Acórdão nº 00965/04.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Fevereiro de 2005

Magistrado ResponsávelDr. Carlos Lu
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “R…, S.A.”, sociedade comercial, pessoa colectiva n.º …., com sede na Rua de S. Bento, n.º …, ..º-.., Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o n.º …, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto - 2º Juízo, datada de 25/09/2004, que indeferiu a providência cautelar deduzida contra o CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA “GESTÃO DE OBRAS PÚBLICAS DA CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO (GOP), E.M.”, pessoa colectiva n.º …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial do Porto sob o n.º …, com sede na Rua de Monte dos Burgos, n.º …, …º piso, Porto, na qual era peticionada a suspensão de eficácia relativa às deliberações de 20/06/2003 e de 17/07/2003 que procederam à aplicação de multas contratuais no âmbito da execução da obra do “Conjunto Habitacional da Pasteleira - Conclusão”, e, bem assim, a intimação daquele requerido para que se abstenha de solicitar o pagamento do valor das garantias bancárias prestadas no contrato junto das entidades bancárias.

Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 434 e segs.

), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) I - A fundamentação de facto da Douta Sentença recorrida é totalmente errada, porquanto; II - Na comunicação da requerida, datada de 23.06.2003, não consta o texto integral da deliberação do seu Conselho de Administração de 20.06.2003, que decidiu aplicar as multas aqui em causa; III - Naquela comunicação também não consta qualquer referência à aludida deliberação, a indicação do seu autor e a sua data.

IV - Deste modo, por manifesto erro da requerida, aquela comunicação não cumpre nenhum dos requisitos estabelecidos no artigo 68º do C.P.A., razão pela qual, não foi notificado à ora Recorrente o acto de aplicação de multas, produzindo os efeitos externos que atingissem a sua esfera jurídica, e assim, implicassem o inicio da contagem do prazo estabelecido no artigo 255º do RJEOP, para o exercício do direito de interposição da acção de que esta providência cautelar é instrumental.

V - Por outro, a comunicação da requerida, datada de 17.07.2003, relativa à segunda multa, também não contém o texto da deliberação do seu Conselho de Administração de 17.07.2003, e VI - Como agora se constata (Doc. nº 24 da P.I.), aquela deliberação não decidiu a aplicação da referida multa contratual, tendo-se limitado a aprovar a minuta de resposta à defesa da ora Recorrente, desconhecendo-se se é a mesma que lhe foi comunicada.

VII - Deste modo, nenhuma das referidas comunicações cumpre os requisitos do citado artigo 68º do C.P.A., pelo que, as mesmas não desencadearam o início da contagem do prazo estabelecido no artigo 255º do RJEOP.

VIII - Porque o referido prazo não teve inicio aquando do conhecimento das mesmas, não estão cumpridos os requisitos da excepção de caducidade do direito de interposição da acção principal que obstem ao conhecimento do mérito da presente providência cautelar.

IX - A ora Recorrente só tomou conhecimento das deliberações de aplicação das multas em 25 de Novembro de 2003, pelo que, o prazo estabelecido no artigo 255º do RJEOP só terminou em 28 de Maio de 2004.

X - Como a ora Recorrente requereu a Tentativa de Conciliação prevista no artigo 260º do RJEOP em 29/04/04, não se verifica a excepção de caducidade do direito de interposição da acção principal, de que estes são instrumentais e, por isso, não existe nenhuma circunstância - excepção de caducidade - que impossibilite o Tribunal “a quo” de tomar conhecimento do mérito da presente providência cautelar.

XI - Porque o Meritíssimo Julgador assim não entendeu e Doutamente decidiu julgar improcedente a presente providência, com fundamento na existência da excepção de caducidade do direito de interposição da acção principal de que a presente providência é instrumental, violou o disposto nos artigos 68º, n.º 1, alíneas a) e b), do C.P.A., no artigo 268º, n.º 3, da CRP e no artigo 255º, do RJEOP, sendo, por isso, totalmente inválida a Douta Sentença recorrida, devendo, em consequência ser revogada e substituída por outra que conheça do mérito destes Autos.

(…).” O ente público demandado, ora recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 449 e segs.

) nas quais formula as seguintes conclusões: “(…) 1.ª - Ponderada a prova produzida, o Tribunal a quo deu como provado que a recorrente foi notificada das deliberações do recorrido que lhe aplicavam as multas contratuais, 2.ª - depois de previamente ter sido ouvida previamente e ter deduzido as suas defesas; 3.ª - Através de tais notificações a recorrente tomou conhecimento perfeito, cabal e completo do conteúdo e sentido de cada uma daquelas decisões; 4.ª - De tal forma, aliás, que delas recorreu contenciosamente, aí identificando perfeitamente as decisões, o seu autor e o seu sentido, afirmando mais que se tratava de actos finais, definitivos e com eficácia externa; 5.ª - Daí que não faça sentido que invoque agora que só passou a conhecer os actos impugnados depois de receber as respostas aos recursos de anulação desses actos! 6.ª - Ao litigar contra a verdade sabida dos factos está recorrente, para além de fazer reprovável uso do processo, a litigar com má fé; 7.ª - Improcedem, portanto, as conclusões das alegações da recorrente, sendo certo que a douta sentença recorrida não violou os normativos indicados pela recorrente, antes aplicou correctamente o direito e fez justiça.

(…).” Conclui no sentido de que deve ser mantida a decisão sob recurso negando-se provimento a este e condenada a recorrente como litigante de má-fé, em multa e indemnização ao recorrido a calcular segundo o prudente arbítrio do Tribunal.

A M.m.ª Juiz “a quo” sustentou a decisão recorrida nos termos constantes do despacho de fls. 502 dos autos.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts.146º e 147º ambos do CPTA nada veio apresentar ou requerer (cfr. fls. 509 e segs.

).

Sem vistos, dado o disposto no art. 36º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

*2.

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, n.ºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 140º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recurso de ‘revisão’” (cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 4ª edição, pág. 391).

As questões suscitadas pela recorrente resumem-se, em suma, a determinar se na situação vertente a decisão recorrida ao rejeitar as providências cautelares com fundamento no facto de ocorrer caducidade do direito de propor a acção principal, violou ou não os arts. 68º, n.º 1, als. a) e b) do CPA, 268º, n.º 3 da CRP e 255º do RJEOP [cfr. conclusões supra reproduzidas].

*3.

FUNDAMENTOS 3.1.

DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: I) Por anúncio publicado no Diário da República, III Série, de 07/07/2001, foi aberto concurso público para a adjudicação da empreitada referente ao “Conjunto Habitacional da Pasteleira - Conclusão”.

II) A execução da empreitada referida em I) foi adjudicada à requerente, tendo esta sido notificada da respectiva adjudicação em 26/10/2001 (cfr. doc. de fls. 41 dos autos).

III) Em 07/11/2001 a entidade requerida celebrou com a requerente o respectivo contrato de empreitada relativa à obra identificada em I), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. doc. de fls. 42 e ss. dos autos).

IV) A consignação dos trabalhos ocorreu no dia 08/11/2001 (cfr. doc. de fls. 55 dos autos).

  1. O prazo global da empreitada terminava no dia 08/03/2002.

    VI) Em 06/12/2001 a requerente apresentou à entidade requerida uma listagem de Erros e Omissões do projecto, atribuindo aos mesmos o valor de Esc. 45.424.475$00 (cfr. doc. de fls. 56 e ss dos autos).

    VII) A Fiscalização da obra apurou como devido, em resultado de erros e omissões do projecto, o montante de Esc. 5.818.910$00 (cfr. doc. de fls. 66 dos autos).

    VIII) Em 07/02/2002 a requerente apresentou reclamação por Erros e Omissões do projecto no montante de € 182.149,56 (cfr. doc. de fls. 66 e ss dos autos).

    IX) A reclamação referida em VIII) foi parcialmente deferida pela entidade requerida, no valor de € 36.088.39, em virtude do que a mesma prorrogou o prazo de execução da empreitada por 6 dias (cfr. doc. de fls. 73 e ss e 238 e ss dos autos).

  2. A execução dos trabalhos esteve suspensa no período compreendido entre 05/03/2002 e 02/04/2002, pelo facto de o dono da obra não haver pago valores facturados (cfr. doc. de fls. 77 dos autos).

    XI) Ainda pelos motivos referidos em X), a requerente suspendeu novamente a execução dos trabalhos da empreitada entre os dias 24/05/2002 e 24/06/2002 (cfr. doc. de fls. 79 dos autos).

    XII) Durante o período de suspensão referido em X) e XI), a Fiscalização informou a entidade requerida que a requerente continuou a executar trabalhos referentes à obra da empreitada (cfr. doc. de fls. 258 e ss dos autos).

    XIII) A entidade requerida ordenou à requerente a execução de Trabalhos a Mais e Extras, os quais ascenderam a € 8.675,85, em virtude do que foi concedido a prorrogação do prazo da empreitada de 2 dias (cfr. doc. de fls. 238 e 254 dos autos).

    XIV) Por faxes de Julho e Agosto de 2002 dirigidos à entidade requerida e à Fiscalização da obra, a requerente solicitou a recepção...

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