de atribuição do subsidio.

  27. Refira-se, também, que não existe suporte legal para a condenação do Estado Português " (…)no pagamento das despesas suportadas com os honorários dos advogados, a liquidar em sede de execução de sentença" peticionado pelo recorrido e e atribuído...

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