Acórdão nº 01559/05.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução12 de Outubro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “MUNICÍPIO DO PORTO” (doravante «MP») e M… E OUTRO, inconformados, vieram de per si interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto datada de 20.10.2009 que, no âmbito da acção administrativa especial movida pelos mesmos contra os RR. «MP» e M… (enquanto Vereadora da Câmara Municipal do Porto com Pelouro da Habitação) e ainda os RR./contra-interessados [identificados a fls. 02 a 05 dos autos], a julgou parcialmente procedente condenando o R. «MP» “… a pagar aos autores o montante indemnizatório de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais …”, absolvendo-o dos restantes pedidos e à R. M… dos pedidos.

Os AA., aqui também recorrentes, peticionaram que fosse “… a) … anulado o acto administrativo … que ordenou a desocupação [acto que determinou o desalojamento do fogo correspondente ao Bloco N, casa 223, do Bairro do C...] …” e “… b) Declarado que os AA. têm direito à ocupação da habitação n.º 223, do Bairro do C..., Porto, e condenados os RR. a reconhecê-lo …”, que fossem condenados os 1.º e 2.º RR. “… a entregar aos AA., livre de pessoas e coisas, a referida casa 223 e a proporcionar-lhes o seu gozo para habitação, nos termos em que a vinham usando até ao desalojamento, contra o pagamento da respectiva renda …” e “… a indemnizar os AA. por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes da desocupação do prédio …”, indemnização essa a liquidar ulteriormente.

Formula o R. «MP», aqui recorrente jurisdicional, nas respectivas alegações (cfr. fls. 437 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. - Tendo o pedido de indemnização formulado pelos apelados - ainda que de forma indevidamente genérica - sido alicerçado por um lado nas causas de invalidade apontadas ao acto administrativo impugnado e ainda no facto de o aqui apelante ter violado o princípio da boa fé por decidir despejar apesar de saber que havia sido dada entrada de uma providência cautelar de suspensão de eficácia (artigo 79.º da P.I.), a decisão impugnada que condenou o apelante no pagamento de uma indemnização aos apelados por violação do princípio da boa fé - não ter estabelecido prazo para a entrega voluntária - é nula por ter conhecido de questão que não podia conhecer, por não lhe ter sido colocada, nem ser de conhecimento oficioso.

  2. - Não tendo os apelados quantificado o dano não patrimonial por eles alegado e tendo optado por formular pedido genérico, quando a sua causa de pedir a provocar dano é um facto instantâneo e imediato - acto de surpresa e desnecessário que os vexou - o pedido viola o disposto no art. 78.º do CPTA e art. 471.º n.º 1 b) do CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA e por isso a decisão impugnada é nula nos termos do disposto no art. 668.º, n.º 1 c) do CPC.

  3. - O cumprimento do princípio da boa fé pela aqui apelante não implica, ao contrário do decidido, que esta tenha de estipular um prazo certo para a entrega voluntária do locado findo o qual se procederá à execução, pois o cumprimento daquele dever basta-se com a indicação de que não se fazendo a entrega voluntária do imóvel a administração procederá à sua entrega coerciva imediata, dado que o art. 156.º do CPA bem ou mal não impõe a obrigação de estabelecimento de um prazo para o efeito.

  4. - Perante tal advertência, os destinatários dos actos em causa - no caso concreto os apelados - deveriam ter entregue imediatamente o locado de forma voluntária, ou então deveriam ter dado entrada da providência cautelar de suspensão de eficácia com citação urgente, o que não fizerem apesar de esta solução estar ao seu alcance legal e processual, pois se o tivessem feito teriam logrado automaticamente impedir a entrega coerciva imediata que lhes foi notificada, pelos meios legais ao seu dispor.

  5. - Aliás, a administração no uso dos seus poderes de jus imperii nada mais nem diferente fez do que em idêntica situação faz o tribunal quando procede à execução de uma decisão judicial de despejo …”.

Os AA., aqui igualmente recorrentes, apresentaram alegações (cfr. fls. 452 e segs.

), nas quais terminam enunciando o seguinte quadro de conclusões: “...

A - Face à prova produzida, quer a prova documental, quer a testemunhal, a matéria dos nºs. 4 e 16 da B.I. deveria ter sido considerada provada, nesse sentido devendo ser alterada.

B - Mesmo mantendo inalterada a matéria de facto a solução deveria ser a da procedência dos diferentes pedidos.

C - Quer ao iniciar a ocupação da habitação quer durante todo o tempo em que a ocuparam os Recorrentes sempre tiveram uma situação de desafogo económico.

D - Os Recorrentes nunca constituíram um agregado familiar pobre ou carenciado, o que o Recorrido Município sempre soube.

E - Os rendimentos dos Recorrentes apenas eram tidos em conta para fixação do valor da renda.

F - Sempre os Recorrentes fizeram prova dos seus rendimentos e nunca os mesmos foram entendidos como impeditivos da ocupação da habitação.

G - O direito de ocupação da habitação foi conferido e existia independentemente da situação económica e social dos Recorrentes.

H - Mesmo que se entendesse que o direito de ocupação dependia da situação económica dos Recorrentes, sempre seria necessário que tivesse ocorrido uma variação da mesma, relativamente ao início da ocupação, de forma tal que deixasse de justificar-se tal ocupação, o que não ocorreu.

I - A situação económica dos Recorrentes sempre foi desafogada, como se encontra provado, pelo que nunca seria a aquisição de um apartamento de férias, ao fim de uma vida de trabalho, que poderia traduzir alteração relevante da sua condição.

J - Não constituiu fundamento da decisão do Recorrido Município a falta habitação permanente, fundamento que foi abandonado, pelo que não podia o Tribunal fundar nele a desnecessidade.

K - Em qualquer caso, mesmo que assim não fosse, não incumbia aos Recorrentes a prova da habitação regular, antes incumbindo ao Município a prova da falta de regularidade.

L - Só poderia constituir motivo para o despejo o facto de os Recorrentes terem casa própria na área do concelho do Porto, o que não é o caso.

M - Também não configura desnecessidade o facto de os Recorrentes terem tido disponibilidade para adquirir o apartamento de Vila do Conde, isto pelos motivos alegados quanto à sua condição económica e social.

N - A necessidade dos Recorrentes, que havia décadas residiam no local, resulta desde logo, de sempre terem trabalhado no Porto, de aí terem as suas relações e das necessidades de apoio decorrentes da doença do Recorrente.

O - A relação estabelecida entre os Recorrentes e o Município quanto à ocupação da casa tem natureza contratual, não podendo ser alterada nem podendo ser-lhe posto termo sem alteração relevante e legalmente prevista dos pressupostos em que se estabeleceu.

P - Tal relação filia-se na ocupação que antes era feita pelos pais da Recorrente, ocupação esta que também não dependia da sua condição económica social, antes resultando de obrigação assumida pelo Município em consequência da expropriação e demolição da casa arrendada que aqueles ocupavam.

Q - Foi tal direito que se transmitiu para a Recorrente, sendo irrelevante tratar-se de novo alvará.

R - Procedentes os pedidos formulados nas alíneas A), B) e C), deve ser julgado, de igual modo, procedente o pedido de indemnização, a liquidar em execução de sentença, pela privação do uso da habitação até que tal privação cesse.

S - Face à matéria de facto dada como provada é insuficiente a indemnização estabelecida para os danos morais, indemnização que deveria ser fixada, no mínimo, em € 10.000,00.

T - Resulta da prova documental que a Ré M… tinha conhecimento, desde o dia da sua instauração, da providência cautelar para suspensão do acto, bem como que sabia que não havia sido fixado prazo para os Recorrentes deixarem a habitação.

U - Não obstante isso nada fez para evitar o despejo e as suas gravosas consequências para os Recorrentes, agindo, assim, com clara má-fé e manifesto abuso de poder.

V - A decisão viola o disposto no Regulamento de Execução do Plano de Melhoramentos, de 1956, nomeadamente os seus artigos 1.º, 7.º, 9.º, e 13.º, o art.. 405.º do Código Civil, ocorrendo as nulidades das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC …”.

O co-R. «MP», enquanto recorrido, veio produzir contra-alegações (cfr. fls. 545 e segs.

) nas quais termina pugnando pela manutenção do julgado no segmento ali sindicado sem, todavia, formular quaisquer conclusões.

Os AA., enquanto recorridos, vieram também apresentar contra-alegações (cfr. fls. 554 e segs.

) onde sustentam, no segmento sindicado, a manutenção do julgado, concluindo da seguinte forma: “… 1 - Os Recorridos fundaram o seu pedido indemnizatório, para lá do mais, na violação pelo Recorrente do princípio da boa fé que deve presidir à sua actuação, por não lhes ter concedido prazo para a entrega voluntária do locado, nem lhes sendo indicada data para a execução do despejo.

2 - O Recorrente, independentemente da validade do acto de despejo, na sua execução não actuou de forma leal e correcta, violando o princípio da boa fé 3 - O que causou danos aos Recorridos.

4 - Verificando-se todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, gerando a obrigação de indemnizar.

5 - É irrelevante, no caso, que os Recorridos tenham formulado pedido de indemnização genérico, a liquidar em execução de sentença, após a reocupação, já que o fizeram atendendo aos demais danos sofridos.

6 - Tendo sido improcedentes os demais pedidos e estando em condições de o fazer, nada obsta a que o tribunal tenha logo fixado o montante indemnizatório.

7 - A decisão não é, pois, nula por excesso de pronúncia.

8 - O disposto no artigo 156.º do CPA não regula o procedimento de execução para a entrega de coisa certa.

9 - Do...

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