Acórdão nº 1653/99 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Outubro de 2002

Magistrado ResponsávelDulce Manuel Neto
Data da Resolução15 de Outubro de 2002
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juizes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo: J...

e esposa P...

, residentes na Rua ..., interpõem recurso contencioso do despacho proferido em 24/08/98 pelo Exmº Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que indeferiu a pretensão que aqueles deduziram no sentido de verem enquadrado no art. 46º do Estatutos dos Benefícios Fiscais os rendimentos auferidos pelo recorrente em missão de cooperação técnico militar luso-angolana durante o ano de 1996.

Em fundamento e em síntese alegam que o acto recorrido se encontra inquinado dos seguintes vícios: - vício de forma por obscura, deficiente e contraditória fundamentação; - vício de violação de lei por ofensa do princípio da não retroactividade da lei fiscal, na medida em que a Administração aplicou retroactivamente a lei posterior (isto é, a Lei nº 52-C/96, de 27-12, entrada em vigor em 1997) para interpretar a lei anterior (isto é, a Lei nº 65/90, de 28-12, vigente à data dos rendimentos em causa), negando-se por essa via a reconhecer o benefício pretendido; - vício de violação de lei por ofensa do disposto no art. 13º da C.R.P., ao perfilhar-se o entendimento de que o nº 1 do artigo 46º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (na redacção dada pela Lei 75/93, de 20-12) não é aplicável aos militares deslocados no estrangeiro ao abrigo de acordos de cooperação técnico-militares, assim os discriminando em relação aos restantes cidadãos; - vício de violação de lei por ofensa do nº 2 do art. 266º da C.R.P., na medida em que foram concedidas isenções fiscais a militares que se encontravam na mesma situação que o recorrente, tendo-se, assim, dado tratamento diferente a situações iguais.

Terminaram pedindo a anulação do despacho recorrido.

* * * A autoridade recorrida respondeu pela forma que consta de fls. 65/77 onde sustentou a legalidade do acto recorrido, reclamando a sua integral confirmação com base na argumentação que deixamos sintetizada do seguinte modo: · o art. 46º do CIRS na redacção vigente à data dos rendimentos em causa (isto é, dada pela Lei nº 65/90, de 28-12 e pela Lei nº 10-B/96, de 23-03) dispunha no nº 1 que estavam isentas de IRS as pessoas deslocadas no estrangeiro ao abrigo de acordos de cooperação relativamente aos rendimentos auferidos no âmbito do respectivo acordo (isenção automática) e dispunha no nº 2 que o Ministro das Finanças podia conceder isenção de IRS quanto aos rendimentos auferidos pelas ditas pessoas ao abrigo de contratos celebradas com entidades estrangeiras desde que fossem demonstradas as vantagens desses contratos para o interesse nacional (isenção que carecia de pedido de reconhecimento); · daí o entendimento da AF de que a isenção automática do nº 1 do art. 46º só abrangia as relações jurídicas de cooperação emergentes de acordos de cooperação em sentido próprio, isto é, corporizados em tratados internacionais celebrados com intervenção do Estado Português, situação na qual se não enquadrava o recorrente; · esse entendimento é confirmado pela posterior redacção dada ao art. 46º pela Lei nº 127-B/97, de 20-12, que criou um benefício novo aplicável a todos os militares e elementos das forças de segurança deslocados no estrangeiro relativamente aos rendimentos no âmbito de acordo técnico-militar, preceito que não tendo natureza interpretativa/retroactiva só se aplica para o futuro, pelo que não tem razão o recorrente ao pretender aplicar aos rendimentos em causa uma isenção legal que manifestamente os não abrange.

· a fundamentação do acto recorrida não é obscura nem contraditória, sendo antes clara, suficiente e congruente, e não foi violado o princípio da igualdade já que este princípio estruturante do sistema constitucional encerra a admissão da consagração de situações desiguais sempre que entenda que elas radicam em postulados superiores aqueles em que a própria tributação-regra se funda.

* * * Notificadas para alegações escritas, ambas as partes as apresentaram para reiterarem as posições já anteriormente assumidas e atrás descritas.

O Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu parecer nos termos que constam de fls. 97, onde sustentou que o acto recorrido, embora fundamentado, se encontra ferido de vício de violação de lei «quando entende excluir a situação do nº 1 do art. 46º do EBF na redacção dada pela Lei nº 65/90, que aprovou o OE para 1991, que alargou o benefício fiscal aí previsto às relações de cooperação às pessoas deslocadas no estrangeiro ao abrigo de acordos de cooperação relativamente aos rendimentos auferidos no âmbito deste. No nº 1 deste normativo nenhuma restrição é feita, quer quanto às pessoas abrangidas pela isenção, quer quanto à categoria ou natureza dos acordos de cooperação. É, pois, subsumível na previsão da norma a situação dos autos, isto é, de militar a prestar serviço em Angola ao abrigo do Acordo Geral de Cooperação aprovado pela Lei nº 6/79, de 09-02».

Por despacho da relatora proferido a fls. 111 foi oficiosamente suscitada a questão da recorribilidade do acto recorrido e determinado o cumprimento do nº 2 do art. 54º da LPTA, notificando-se os recorrentes para se pronunciarem, querendo, sobre tal questão, o que fizeram pela forma que consta de fls. 115/117, onde pugnaram pela improcedência dessa excepção.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* * * ENQUADRAMENTO FACTUAL Face aos elementos documentais juntos aos autos e processo administrativo apenso, julgam-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão: - 1)- No período compreendido entre 27/05/96 e 31/12/96 o recorrente integrou uma Missão de Cooperação Técnico-Militar Luso-Angolana para a formação das forças armadas angolanas, tendo auferido durante esse lapso de tempo a remuneração ilíquida de Esc. 3.225.750$00, sendo de Esc. 757.993$00 o valor correspondente à retenção na fonte (cfr. docs. de fls. 15 e 16 dos autos); - 2)- Em 17/03/97 o recorrente entregou na Repartição de Finanças de Montijo a declaração anual de IRS relativa aos rendimentos auferidos no ano de 1996, na qual incluiu o anexo H em que declarou a referida importância de 3.225.750$00 auferida ao abrigo do acordo de cooperação (cfr. doc. de fls. 17/18 dos autos); - 3)- Em 4/09/97 o recorrente recebeu o ofício nº 6232 emitido pela Repartição de Finanças do Montijo, que o notificava para apresentar num prazo de 8 dias uma declaração de...

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